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Assassinato da família Gonçalves completa três anos sem definição da Justiça

Julgamento sofreu quatro adiamentos em 2022 e advogado teme nova postergação; mulher teria mandado matar a mãe, pai e irmão por dinheiro em Santo André

Renan Soares
28/01/2023 | 07:30
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Foto: Nario Barbosa/DGABC


Um crime que chocou o Grande ABC, o assassinato de Flaviana de Meneses Gonçalves, na época com 40 anos, seu marido Romuyuki Veras, 43, e o filho deles, Juan Victor Gonçalves, 15, completa exatos três anos neste sábado (28). Apesar do longo tempo, o processo segue sem definição, já que o julgamento dos cinco acusados pelo crime, entre eles a filha do casal e irmã do adolescente, teve quatro adiamentos em 2022. Marcado para 6 de março de 2023, o novo Júri segue com uma perspectiva negativa pela frente.

O assassinato cometido neste mesmo dia em 2020 teve grande repercussão, uma vez que a filha do casal, Anaflavia Meneses Gonçalves, estava envolvida. Além dela, a sua então companheira Carina Ramos de Abreu,  também é acusada do crime, além de Juliano Oliveira, Jonathan Fagundes, primos de Carina­, e do jovem Guilherme Ramos. Os cinco réus respondem por homicídio triplamente qualificado, ocultação de cadáver, roubo e associação criminosa.

Segundo a denúncia apresentada pelo MP (Ministério Público), o grupo agiu no fim da noite do dia 27 de janeiro, na casa dos pais de Anaflavia, na Rua Caminho dos Vianas, 601, no Bairro Jardim Irene, em Santo André. O casal Anaflavia e Carina teriam arquitetado o plano visando uma quantia financeira. Já Juliano, Jonathan e Guilherme aceitaram participar após a promessa de recompensa em dinheiro. A denúncia cita que o modo de ação dos acusados foi violento, dificultando qualquer tentativa de defesa das vítimas.

Anaflavia e Carina, respectivamente, quando foram presas pelo crime (Foto: Arquivo)

Em 2022, foram quatro tentativas de julgamento dos réus até a nova data em março. A primeira marcada foi no dia 21 de fevereiro, seguida de 13 de junho, 19 de setembro e a última, em 21 de novembro, todas no Fórum de Santo André. Entre os motivos destacam-se advogado com atestado e falta de testemunhas. Na última tentativa, um novo fato veio à tona: o pedido de laudo pericial de insanidade mental para Anaflavia. Atualmente marcado para 18 de abril de 2023, o exame gera temor de uma nova postergação do Júri.

“Entendemos que o Júri pode ser desmembrado e acontecer, mas particularmente eu entendo ser muito pouco provável. Existe o princípio de comunhão de provas e, imagino eu, infelizmente as defesas irão insistir no sentido de quer fazer um julgamento com todos os (réus) presentes. Lamento pelo fato da família nesses três anos continuar com o ‘caixão aberto’, em um luto que se estende cada vez mais”, afirma o advogado Epaminondas Gomes de Farias, assistente de acusação da família Gonçalves.

Quatro acusados estão presos em Tremembé, no Interior, com exceção de Guilherme, que está detido no CDP (Centro de Detenção Provisória) II de Pinheiros.

O CRIME
Segundo a denúncia apresentada pelo MP, a relação homoafetiva de Anaflavia com Carina era de conhecimento de seus pais, que tinham uma boa convivência com as duas. Os pais de Anaflavia, Flaviana de Meneses e Romuyuki Veras, tinham estabilidade financeira graças a empreendimentos em shoppings da região, fato conhecido pela filha e sua namorada. O que teria motivado o crime foi o fato do casal suspeitar que Romuyuki tinha um seguro de vida, além dos altos lucros conquistados pelos negócios da família durante festas de fim de ano em 2019.

Juliano, Jonathan e Guilherme, amigos próximos de Anaflavia e sua namorada, aceitaram participar do plano traçado pela dupla desde que recebessem R$ 15 mil, no caso de Juliano e Guilherme, e R$ 5 mil, no caso de Jonathan. O pagamento seria feito com os cerca de R$ 85 mil em dinheiro supostamente guardados dentro do cofre da família. A casa, veículos e o restante do montante ficaria com a filha do casal assassinado. O grupo teria se encontrado em duas datas na semana anterior ao crime, para arquitetar a ação.



Carro foi encontrado queimado na estrada do Montanhão, em São Bernardo (Foto: Reprodução)

Em 27 de janeiro de 2020, dia do aniversário de casamento de Flaviana e Romuyuki, o plano foi colocado em prática. O grupo teria entrado no fim da tarde no condomínio residencial, com os homens escondidos no banco traseiro e Carina ficando do lado de fora da residência. Entre idas e vindas de Anaflavia, a invasão foi iniciada por volta das 21h50, com apenas Romuyuki e Juan Victor, irmão de Anaflavia, dentro da casa. Os dois foram rendidos até a chegada da mãe, Flaviana, por volta das 22h15. Ela foi ameaçada a abrir o cofre e neste momento o plano começa a dar errado, já que o compartimento estava vazio.

Após o fato não planejado, o grupo teria começado a roubar os bens do casal, como televisão, jóias, coleção de moedas, videogame, coleção de carros em miniatura, perfumes e os celulares. A denúncia destaca que as vítimas levaram fortes golpes na cabeça durante todo tempo em que estiveram com os criminosos. Após a ação, os cinco matam Flaviana, Juan e Romuyuki sufocados. Já no dia 28, próximo à 1h da manhã, os corpos foram retirados da casa no porta-malas de um Jeep Compass. O veículo foi encontrado na Estrada do Montanhão, cerca de 1h30 depois, totalmente queimado.

Apesar dos corpos terem sido encontrados carbonizados dentro do carro, os laudos necroscópicos atestaram que as vítimas morreram por traumatismo craniano provocado pelos golpes. Os itens roubados foram encontrados poucos dias depois, na casa das namoradas de Guilherme e Jonathan. Cabe ressaltar que toda a narrativa descrita na matéria faz parte da conclusão da investigação policial, que embasou a denúncia apresentada pelo MP ao Júri.

DEFESA
O Diário entrou em contato com todos os advogados de defesa envolvidos no processo, visando ouvir todas as versões dos envolvidos no processo. O advogado de defesa de Anaflavia e de Guilherme, Leonardo José Gomes, afirmou que o acusado foi chamado para um roubo e que não teria conhecimento das mortes que ocorreram. Gomes defende Guilherme desde o início da investigação.

Em relação a Anaflavia, o advogado afirma que assumiu o posto de defesa durante o processo. “Recebi um contato que ela não estava satisfeita com seus advogados. Nos poucos momentos que tive com Anaflavia, já percebi que ela sofria de um devaneio momentâneo. Fizemos um exame particular e notamos que ela teve este momento de insanidade, por isso pedimos essa investigação (laudo pericial sobre a sanidade mental)”, afirma o Gomes.

Leonardo José Gomes afirma que, mesmo com Anaflavia sendo acusada de ser uma das mandantes, ele tem confiança que irá provar que a ré não tinha conhecimento “de 70% do que aconteceu na casa”, afirmando que sua cliente foi manipulada pela então companheira Carina Ramos de Abreu.

Já a advogada dos irmãos Jonathan e Juliano, Alessandra Jirardi, disse à reportagem que os dois negaram a ela a participação no crime de homicídio. “Eles afirmam que o combinado era realmente realizar um roubo, desde o início. Declaram que quem executou com as próprias mãos as mortes foi a prima dos irmãos, Carina. Eles pretendiam subtrair bens e cometer crimes contra o patrimônio, não contra a vida”, afirma Jirardi.

O Diário procurou o advogado de Carina, Fábio Gomes da Costa e seus auxiliares, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto para manifestação.

FAMÍLIA
As consequências dos atos de Anaflavia, Carina, Juliano, Jonathan e Guilherme impactaram diretamente a vida de quem convivia e tinha um carinho pelo trio assassinado naquela noite em 2020. Vera Lúcia Chagas Conceição, 60 anos, mãe de Flaviana, avó de Anaflavia, relembra com tristeza a perda da primeira filha, ainda mais pelo fato do plano ser arquitetado por alguém da própria família.

“Vai chegando esse dia (28 de janeiro) vou revivendo tudo. Estou vivendo um dia após outro com Deus me ajudando, não tenho expectativa de mais nada”, afirma Vera Lúcia. A mãe, que mora em Minas Gerais, diz que tentará vir a São Bernardo neste dia 28 para visitar o cemitério onde a filha, genro e neto estão enterrados. “Eu sou uma pessoa triste, não tenho mais alegria. Tenho que viver porque quando sepultei minha filha prometi que ia até o final por Justiça. É uma dor que não tem remédio, que não sai da minha mente”, relata.

Diogo Reis, 33 anos, é primo de Flaviana e relembra o impacto que o crime gerou em diversos membros da família. Além de ressaltar a tristeza de sua tia Vera Lúcia, ele revela que o tio infartou e logo depois foi diagnosticado com Alzheimer, um distúrbio cerebral, e costumeiramente diz que vai a Tremembé – cidade onde quatro dos cinco réus estão presos – para perguntar os motivos do crime. “O que nos chateia é essa morosidade, a falta de compromisso com a verdade. Por mais difícil que seja, acreditamos que a Justiça será feita, a Anaflavia será condenada, assim como Carina e os meninos também”, afirma Diogo.

Os dois destacam Juan, morto aos 15 anos, como “um menino cheio de vida”, educado, e com amor pela avó Vera Lúcia, O garoto dizia que seu sonho era começar a trabalhar para ajudar a família na questão financeira. A família destacou a alegria de Flaviana e sua constante preocupação com aqueles que amava, principalmente a filha, Anaflavia, que cometeria o crime contra a mãe. Segundo Diogo, Romuyuki era tímido, mas tinha muito respeito por todos ao seu lado.




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