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Almanaque do Fusca
Melina Dias
Do Diário do Grande ABC
14/08/2006 | 08:10
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A humanidade se divide em dois tipos de pessoas: as que gostam de Fuscas e as que não. A máxima, obviamente cunhada por algum apaixonado pelo carrinho, tem lá sua lógica. O Volkswagen Sedã nasceu para ser popular sob o conceito de economia e praticidade. De humilde virou cult. No Brasil é um símbolo dos duríssimos anos 70. Hoje, ter um Fusquinha original é puro charme. Toda essa história pode ser entendida no Almanaque do Fusca (Ediouro, 39 págs, R$ 39,90).

O livro de Fábio Kataoka e Portuga Tavares, jornalistas especializados, herdou o formato dos bem-sucedidos Almanaques dos Anos 70 e dos 80, da mesma editora. O visual deve chamar de imediato atenção dos nostálgicos nas prateleiras das livrarias.

Recheado de fotos, o volume já começa surpreendendo ao publicar uma das raras imagens em que Adolf Hitler aparece sorrindo, ao contemplar o protótipo do fusquinha. E o que um dos homens mais 'do mal' de todos os tempos tem a ver com a trajetória do simpático besouro? Tudo, ou, ao menos, 50%.

Foi ele quem encomendou ao criador da criatura, o engenheiro Ferdinand Porsche, o Volkswagen (carro do povo, em alemão). Hitler determinou que o veículo deveria ter velocidade máxima de 100 km/h; ser capaz de enfrentar subidas; consumir no máximo 7 litros a cada 100km/h, uma vez que o combustível era caro etc, mas principalmente, ser refrigerado a ar, porque nem todas as casas alemãs possuíam garagem, e no inverno a água no radiador congelaria. Porsche aceitou o desafio e fechou contrato com o governo alemão em 1934. Era o começo da história do carro que venderia 22 milhões de unidades em todo o mundo (o recorde será batido em breve pela irmã Kombi, estimam os autores).

A leitura do Almanaque é interessante até para os que não entendem nada de carros. Evita aprofundamentos técnicos e destaca muitas curiosidades, como o uso do carro na guerra, o modelo anfíbio e como o veículo conquistou países como os Estados Unidos. Só podia ter sido criado lá o concurso bettle craming, algo como 'abarrotando o besouro', em que jovens disputavam quem conseguia colocar mais gente dentro de um fusca. A propósito, o recorde dessa prova é de um grupo de universitários da Áustria: 57 pessoas num Fusca!

No primeiro capítulo, o Almaque dá conta da história do carro até a última edição no México, em 2002. Também relembra a palhaçada populista do então presidente Itamar Franco, que pediu, em 1993, o relançamento do Fusca à VW. A montagem foi reativada a um custo de US$ 30 milhões. Detalhe: ele não comprou nem um dos 47 mil veículos fabricados com a desculpa de que não tinha dinheiro.

Antes do capítulo 2, sobre a família Fusca (Variant, Brasília etc), o leitor é brindado com uma série de fotos coloridas. São reproduções de campanhas publicitárias ou registros históricos, caso da matadora combinação do ator Paul Newman e seu cabriolet (conversível) vermelho, em 1968.

Os fora-de-série, modelos montados sobre o VW, como o Dacon, Miura, Bugue, Puma e Gurgel são temas do capítulo 3. Na seqüência, muita velocidade com os carros de prova e os modificados (destaque para o engraçado mini royce, um Fusca com frente de Rolls-Royce, coisa para inglês ver). As campanhas publicitárias dos fuscas também ganham um capítulo.

Na seção O Ícone de um Tempo, os autores mostram a presença do Volks Sedã em três gerações, do cinema à pintura, da música às artes performáticas. Na série para o cinema como Herbie, o Volks chegou até mesmo a ser humanizado. Na capa de Abbey Road, o enigmático álbum dos Beatles, um Fusca branco ilegalmente estacionado sobre a calçada ajuda a compor o intrigante fundo (há uma lenda de que havia uma mensagem subliminar nas chapas do carro), à frente do qual os músicos atravessam a rua. Meio de transporte de importantes personagens da contracultura, o Fusca também foi personagem de desenhos animados evocando liberdade, personalidade, força, confiança, companheirismo. Algo bem resumido pelo título do clássico Se Meu Fusca Falasse (1968).

Curiosidades

Apesar de refrescante, o Fusca com teto solar não pegou no Brasil. Motivo: o machista apelido de Cornowagen.

Outra brincadeira também atrapalhou o desempenho de outro membro da família fusca no Brasil, o 1600 4 Portas. Ninguém mais queria o carro depois que ele caiu na boca do povo como 'Zé do Caixão'.

A música Fuscão Preto é de autoria da dupla Miramar e Miraí, mas quem fez sucesso com ela foi Almir Rogério, que correu para comprar um Fusca quando o dinheiro começou a entrar.

O guitarrista do Sexteto Onze e Meia, Carlos Nascimento, o Tomati, herdou esse apelido do primeiro carro, um Baja 75/84 vermelho-ferrari.

Joaninha, barata, tartaruga e escaravelho são alguns dos apelidos do veículo pelo mundo. Fusca é corruptela de Volks. Em Cuba ele é huevito (ovinho).

No dia 7 de janeiro de 1959, quatro dias depois de ser produzido em

São Bernardo, o primeiro Fusca seria vendido ao empresário paulista Eduardo Andréa Matarazzo.




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