Cultura & Lazer Titulo
Cacá Diegues define 'Deus é brasileiro' como um road movie
Patrícia Vilani
Do Diário do Grande ABC
30/01/2003 | 18:12
Compartilhar notícia


Cacá Diegues gosta de ressaltar que seu novo trabalho, Deus É Brasileiro, que estréia nesta sexta em quatro salas do ABC e circuito nacional, não é um filme religioso. Usando várias locações, sempre na margem esquerda do rio São Francisco, ele prefere dizer que se trata de um road movie (filme no qual as ações se passam na estrada). A trama nasceu de um conto curto de João Ubaldo Ribeiro, intitulado O Santo que Não Acreditava em Deus, e o roteiro foi escrito pelo próprio diretor, com a colaboração de João Ubaldo. E lembra o caminho de redenção – que não existia no texto original – percorrido pela personagem de Fernanda Montenegro em Central do Brasil (1998), de Walter Salles.

Sai a amarga professora Dora (que escreve cartas para analfabetos na estação Central do Brasil até encontrar o órfão Josué), e entra Deus, um Todo Poderoso rabugento e descrente na humanidade. O papel caiu muito bem para Antônio Fagundes, que o compara a outro personagem que encarnou no cinema. “Foi mais fácil fazer Deus do que Villa-Lobos”, afirmou, em entrevista concedida em São Paulo, na semana passada. “Villa-Lobos tem referências. Mas fazer Deus foi prazeroso, porque ele está humanizado no filme”.

Deus É Brasileiro é um elogio à imperfeição. Na viagem de Deus em busca de um santo brasileiro para substituí-lo, ele redescobre os homens e passa a entendê-los. “Eu trato o personagem como uma figura literária famosa, sem nenhuma intenção religiosa. Me perguntar se eu acredito em Deus, no caso, equivale a perguntar para Spielberg se ele acredita em ETs”, disse Cacá.

A trama – Muitos lembrarão do João Grilo de Ariano Suassuna ao se deparar com o personagem Taoca (Wagner Moura). É um pescador e borracheiro que sobrevive em Maceió (AL) de pequenos golpes. “Mas ele é mais moderno, fala frases em inglês, coisa que Suassuna não permitiria”, diz Moura. Taoca foge de um cobrador quando encontra, no meio do mar, um homem que diz – e em seguida prova – ser Deus. Ele está cansado dos erros cometidos pelos homens e quer férias. Para isso, precisa encontrar um santo que se ocupe de seus deveres enquanto ele estiver ausente.

E Taoca, de passagem, é escolhido para levá-lo até Quinca das Mulas (Bruce Gomlevsky), o candidato de Deus a santo. O encontro inesperado vem em boa hora para o malandro, que está preocupado com seus problemas materiais. Mas a viagem torna-se mais longa do que o previsto, já que Quinca nunca está onde dizem que ele está, e ganha mais uma companheira quando a solitária Madá (Paloma Duarte) foge de casa para seguir Deus, acreditando que ele é um professor do Sudeste a caminho de São Paulo.

Versátil – Cacá Diegues acumula no currículo bons filmes e uma obra-prima, Bye Bye Brasil (1980), no qual prevê a unificação do país pela televisão, que tem como conseqüência o extermínio das culturas regionais. O diretor é considerado um dos mais versáteis do Cinema Novo pela diversidade de sua obra, que aborda todos os gêneros.

Depois de Bye Bye, vieram Quilombo (1983), que conta a história de Zumbi dos Palmares; Um Trem Para as Estrelas (1987), com Betty Faria; Dias Melhores Virão (1989), que estreou na TV antes de chegar aos cinemas (o que apontava uma grave crise do cinema nacional); Veja Essa Canção (1994), uma parceria com TV Cultura; o ambicioso projeto Tieta do Agreste (1997), com Sônia Braga; e Orfeu (1999), uma adaptação de Orfeu do Carnaval, de Vinicius de Moraes, que poderia ter sido evitada.

Deus É Brasileiro é o melhor longa de Cacá desde Bye Bye Brasil. Ele próprio fala do projeto como uma vitória. “Há muitos anos eu não sentia tanto prazer em fazer um filme”, disse. O resultado está na tela. Boa história, belíssima fotografia, grandes atuações. Um nacional imperdível.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;