Alta, com cabelos fartos e traços marcantes, Vanessa da Mata não passa despercebida. E assim é sua música, tão pessoal quanto sua aparência.
A matogrossense revela ter a MPB como força motriz de sua criação. Mas, em vez de trancafiar-se dentro dos limites deste gênero, expande-se. Percorre o rastro do pop em Eu Quero Enfeitar Você, investe no toque folk de Música, imprime seu toque pessoal na releitura de Eu Sou Neguinha? (de Caetano) e assume um certo tom brejeiro na faixa Joãozinho.
Serelepe, ainda resgata do baú de Saltimbancos a música História de uma Gata (Nós, gatos, já nascemos pobres/ Porém, já nascemos livres/ Senhor, senhora, senhorio/ Felino, não reconhecerás...), versão assinada por Chico Buarque para a criação de Bacalov e Bardotti. É uma alusão à liberdade decretada pela cantora que, aos 14 anos, saiu de casa em busca de seus sonhos.
Mas o mais interessante é o olhar feminino - e de algum modo contemporâneo - presente nas letras. A mulher descrita pela matogrossense pode, num lamento à base de voz e violão, reclamar das imposições de seu parceiro, na música Zé: "Você faz com que o meu coração/ Siga a tua beleza só/ Vá lembrar à tardinha/ Quando nos conhecemos, Zé/ Havia uma beleza ali/ Ou era criatividade minha?".
Ou então, pode passar anos conformada em uma relação sem entrega, como tantas nesse mundo de pouco tempo para as coisas do afeto: "Se eles não têm pose/ Nem maldade/ Eles não têm culpa/ Nessa cidade/ Eles não sabem amar/ Coisas da vida" (Ela x Ele na Cidade Sem Fim).
O apelo, porém, pode seguir na contramão de toda modernidade, quando Vanessa canta, na faixa Vem: "Desligue nossos celulares/ Três dias para um recomeço, vem". O instrumental é econômico, o balanço remete ao xote.
Só que, como toda mulher, há a possibilidade de se apaixonar perdidamente. E aí, Vanessa canta a promessa de dar um amor "desses de cinema" em Ai, ai, ai... e celebra a felicidade do encontro em Ainda Bem, faixa que abre o disco e que é uma das melhores.
O desencontro é outro ponto de vista da artista. Só que aqui, de forma divertida. A faixa é a que batiza o disco e nela, Vanessa fala sobre uma menina que fica na janela observando o moço sedutor pelo qual todas choram. Referências diretas à cantora: "Nos cabelos dela não se toca, ouviu?/ Eles são de nuvem ou de bombril?/ Eles são ousados ou só seus? Essa boneca tem manual".
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