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Novas lambanças no distante Reino do Ó

Mais uma vez, na longínqua terra do faz de conta...

Rodolfo de Souza
21/04/2016 | 07:00
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Mais uma vez, na longínqua terra do faz de conta, teve lugar um fato que abalou as estruturas do maior conto de fadas de todos os tempos, e do qual é apreciadora toda a gente que vive naquele reino de magia.

Tudo pensado pelo caprichoso autor da história, que, cheio de tédio, cismou que passava da hora de dar mais sabor à sua novela. Decidiu, assim, pôr para funcionar a imaginação inquieta que a criara e que não pouparia esforços para apimentá-la, deixando um pouco mais incrementado seu tempero, picante de longa data. Necessitava, pois, de um acontecimento que estremecesse as bases. Não, não! Terremoto nem pensar! De qualquer forma, precisava de um tremor de magnitude 8, pelo menos, para sacudir a mente leitora, ou eleitora, como querem alguns. E tanto pensou e imaginou que subitamente lhe ocorreu destituir de seu trono a rainha daquele país de sonhos, que, a propósito, tomara o poder por meio do voto popular. É...! Havia ali uma democracia! Imagine! Ficou ainda mais feliz, o escritor, ao se lembrar de que é sucesso garantido puxar o tapete da pessoa que governa essa terra.

Mas sua consciência não haveria de lhe dar sossego. Afinal, comprometia, com a sua atitude, a liberdade de um povo que sequer tomara gosto por ela ainda.

Apesar de que, verdade seja dita, não houve maldade por parte dele que nem versado em assuntos políticos era, razão pela qual não atinava com as consequências quando entregou à vil nobreza do lugar a tarefa de executar o plano.

Não sabia, inclusive, que já conspiravam contra a pobre rainha os salteadores que vinham armando uma cama de gato para derrubá-la havia muito tempo. Pensaram numa mudança na história bem antes do seu autor. A ideia consistia em se aproveitar do momento em que a soberana, cercada de ratos, perdia o rumo da carroça e levava seu mandato desastrado a promover a bancarrota da economia do reino, o que, aliás, fez perder o poder de compra os seus súditos, situação que muito lhes desagradou e rapidamente os colocou contra ela. Compreensível até que, em dado momento, passassem a desejar que se fosse. Não se pode mexer no bolso do povo. Isso todo político velhaco sabe. Não dá ibope.

A rainha, judiação, nem defesa tinha, uma vez que os nobres que a apoiavam estavam com as mãos sujas e o timbre de suas vozes não alcançavam mais as notas necessárias para se fazer ouvir. Seu mago de plantão, este perdeu a força de sua varinha, para cuja mágica já havia antídoto muito mais eficaz. Tudo o que podia fazer era arrotar impropérios com sua voz gutural.

Sozinha então, sua alteza começou a depender cada vez mais do apoio de seu imediato. Entretanto, este, dono de muita influência e de olho na confortável cadeira da companheira, arrastou consigo grande parcela da nobreza que se opunha à situação e era faminta de prestígio e de poder.

Desta forma, seguindo as previsões de qualquer leigo, ele a abandonou e seguiu em companhia das hienas que aguardavam famintas, a presa tombar para devorá-la ainda viva. Assim, em nome de papai morto, mamãe velhinha, filhinhos, filhinhas, esposa, o cachorro, o bode, o diabo, depuseram sua majestade e fizeram escárnio de sua pessoa.

Grande parte da população se lambuzou de felicidade, embora continue a bater em seu peito aflito a incerteza de uma vida melhor. Sobretudo, porque, tem razão de sobra para desconfiar dos sucessores, uma vez que décadas de poder em suas mãos promoveram o avesso do progresso nessa pátria de meu Deus.

Penso que não demora muito e o autor terá que pensar em outros personagens para efetuar nova mudança e, quem sabe, dar um final feliz a esta história.

* Rodolfo de Souza nasceu e mora em Santo André. É professor e autor do blog cafeecronicas.wordpress.com

E-mail para esta coluna: souza.rodolfo@hotmail.com. 




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