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Cotidiano tira o sono da população
Bruna Gonçalves
Do Diário do Grande ABC
27/06/2010 | 07:33
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Depois de um longo dia, enquanto uma noite de sono é tão aguardada por alguns, para outros é sinônimo de problema. Segundo os especialistas, com a correria do dia a dia, o excesso de preocupação e ansiedade muitos não conseguem se desligar e acabam prejudicando o que poderia ser uma boa noite de sono.

É o caso do estudante de publicidade e propaganda de São Bernardo Luiz Filipe Negreiros, 22 anos, que chega a dormir no máximo cinco horas por noite. "Eu tenho sono, mas é deitar para desaparecer. Assisto televisão, leio livro, que é a pior coisa, já que uma vez fiquei lendo até as 6h para concluí-lo. Quando viajo é pior ainda", lamenta.

O estudante, que está desempregado, diz que quando tem uma entrevista, a situação piora. "Fico muito ansioso. No dia seguinte, estou exausto."

Para a neurologista e coordenadora do Laboratório do Sono da Faculdade de Medicina do ABC Rosa Hasan o sono é fundamental. "Temos que passar um terço da nossa vida dormindo. Por isso, com algumas mudanças de hábitos, conseguimos melhorar a qualidade do sono. Em alguns casos, é preciso procurar um especialista", explicou.

O neurologista e pesquisador da disciplina do sono da Unifesp Luciano Ribeiro Pinto Júnior acredita que muitos pensam que o sono é o primeiro que pode dar lugar a outras atividades. "As pessoas não dão valor ao sono. Uma noite mal dormida traz várias consequências", ressaltou.

O revisor gráfico de Mauá Rinaldo Ribeiro Queiroz, 36, trabalha uma semana das 11h às 18h e na outra das 17h30 às 24h. "Independentemente disso, só durmo depois das 2h da manhã e acordo várias vezes. Faço de tudo, até ficar na calçada de madrugada ouvindo MP3. O pior é no dia seguinte. Às vezes, quando percebo, estou cochilando em frente ao computador."

O doutor em ciências e pesquisador da Unifesp Rogerio Santos da Silva faz um alerta. "A má qualidade de sono traz prejuízo para a pessoa e para a sociedade como um todo, devido à diminuição da produtividade, aumento do absenteísmo e do risco de acidentes.

Problemas podem ser evitados na infância
Para especialistas, problemas relacionados ao sono que se desenvolvem na infância e não são tratados podem trazer prejuízos na fase adulta.

Para o médico pediatra e homeopata Moises Chencinski, são vários fatores que podem interferir no sono das crianças. "Muitas atividades extracurriculares, cobranças, obrigações, ambiente familiar conturbado, além de doenças, como gripes e resfriados, podem comprometer a noite de sono", explicou.

O médico explica que todas essas alterações trazem vários prejuízos que, se não tratados, chegam até a fase adulta. "Os problemas variam desde queda de rendimento escolar, alterações no humor até problemas em relação ao crescimento, por conta do GH (hormônio do crescimento). Esse hormônio tem maior liberação na fase do sono, por isso, se a criança não tem uma boa noite, será prejudicada. Nessa fase também é liberado o hormônio leptina, responsável pela saciedade", disse Chencinski.

A filha de 6 anos do revisor gráfico de Mauá Rinaldo Ribeiro Queiroz é uma das crianças que não conseguem dormir cedo. "Desde os 3 anos, ela fica nessa briga com o sono e enrola para dormir. Ela vai só vai dormir mesmo depois das 23h30. Enquanto isso, fica vendo DVD, pintando e vive falando que está sem sono. Acredito que isso se deva à minha rotina, já que trabalho em horários diferentes e ela fica me esperando", disse o revisor gráfico.

Ele contou que o problema é que, do mesmo jeito que ela demora para dormir, demora para acordar. "É horrível, porque desregula a alimentação e também a própria escola já me chamou comentando que ela fica um pouco desatenta", lamentou.

Prevenção - O ideal não é tratar os problemas das crianças, mas sim fazer com que não aconteçam. "A criança não é um adulto, ela precisa de uma rotina adequada para a idade, porque é com isso que aprende a dinâmica do dia a dia. Essa rotina tem de ser estabelecida desde os primeiros meses, sempre com limites para acordar e dormir", disse o especialista.

Em alguns casos, os médicos recomendam o uso de fitoterápicos ou homeopáticos, pois não apresentam contra-indicações.

Aposentado dorme tranquilo há quatro anos
Há dez anos o aposentado de Santo André Edson Patini Bordignon, 51 anos, descobriu que tinha apneia do sono - interrupções da respiração que se caracterizam por obstrução repetida da via área superior (garganta). "Acordava várias vezes durante a noite, inclusive sonhava que estava no abismo e, quando despertava, tinha caído da cama. Se dormia duas horas era muito", contou.

A pior coisa era o outro dia. "Cochilava no volante, já cheguei até a dormir atendendo uma cliente. Onde encostava, dormia", disse o aposentado.

Após passar por uma consulta na Faculdade de Medicina do ABC, Edson realizou um exame de polissonografia, em que o paciente é monitorado à noite por meio de sensores colados pelo corpo para avaliar o sono. "Descobri que tinha apneia e, há quatro anos, uso o aparelho Cpap (pressão positiva contínua na via área) para dormir. Se viajo, sempre levo."

O pneumologista e diretor do laboratório do Sono do Incor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Geraldo Lorenzi Filho, disse que a apneia é comum em homens pela retenção de gordura mais central, na barriga e no pescoço, o que contribui para a obstrução da garganta. "Por isso, o aparelho gera uma determinada pressão, estabelecida pelo especialista após a realização do exame, que provoca a abertura da via área", afirmou.

O pneumologista Pedro Genta diz que estudos apontam que 33 % dos adultos em São Paulo têm apneia por conta do sobrepeso. "O tratamento é importante porque diminui o risco de doenças cardioavasculares."

Insônia é comum em mulheres no período da menopausa
Enquanto alguns distúrbios do sono, como a apneia, são comuns em homens, outros são mais frequentes em mulheres, como a insônia. Segundo os especialistas, isso ocorre mais no período da menopausa. "Está ligada à questão hormonal. Neste período, a mulher tem alguns sintomas, como mal estar e a manifestação da insônia", disse o pneumologista Geraldo Lorenzi Filho.

A dona de casa da Vila Prudente (Zona Leste da Capital)Teresinha Bonafé Machado, 58 anos, descobriu há 14 anos que tinha insônia. "Foi logo após entrar na menopausa, não conseguia dormir. Quando iniciei a reposição hormonal melhorei, porém tive que interromper o tratamento."

Teresinha diz que o marido fica incomodado por acordar várias vezes. "Tento ficar na cama, mas acabo sentindo calor, levantado para ler ou tomar um copo de leite." Ela se recorda de um episódio em que teve que pegar a estrada. "Trabalhava como corretora de seguros e tive que ir para Campinas. Lembro que não tinha dormido quase nada e fiquei sem reflexo e com o raciocínio lento", contou Teresinha, que tem notado melhora com homeopatia e acupuntura.

Atendimento na região concentra-se no Ambulatório do Sono
As prefeituras do Grande ABC não possuem atendimento específico para pessoas que possuem distúrbios do sono. São Bernardo informou que quem apresenta o problema deve procurar uma UBS (Unidade Básica de Saúde). Dependendo do caso, será encaminhado para especialistas, para o Hospital das Clínicas ou ao Instituto do Sono, em São Paulo. O mesmo é feito em Ribeirão Pires. Rio Grande da Serra informou que há atendimento de especialistas no Ambulatório de Saúde Mental.

São Caetano não possui programa específico e as prefeituras de Diadema e de Mauá não responderam até o fechamento desta edição.

Em Santo André, há o Ambulatório do Sono da Faculdade de Medicina do ABC, que conta com equipe multidisciplinar para atender à demanda, que é grande. "Homens e mulheres nos procuram. O diferencial está no acompanhamento de vários profissionais que ajudam no tratamento. Depois da consulta, se for preciso é feito o exame de polissonografia. Temos dois quartos para as avaliações", disse a neurologista e coordenadora Rosa Hasan.




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