Setecidades Titulo
'Era necessário ser melhor para ser considerada igual'
Willian Novaes
Do Diário do Grande ABC
07/03/2011 | 19:24
Compartilhar notícia


Impacto, coragem e desafio. Assim pode ser resumida a vida de uma mulher de sucesso. E ela se chama Vânia Dividino. Com 15 anos, ela aproveitou a indicação de um professor, quando cursava desenho industrial em Santo André, e ainda colhe os frutos.

Ela era a única garota a dividir as pranchetas com mais de 70 homens na Volkswagen. Ao longo de três décadas superou o preconceito e alcançou vários cargos importantes na empresa, inclusive na assistência da presidência para três diferentes gestões.

Atualmente ela é encarada pelos funcionários da linha de montagem quando passa, não por ser iniciante, mas uma bela mulher aos 47 anos, de 1,77 metro de altura, "mais seis de salto" e que ocupa um dos cargos de destaque da empresa.

Vânia desempenha a função de gerente de Planejamento e Gerenciamento de Produto da Volkswagen do Brasil. Seu último desafio foi o lançamento da nova família Fox. Resultado da ação: "Um sucesso", orgulha-se.

Para a vida ficar "mais tranquila" foram necessários 27 anos de trabalho. Os filhos já são adultos. As dificuldades no emprego ficaram para trás. Mas muito diferente do passado, em que inúmeras vezes correu para buscar as crianças na escola e voltava para a montadora para despachar documentos para a Alemanha e outras filiais no mundo afora.

Ainda lembra dos maus lençóis que passou por ter um chefe machista. "Foi difícil esse tempo", mas também recorda com orgulho o que fez para chegar aonde chegou. Percebeu que a faculdade de engenharia era indispensável. Estudou à noite. Com o inglês foi a mesma coisa. Ao notar que esse seria um diferencial, fez curso intensivo. A recompensa surgiu com promoções e reconhecimentos. "Era necessário ser melhor para ser considerada igual", relembra.

A qualificação foi extremamente necessária. Foram três pós-graduações e ela ainda teve tempo para apreender a nada fácil língua alemã. "Mas tem uma coisa, nunca deixei de ser mãe, por causa do meu trabalho. Foi complicado, mas contei com a ajuda da minha mãe e de funcionários". Na vida pessoal, o casamento terminou. "Existia um oceano no meio". Uma frase ouvida da filha mais velha, nos últimos meses, recompensou todas as dificuldades passadas. "Ela me disse que eu sou o orgulho dela. Foi fantástico."

Empresária está há 42 anos no comando de metalúrgica 

A calma e a disposição sempre andaram ao lado de Aparecida de Souza Alexandrino. Mesmo após 42 anos à frente de indústria metalúrgica, a senhora charmosa não perdeu a vaidade e a fala mansa que conquista qualquer um após minutos de conversa.

A mulher que precisou levantar as mangas, largar o emprego de secretária executiva e, então com três filhos pequenos, assumir a empresa familiar, ainda carrega a mesma energia para acordar cedo, aos 75 anos, e trabalhar todos os dias na metalúrgica Guaporé, na Vila Pires, em Santo André.

Pode-se dizer que Cida, como gosta de ser chamada, está à frente do seu tempo. Ela tinha e tem uma carga de trabalho acima do normal desde o final dos anos 1960. Chegava a ficar 17 horas diárias na empresa.

A empresária sempre contou com funcionários para ajudá-la, seja em casa ou na fábrica, mas não perdia a chance de ensinar seus cinco filhos e dar atenção para o marido. Ela está casada há 50 anos. Os funcionários a admiram. A maioria faz de tudo para cumprimentá-la, mesmo com um tchauzinho de longe, que logo é retribuído.

O jeito sereno foi bastante necessário para encarar as crises econômicas. O preconceito ela viu de frente. "Logo quando cheguei alguns funcionários foram embora e disseram que nem na casa deles a mulher manda", conta.

As dificuldades por ser mulher a empresária tirou de lado e tocou a vida. "O que adiantaria eu ficar chorando? Bola para frente", lembra, com o jeito doce de falar.

O seu orgulho, como toda mãe, é exibir seu filho, no caso de dona Cida, a sua fábrica. O local é impecavelmente limpo, organizado e arrumado. "Precisamos seguir algumas normas devido aos nossos clientes. Mas não é bonitinha?", comenta.

Mulheres líderes sindicais são raras 

No berço do sindicalismo brasileiro existem pouquíssimas "mães". Os "pais" estão em maior número e o ambiente é estritamente masculino e ainda machista. Poucas mulheres chegaram ao cargo máximo dentro da sua categoria. Ainda bem que existem exceções. Esse é o caso de Maria Rita Serrano. Ela é a presidente reeleita do Sindicato dos Bancários do Grande ABC. A categoria tem 7.000 mil trabalhadores e é uma das mais fortes.

Nem tudo foram flores para Maria Rita. Isso ela mesmo diz. Já chegou a ser chamada de bruxa por banqueiros em campanhas salariais. Já comandou greves e é osso duro de roer nas negociações.

Para chegar no atual cargo construiu uma carreira com direito a experiência como vice-prefeita em Rio Grande da Serra (2001-2004). O envolvimento no sindicalismo começou ainda na juventude. "Na Igreja Católica a gente participava do grupo de jovens e de discussões sobre a teologia da libertação e minha preocupação sempre foi com os direitos dos trabalhadores."

Logo na primeira empresa, como metalúrgica, participou do movimento grevista. O emprego como bancária chegou por meio de um concurso público e depois de muitas discussões, preconceitos e batalhas, foi parar no sindicato. Foi tesoureira, além de ser esposa de Vagner de Castro, ex-presidente da categoria. Após o período na administração municipal surgiu o direito de disputar a eleição na entidade. O marido ajudou, mas Maria Rita trilhou o seu próprio caminho. "Eu sou bastante dura nos conflitos e negociações. Ele é mais político", comenta sobre as diferenças entre as gestões do casal.

Na guarda municipal, sem perder a vaidade 

No Grande ABC existem pelo menos 418 mulheres nas guardas municipais. É um batalhão que utiliza a educação, a sensibilidade e o treinamento em sua rotina. A ignorância e a truculência são deixadas de lado pelo menos com elas. A maquiagem, brincos, esmaltes e cabelos penteados estão presentes seja para trabalhar dentro das bases ou no patrulhamento nas ruas.

O preconceito ainda existe. "Alguns guardas chegaram a falar que mulher dentro da viatura dá azar", comenta a instrutora Gleicis Fernandes, da GCM (Guarda Civil Municipal) de São Bernardo. Ela que foi a primeira colocada entre as mulheres no primeiro concurso aberto em 1999.

Mesmo com uma filha de sete anos e casada, decidiu encarar o trabalho na área de segurança. Em 11 anos de guarda, Gleicis já disputou três concursos e passou em todos, sempre nas primeiras posições.

Na rua já ouviu piadinhas, como "o que eu faço para ser preso", lembra. "Só dei uma encarada e o sujeito saiu de perto. A gente acaba levando como elogio."

Dentro da Guarda, para provar a competência, teve que se dedicar ao máximo. Atualmente não vê mais dificuldades. "Se pensam alguma coisa, não falam". Mesmo após esse período parte da família não sabe exatamente o que ela faz.

Diferentemente de Gleicis, a 3ª classe Verônica Antunes, 26, é uma das mais novas na GCM e a sua família apoia e sabe de sua função. Um irmão também é guarda e o outro está participando do processo seletivo. "Tem o lado bom e o lado ruim como toda profissão. O preconceito a gente passa por cima".




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;