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E sobraram só as pombas

Era uma vez, em um longínquo reino encantado, uma rainha má...

Rodolfo de Souza
17/12/2015 | 07:00
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Era uma vez, em um longínquo reino encantado, uma rainha má que desejava muito permanecer no trono, embora seus súditos considerassem meio desastroso seu reinado e quisessem a sua cabeça. Cortar a cabeça, que fique bem claro, era maneira antiga de falar que tinha aquela gente quando se referia a destituir do cargo pessoa que vinha demonstrando certa ineficiência no trabalho, prejuízo para a empresa ou para a coroa. E, metido que era aquele povo, tratou logo de inventar o exclusivo e pomposo nome de impeachment para se mandar para o olho da rua pessoa que ocupasse o cargo mais alto da nação. Termo nada condizente com o idioma local, é certo, mas que servia bem. Até soava imponente, mesmo que usado para se referir ao ato nada elegante de se chutar o traseiro do outro.

No caso daquela terra da fantasia, onde teve lugar a nossa história, a alegação da qual se armara a população para desejar ardentemente puxar o tapete da rainha, tinha como base o fato de viver precariamente em uma sociedade que vinha praticando a anti-evolução, tinha já um bocado de tempo. Andando de marcha ré, para ser mais claro. As pessoas ali eram vítimas de bandidos horrorosos que as roubavam e assassinavam bestamente. E, as que sobreviviam, andavam assim, olhando de lado, com medo da própria sombra. Até as carroças que as transportavam para lá e para cá, eram motivo de revolta, já que dependiam de um sistema rudimentar de transporte que oferecia desconforto, atrasos, empurrões e pisões aos montes. E, diante de situação tão difícil, o jeito era sonhar com a compra de um cavalinho que só iria engrossar o já atormentado trânsito das cidades daquele tempo.

Mas a rainha cobrava impostos aviltantes. Esfolava mesmo seu povo sem nada lhe dar em troca. Herdara este costume de seus antecessores que pouco se importaram com Saúde, Habitação, essas coisas.

Mas a educação oferecida ali, verdade seja dita, esta era perfeita. De tal forma bem educados eram os habitantes daquela terra, que durante séculos nem suspeitaram que estavam sendo usurpados e que viviam num lugar cheio de possibilidades que nem imaginavam existir. Nem desconfiavam, coitados, que a rainha má governava juntamente com uma nobreza perversa que vinha subtraindo vultuosos recursos do reino havia décadas, bem antes da soberana subir ao trono, e que quando o caldo desandou e a economia faliu, apontaram para ela seus enormes dedos de unhas grandes e sujas. Alguém havia de subir na cruz, afinal.

Formou-se, então, comitiva para depor a soberana, acusada de falta de lisura no trato com a coisa pública e a responsabilizaram por todo o mal reinante naquele país de fadas. Os homens maus passaram, então, a cantar para aquela gente burra uma doce canção que falava da necessidade de expulsar do trono a rainha.

Mas aí, a gente que eles imaginavam sábia como uma porta, decidiu cada qual pegar sua cadeira e ir para as ruas, pedir a cabeça da rainha e de toda a nobreza que habitava os palácios de então. E não é que deu certo! O povo cansado decidiu, pois, que era momento de todo governante de toda província dentro do reino, ser submetido a investigação minuciosa. Deveria, assim, provar sua honestidade, já que desonestidade era componente certo no DNA de cada um daqueles sujeitos que mamaram nas tetas do poder público, durante eras.

No final das contas, acabaram-se os governos das cidades, das províncias e do próprio reino. E sobraram só as pombas nos suntuosos castelos, a arrulhar a sua vitória.

E, assim, a população viveu feliz para sempre!

* Rodolfo de Souza nasceu e mora em Santo André. É professor e autor do blog cafeecronicas.wordpress.com

E-mail para esta coluna: souza.rodolfo@hotmail.com. 




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