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Ex-pescador, Fernandes agora agita outras redes
Marco Borba
Do Diário do Grande ABC
26/07/2010 | 07:16
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As redes fazem parte da vida do meia-atacante Fernandes, 25 anos. Filho de pescador, o paraibano de Caaporan (60 quilômetros de João Pessoa) se viu obrigado a seguir a carreira do pai desde os 3 anos para engrossar o orçamento da família de quatro irmãos. A jornada se estendeu até os 16 anos, quando ingressou no América, equipe de sua cidade natal.

A alegria com que comemora os gols contrasta com a lembrança amarga da infância quase perdida.

Fernandes conta que acordava às 3h e só voltava para casa por volta do meio-dia. Uma hora depois ia para a escola e, às vezes, disse, dormia sobre a carteira. Na época, a família havia se mudado para Pitimbu, cidade litorânea, para facilitar a atividade profissional do pai, Marinésio da Silva, 47 anos.

Conforme relata o atleta, foram anos difíceis. O pai trabalhava como mergulhador na caça de camarões a 20, 30 metros de profundidade. Detalhe: sem cilindro de mergulho. "Era pesca artesanal. Os mergulhadores desciam com uma mangueira na boca e respiravam com o ar que vinha do barco. Quando dava algum problema, tinham que ter fôlego para subir. Por causa da pressão debaixo d'água, teve gente que ficou com parte do corpo paralisada."

Visivelmente emocionado, ele admite que o pai enfrentou problemas duas vezes e ficou com uma perna paralisada durante um mês. "Não sei bem como é, mas o ar afeta o cérebro. Se a pessoa não estiver acostumada, pode até morrer."

Fernandes não chegou a correr os mesmos riscos do patriarca porque pescava com redes de arrasto. "São estendidas e presas perto das margens das praias. Meu pai disse que eu tinha que estudar. Mas não dava para contar com o pouco que ele ganhava. Comecei a ir escondido. Só minha mãe sabia. Alguns anos depois ela contou. Eu ganhava entre R$ 5 e R$ 10. Era pouco, mas ajudava a comprar o arroz e o feijão, que sempre faltava. Às vezes só tinha peixe para comer", revelou, com o tom de voz mais baixo do que de costume por conta da emoção do relato.

Segundo Fernandes, a maior parte dos camarões que o pai e demais mergulhadores pegavam eram destinados ao dono do barco. O restante era compartilhado entre os pescadores. "A gente tirava um pouco para comer e vendia o restante para ganhar um dinheiro."

Início - Os primeiros passos de Fernandes no futebol também foram longe das vistas do pai. Começou nas peladas nos campinhos de várzea até que aos 16 ingressou na base do América de Caaporan. O município fica a 20 quilômetros de Pitimbu.

"Eu ia treinar três vezes por semana sem o conhecimento do meu pai. Como era perto ia e voltava todos os dias. Só contei um ano depois, quando disseram que eu ia passar para o profissional e teria que me mudar para o alojamento do time. Após muita relutância, ele concordou", relembrou o meia-atacante do São Caetano.

Mesmo com a transferência para o clube a vida da família pouco mudou. "Ganhava R$ 100. O difícil era receber. Quando saía a grana, mandava parte para eles."

Fernandes ficou dois anos no América de Caaporan e disputou o Estadual de 2004, já como profissional. No ano seguinte, sem o apoio da Prefeitura local, o time faliu e ele foi para o Botafogo, um dos principais clubes da Paraíba, juntamente com o Campinense e o Treze.

Realidade familiar muda com vinda para São Paulo, diz atleta
A vida da família Silva só começou a mudar, conforme Fernandes, a partir de sua vinda para São Paulo, no ano passado. Ali, disse, passou a ter a certeza de que conseguiria realizar o sonho de viver do futebol e tirar o pai da pesca e a família da vida difícil na Paraíba.

Após fechar com o Oeste no fim do ano passado para disputar o Paulistão, o jogador trouxe os pais e dois irmãos para São Paulo.

A irmã mais velha não quis vir. Deixou Caaporan e mudou-se para João Pessoa.

"Ela só me vê agora nos jogos, pela tevê. Quando fala que é minha irmã, ninguém acredita. Acho que pensam que é história de pescador", brincou.

Brincadeiras à parte, logo que chegou ao São Caetano fisgou o lugar de Luciano Mandi. Curiosamente, Mandi é peixe de água doce dos rios brasileiros. O jogador tem contrato com o Azulão até janeiro de 2014.

Casado e pai Mikelly, 2 anos, antes de passar pelo Oeste, Fernandes defendeu o Botafogo (Paraíba) nas temporadas 2005/2006. Em 2007 foi para o América-RN nos dois anos seguintes defendeu o Campinense.




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