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As crônicas de antigamente

Já não se escreve crônicas como antigamente...

Rodolfo de Souza
25/02/2016 | 07:00
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Já não se escreve crônicas como antigamente. Os especialistas em literatura, a quem compete tecer comentários a respeito de assuntos literários, dizem que o jeito de escrevê-las é que mudou. Está um tanto atualizado, com a cara deste mundo em que vivemos. Nesse aspecto, penso até que têm razão. Entretanto, olhando a coisa do ponto de vista de quem é apreciador de um texto bem elaborado, em que o autor se serve da farta mesa de recursos linguísticos da qual é dono este nosso rico idioma, chego a duvidar do bom gosto deste novo modernismo.

De fato a precariedade literária que tenho presenciado nas prateleiras das livrarias, tornou-se, nesta época, elemento preponderante na elaboração de trabalhos que antes eram considerados obras de arte e que hoje fatalmente se deixaram contaminar pelos costumes da atualidade em que as atenções estão voltadas para o fútil e o banal. Tempos modernos e apressados que fizeram da informática e da internet seus santos de devoção que lhes ditam as regras quando o assunto é criar, sobretudo, arte. Percebo que falta tempo para a sensibilidade e para a criatividade. A propósito, há pressa para escrever, o que denota falta de cuidado, tão necessário quando se pretende dar asas à imaginação e à forma como tudo chegará aos olhos e ao entendimento de quem lê.

Falo assim, cheio de rancor, justamente porque leio. Leio de tudo, inclusive, crônicas e, argumentos não me faltam para reclamar a falta que faz Rubem Braga, Fernando Sabino e Drummond. Quando é que teremos novamente uma literatura repleta do talento que tanto nos encantou tempos atrás? Tempos em que a palavra tinha valor e era usada como instrumento para transmitir emoções.

Tenho notado, pois sim, que os cronistas de hoje produzem suas obras imbuídos do dever de sempre criar textos cômicos. Como se o vissem só assim. E virou fórmula de sucesso produzir historinhas engraçadas, nada comprometidas com a ideia de crônica. São, afinal, contos inventados para divertir. É o que basta!

Na verdade, crônica é, ou deveria ser, um texto que fala do dia a dia, que transforma cenas aparentemente banais em verdadeiras obras literárias. Às vezes hilárias, por que não? Mas que nunca se esquece de privilegiar o senso de que se vale o autor para fotografar a cena que só ele teve a sensibilidade de perceber.

Gosto, pois, da palavra escrita, aquela que traduz com habilidade o sentimento que o artista conseguiu aguçar por causa de uma imagem ou acontecimento que tenha presenciado.

E o leitor, por vezes, se alegra ou se emociona por descobrir nas palavras a oportunidade de enxergar aquilo que seus olhos não viram ou simplesmente deixaram de notar.

É o talento que faz do escritor um construtor de textos leves e redondos que levam o prazer a quem os lê.

Cabe, pois, ao leitor destes novos tempos, apreciar a arte criada a partir da banalidade desta vida. Até porque, serve também como pretexto para quem passa a vida valorizando o banal. Por que não?

* Rodolfo de Souza nasceu e mora em Santo André. É professor e autor do blog cafeecronicas.wordpress.com

E-mail para esta coluna: souza.rodolfo@hotmail.com. 




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