Um livrinho recém-lançado, Seis Primeiras Histórias (Mandarim, 136 págs., R$ 23), traz pela primeira vez em português os primeiros contos de Thomas Mann, escritos entre 1893 e 1908 e publicados originalmente em revistas e jornais alemães. São páginas de puro encantamento, capazes de funcionar como uma ótima introdução ao universo ficcional do autor de As Imposturas do Inspetor Félix Krull e de Os Buddenbrooks.
E para os que já conhecem e leram Thomas Mann, esta edição mostra como o formidável romancista experimentou nestes primeiros contos várias das técnicas e temáticas que se transformariam mais tarde em sua marca registrada. Tal como, por exemplo, as discussões filosóficas – sempre presentes, até mesmo nestas historietas curtas.
Em todos os contos, Mann elabora um ainda rudimentar “crescendo” que culmina num desfecho sempre surpreendente. Em Decaída, Mann demole o estereótipo do jovem sensível e rico que se apaixona pela atriz devassa. A história, contada numa roda de amigos, mostra a ingenuidade do rapaz abastado que pensa que não percebe que a mulher pela qual está apaixonado é uma prostituta. Meysenberg, que conta a tragédia, surpreende a todos no final revelando-se como o estúpido personagem principal de sua história.
De igual modo, o truque repete-se nas demais histórias, como em A Morte, em que um barão às vésperas da morte tece considerações filosóficas sobre a imortalidade; ou em Vingada, quando um bon vivant encontra uma mulher extremamente feia mas intelectualmente fascinante (“os atrativos daquela intelectual eram os mesmos de uma vassoura”), e quer passar da amizade profunda para a cama, sendo surpreendentemente rechaçado pela quasímoda. Ou em Anedota, na qual Angela, a mulher de Becker, diretor de um banco, incendeia corações e monopoliza toda a sociedade de Munique, sobretudo a ala masculina. Mas, num brinde caloroso que lhe faz um admirador na frente de todos em uma festa, o maridão se adianta e despeja um balde de água fria na platéia: “Como essa mulher – essa aqui! – é falsa e manhosa, cruel como uma besta! Como é desamorada e repulsivamente oca!”
Mãe brasileira – Está certo, estes contos não têm o refinamento dos romances que deram o Nobel e a reputação inigualável a Mann (filho de mãe brasileira, diga-se de passagem). Ainda são meio desequilibrados entre o desejo de comentar filosoficamente cada tema e a linguagem não suficientemente trabalhada.
Mas, para você que sempre teve receio de começar a ler um daqueles romances caudalosos de Thomas Mann (todos reeditados pela Nova Fronteira nos últimos dois anos), estas Seis Primeiras Histórias constituem uma porta de entrada privilegiada para o universo de um dos mais importantes romancistas de todos os tempos.
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