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Cia. dos Satyros encena 'Os Cantos de Maldoror' em SP
Do Diário do Grande ABC
06/05/1999 | 16:06
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Um ônibus totalmente escuro, com janelas e portas vedadas de forma a nao permitir que se conheça seu itinerário será o único meio de acesso ao espetáculo "Os Cantos de Maldoror", baseado na obra homônima de Isidore Ducasse, o conde de Lautréamont, encenado pela Cia. dos Satyros, que estréia nesta sexta (07) e pode ser visto por apenas 50 espectadores por sessao. A encenaçao será apresentada nos cômodos, corredores e num dos pátios internos de um imenso casarao abandonado num local da cidade nao revelado ao público.

"A idéia é a de seqüestro, um seqüestro estético", diz o diretor Rodolfo García Vázquez. Por isso "Maldoror" é desaconselhável para gestantes, claustrofóbicos e pessoas com síndrome do pânico.

O transporte singular é uma espécie de preparaçao para o público desfazer-se das expectativas estéticas que o acompanham na rotina de uma ida ao teatro. "A arte é assalto à mao armada, a arte nao é agradar a sua mamae". Os versos da poetisa Sylvia Plath bem podem servir para traduzir o espírito de criaçao que move a Cia. dos Satyros, dirigida por Vázquez e Ivam Cabral desde a sua fundaçao, em 1989. Em sua volta a Sao Paulo, sete anos após ter partido para instalar-se em Portugal, a cia. deve mais uma vez causar impacto. Dentro do ônibus, que parte da Funarte, o espectador escuta os versos do poeta na voz de Cláudio Viller acompanhado pela música criada especialmente para a peça pelo baixista Steve Severin da banda Siouxe and the Banshees. Ao saltar do ônibus, o público entra imediatamente numa mansao meio macabra já na aparência exterior de abandono e é conduzido por um longo corredor sob o foco oscilante de uma lanterna.

Sempre guiado pela luz, ouve o canto de uma soprano, atravessa imensas salas, uma delas com cerca de 400 metros quadrados inteiramente iluminada por velas. Passa por uma mulher que reza diante de uma espécie de túmulo até chegar à última sala, onde tem início a açao dramática condensada da poesia do autor na adaptaçao de Ivam Cabral.

Cenas - A primeira cena, uma espécie de gênese, mostra o personagem Maldoror deixando uma "simbólica" família, para partir pelo mundo. "Ele é um personagem que contesta a virtude e todas as normas da moral". Estupro, assassinato, pederastia e pedofilia sao alguns dos atos de Maldoror. A peça fez temporada em Curitiba, com ambientaçao semelhante, e teve boa aceitaçao de público, porém provocou polêmica ao integrar o Fringe, a mostra paralela da ediçao do Festival de Curitiba deste ano. "A polêmica foi inesperada", diz o diretor.

Ele afirma nao ter tido de forma alguma a intençao de chocar com a escolha do texto. "A idéia é mostrar que arte pressupoe liberdade para falar do mundo e nada tem a ver com o politicamente correto", diz. "A destruiçao em "Maldoror" remete ao mito de morte e ressurreiçao, é uma destruiçao visando ao renascimento".

Polêmica - A polêmica nao é novidade na trajetória dos Satyros, responsáveis por espetáculos como "Saló, Salomé" e "A Filosofia na Alcova". Difícil mesmo foi trocar Portugal, onde desde 1993 tinham boas condiçoes de trabalho, pelo Brasil. "Foi um decisao dolorida, mas o que fazer, somos brasileiros". Os Satyros têm agora sede própria em Curitiba, onde receberam apoio.




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