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FHC recua e prevê duelo Alckmin-Kassab
Fábio Zambeli
Da APJ
18/02/2008 | 08:38
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O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, mediador tucano nas composições eleitorais de 2008 e 2010, considera “pouco provável” a reedição de uma aliança PSDB-DEM na corrida pela sucessão em São Paulo e propõe um pacto de não-agressão entre os pré-candidatos Geraldo Alckmin e Gilberto Kassab no primeiro turno do pleito na capital. Em entrevista exclusiva concedida à APJ (Associação Paulista de Jornais), FHC sustenta que um acordo para evitar o embate prematuro dos dois aliados na primeira fase da eleição seria uma solução “racional”, mas politicamente inviável.

 

O ex-presidente, dizendo-se “amigo fraterno” dos governadores Aécio Neves (Minas Gerais) e José Serra (São Paulo), sugere a realização de prévias para definir o candidato do PSDB ao Planalto, rompendo a tradição tucana de decisões referendadas na cúpula, sem consulta às bases partidárias.

 

“Temos dois ótimos candidatos, o Serra e o Aécio. Algum mecanismo teremos de encontrar aqui. Se não houver definição por um e a desistência de outro, é preciso que a decisão não fique nas mãos de quatro pessoas. Isso não dá legitimidade ao processo. E quem não ganha, fica com raiva.”

 

Ao avaliar o desempenho do sucessor Luiz Inácio da Silva (PT), o sociólogo, agora imerso em debates de alcance global como a crise no Quênia e a turbulência política em Mianmar (antiga Birmânia) e no Sudão, reconhece que o Brasil está melhor hoje que ao fim de seu segundo mandato. E credita parte do êxito da economia brasileira ao atual cenário mundial.

 

APJ – Fazendo uma analogia, o Brasil do início de 2003, quando o senhor deixou o governo, e o Brasil do início de 2008. Está melhor hoje?
FHC – O Brasil está melhor do ponto de vista econômico, sim. O mundo está melhor, pois começou a crescer de novo em 2001. O crescimento até 2007 foi o maior desde a Segunda Guerra.

 

APJ – Estamos melhor por reflexo do resultado global?
FHC – É, mas também reconheço virtude. A César o que é de César. O governo teve a postura de não atrapalhar a estabilidade da economia e manter política fiscal adequada. Não é só o fato de ter um clima positivo. Houve responsabilidade em não desandar. E como o mundo é positivo, acho que o Brasil melhorou sensivelmente. Veja as contas externas. Hoje temos saldo comercial favorável de US$ 40 bilhões. Porque a China entrou no consumo, subiram os preços de matérias-primas e alimentação. Deduziram o incremento de preços de commodities devidas à China e a América Latina voltava a ter dívida externa. Devemos à China esta bonança. Mas, bem ou mal, está aí a bonança. Então, acho que melhorou.

 

APJ – PSDB e PT continuam em pólos opostos? O senhor vislumbra a possibilidade de convergência, como se chegou a imaginar que ocorreria?
FHC – Depois que o Lula fez sua carta de alforria, a Carta aos Brasileiros, em que se comprometeu a não fazer a ruptura que pregara a vida toda, ele sugeriu que as políticas que estávamos fazendo eram as que deviam ser feitas. O (Antonio) Palocci (ex-ministro da Fazenda) explicitamente disse isso. E fizeram. Mesmo na política social. Ampliaram, mas não criaram. Não houve mudança de qualidade, e sim de quantidade. Vivem dizendo: ‘herança maldita’. Mas vivem dela. Pegaram a herança, que não era maldita, e fizeram crescer. Tudo bem. Mas não vai haver convergência por uma razão simples, o poder. A briga não é ideológica ou pelas políticas. A briga é de partido, de poder. Digo que o PSDB e o PT disputam quem pilotará a locomotiva e carregar o atraso do resto do sistema político brasileiro. Os dois têm capacidade de levar a coisa. Isso vem sob a forma ideológica, um é neoliberal, outro é socialista. Mas nem um é neoliberal e nem o outro é socialista.

 

APJ – O Democratas não está avançando fortemente sobre um eleitorado específico, de classe média?
FHC – É possível. Conseguiram um segmento interessante, os contribuintes. É o partido que defende os contribuintes, o imposto e tal. Isso dá força, mas não o suficiente para dar primazia, capacidade suficiente para conduzir a máquina.

 

APJ – O senhor concorda com a nomenclatura dada por alguns segmentos à aliança PSDB-DEM de ‘Nova Direita’?
FHC – Não tem sentido. Qual era a velha direita? Qual é a nova esquerda? E o PT aliado ao PL e ao PMDB? É a nova direita? Isso são palavras de lutas políticas.

 

APJ – O processo eleitoral de 2008 tem forte conexão com 2010. E o PSDB tem dois expoentes nacionais hoje, os governadores Aécio Neves e José Serra. Aécio corteja uma aliança com o PT em Minas. E o governador Serra busca consolidar o pacto com o DEM em São Paulo. Quem está certo? Qual o parceiro do PSDB em 2010?
FHC – As situações são diferentes. Em Minas, a aliança é de todos com todos. Não sou contra, só precisa escolher o candidato. Aqui, dificilmente se terá aliança porque temos dois bons candidatos.

 

APJ – Mas o senhor tem defendido que se faça a aliança em São Paulo?
FHC – Política não é racional. Todos os partidos querem ganhar a eleição. Sou realista. Mas é preciso que não se matem no primeiro turno na campanha, pois no segundo terão de se unir.

 

APJ – A dobradinha PSDB-DEM será reeditada em São Paulo no primeiro turno?
FHC – Pouco provável. E é em São Paulo, porque varia muito de local para local. Veja só, PT e PSDB pertencem, no fundo, à mesma família social-democrática. O PT tinha horror, pois se dizia revolucionário. O PFL é mais liberal. No caso dos demais, a maioria quer estar próxima ao governo para tirar vantagem. Não são nem liberal, nem social-democrata, nem socialista. São atrasados, clientelistas. Você quer escárnio maior que o líder do governo Lula (Romero Jucá, do PMDB-RR) ser o mesmo que era meu líder? Meu vice-líder, na verdade?

 

APJ – Quais as possibilidades de o PSDB voltar à presidência em 2010?
FHC – Grandes. Em primeiro lugar, porque sempre há desgaste no exercício do poder. Segundo, que no caso do PT não há nomes fortes para a sucessão do Lula. Não acredito que se ‘faça’ alguém. Em terceiro, temos candidatos fortes e governamos Estados como São Paulo e Minas. Eleição não se joga de antemão, estamos longe ainda, mas no caso do nosso sistema político em que os partidos não têm expressão forte na sociedade e os nomes pesam bastante, considero essa uma vantagem que temos em relação aos outros.

 

APJ – Há um tempo-limite para se definir esse nome?
FHC – O que pode ter no caso do Serra e do Aécio, se for o caso, é um compromisso entre eles. O sistema de primárias dos Estados Unidos é interessante. É uma coisa fantástica, um ano antes, mobilizando as pessoas para votar.

 

APJ – Mas o senhor acha viável esta consulta às bases?
FHC – Algum mecanismo teremos de encontrar. Se não houver definição por um e a desistência de outro, é preciso que a decisão não fique nas mãos de quatro pessoas. Isso não dá legitimidade ao processo. E quem não ganha, fica com raiva.

 

APJ – Existe a chance de composição entre Serra e Aécio?
FHC – Tem de definir o colegiado. Sou amigo dos dois. Não é sensato dizer quem será agora.Tem de amadurecer mais e encontrar uma forma de convergência. Como acho que nenhum dos dois pretende sair do PSDB para ser candidato, até porque a Lei de Fidelidade deixou tudo mais difícil, o que é bom, temos de arranjar uma fórmula interna que permita uma pacificação. As pessoas são suficientemente maduras para entender que o que está em jogo é o poder federal, ou seja, muita coisa.

 

APJ – O senhor está fazendo um ‘mea-culpa’ em relação ao que houve em 2006, na disputa entre Serra e o então governador Geraldo Alckmin?
FHC – Ninguém queria ser, a não ser o Geraldo. Se o Serra quisesse mesmo ser candidato, era ele. Tinha-se a impressão de que eram duas ou três pessoas definindo.




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