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Moradores da periferia sofrem com a falta d'água
André Vieira
Do Diário do Grande ABC
12/10/2010 | 07:07
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A seca, quem diria, não é mazela restrita ao nordeste brasileiro. Todos os dias, famílias que vivem no Grande ABC - e que recebem mensalmente a conta de água - se deparam com torneiras vazias. Por aqui, não há escassez de recursos hídricos, já que a região é servida pela Represa Billings, com capacidade para armazenar 123 bilhões de litros de água pótável. O problema é a falta de planejamento e ações das autarquias e empresas responsáveis pelo abastecimento nas sete cidades.

Em bairros periféricos ou que cresceram em áreas íngremes, a chance da intermitência no serviço de abastecimento se repetir é maior. Levantamento feito pelo Diário mostra que a intermitência é crônica em diversos pontos da região, e em alguns casos, se arrasta há décadas. As companhias garantem investir milhões para garantir o acesso à água. Mas reconhecem que não sabem, de fato, quantas famílias são submetidas diariamente à rotina marcada por improvisos e muita reclamação.

SISTEMA
Professor de planejamento urbano da UFABC (Universidade Federal do ABC) Ricardo Moretti explica a dinâmica de serviços como abastecimento de água ou energia como uma ‘teia de aranha'.

O sistema central corresponde à captação e o tratamento da água. Em seguida vem o sistema arterial, com as grandes tubulações e adutoras que abastecem os reservatórios. Por fim está o sistema capilar, que leva água para as torneiras.

"Quando se está perto de áreas centrais, os diversos serviços de abastecimento são interligados. Mais para a borda das cidades, essa interligação vai ficando descontinua, ou deixa de existir", sustentou Moretti.

Segundo o professor, famílias que estão em bairros afastados acabam sendo atendidas por um único sistema. Se, por qualquer motivo, o sistema falha, a população fica suscetível aos problemas de falta d'água.

Para o especialista, a necessidade de se resolver a situação de fragilidade desses bairros é prioritária.

"Onde a cidade está mais crescendo é na periferia. As maiores densidades populacionais não estão nas áreas centrais, melhor equipadas, mas nos bairros afastados."

O descaso e a lentidão do poder público transformam tarefas simples em inferno para muita gente, que não pode escolher a hora de tomar banho ou lavar o chão da cozinha. É o caso da doméstica Claudia Santos, 42 anos. Ela vive com mais nove pessoas em uma viela da Rua Marco Antonio, no Jardim Inamar, em Diadema. Teve de aprender a racionar o uso da água não por consciência ambiental, mas porque é obrigada a conviver com a intermitência do serviço de abastecimento.

"É preciso ficar em estado de alerta e não deixar a caixa esvaziar. Tem dia que o serviço está normal, no outro as torneiras ficam secas", contou Claudia.


Independência: ‘só acredito vendo'
Tal como São Tomé, que reza a lenda bíblica não era um sujeito que se impressionava com discursos, os moradores da Rua Almirante Cockrane, no Jardim Indpendência, em São Bernardo, querem ver para crer que a Sabesp irá resolver no ano que vem os problemas de abastecimento do bairro.

Há pelo menos uma década, as famílias convivem com o inconveniente de não terem água disponível 24 horas por dia. A situação dos moradores foi abordada em reportagem publicada no Diário em 24 de setembro.

A Sabesp informou que o problema deverá ser resolvido após a construção da adutora Vila Marchi/Alvarenga e de um reservatório na região do bairro Batistini. A primeira fase já teve início, mas, a segunda, só termina em dezembro de 2011.

"Moro aqui há um ano, mas sei que os vizinhos brigam por isso tem muito tempo. Quero ver se agora vão resolver", ponderou a professora Sandra Barbosa, 31.

No prédio em que a professora mora com o marido e três filhos, os vizinhos instalaram uma bomba para sugar água de tambores.

"Às vezes, ficamos sem água por alguns dias seguidos, quem tem caixa d'água até que consegue se virar, quem não tem se dá muito mal", contou a dona de casa Simone Men, 35.

Em quase todas as residências da rua, pela fresta dos portões, é possível enxergar tambores, baldes e até caixas d'água no chão.


Empresas culpam geografia da região
Os problemas de intermitência no abastecimento de água estão ligados, sobretudo, às questões de geografia. A justificativa é das empresas que administram o serviço.

Bairros que se desenvolveram em regiões mais altas e distantes dos reservatórios estão entre os locais onde a falha é mais sentida. A dificuldade é transportar a água para esses pontos e fazê-la subir pelos canos. A solução exige obras.

O problema seria menos sensível se a evolução das cidades tivesse sido planejada, ou ao menos fiscalizada.

Segundo a Saned (Companhia de Saneamento de Diadema), o problema no Inamar ocorre porque o bairro está em uma das áreas mais altas da cidade e do lado oposto do principal reservatório, o Nações.

Para solucionar o problema, a companhia está tocando três obras: duas adutoras e um reservatório. "Quando os três estiverem prontos, o bairro do Inamar não sofrerá mais intermitência", informou.

A Sama (Saneamento Básico de Mauá) informou que atacou o problema com a instalação de boosters - bombas de recalque. Segundo a empresa, 13 máquinas já estão em funcionamento e outras duas aguardam liberação. Ainda assim, admite a necessidade de construção de dois novos reservatórios, e busca recursos para execução.

A Sabesp (Companhia de Abastecimento do Estado de São Paulo) apontou séria de obras concluídas ou em execução como forma de solucionar das falhas em São Bernardo.

Entre as intervenções, estão a implantação de programas de redução de perdas e a instalação de novas tubulações. O investimento, diz a empresa, passou dos R$ 200 milhões.

O Semasa (Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André) informou que mantém bombas mais tempo ligadas para normalizar o serviço em regiões altas, mas que não tem "registrando nenhuma anormalidade."

Como obras de saneamento são caras e demoradas, o presidente da ONG Universidade da Água, Gilmar Altamirano, sugere o investimento em educação ambiental. "Em paralelo, é preciso esclarecer a que intervenções de saneamento estão unidas com saúde pública e todos precisamos fazer boa gestão da água", afirmou. AV




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