Economia Titulo Vida dura
Aposentadoria não garante descanso
Erica Martin
Tauana Marin
24/01/2013 | 07:13
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Hoje é o Dia do Aposentado. Mas a maioria dos brasileiros que recebem o benefício da Previdência Social não tem o que comemorar. Para não pagar as contas em atraso, Salustiano Silva, 76 anos, morador de São Bernardo, não pode desgrudar da calculadora. Devido à cegueira da mulher, ele precisa arcar com as contas de casa sozinho. No orçamento mensal não sobra reserva financeira. "Ter plano de saúde é luxo. Necessito do atendimento público", declara.

Mesmo com a deficiência visual, Silva não consegue garantir a aposentadoria da mulher, por isso, o benefício de R$ 1.000 por mês é destinado ao pagamento das despesas básicas. "E olha lá. No supermercado compro apenas o necessário: arroz e feijão."

Salustiano Silva não está sozinho. Quem já se aposentou sente mês a mês o seu poder de compra despencar. Em 2000, o teto do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), que era de R$ 1.328,25, equivalia a 8,6 salários-mínimos. Hoje, a renda máxima, que subiu e está em R$ 4.157,05, corresponde a 6,3 salários.

Enquanto o salário-mínimo teve aumento de 9% neste ano - passou de R$ 660 para R$ 678 - o reajuste dos benefícios com valor superior ao piso ficou em apenas 6,2%. O especialista em Previdência Newton Conde, diretor da Conde Consultoria e professor da Fipecafi (Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras), esclarece, entretanto, que o mínimo deslanchou em relação às rendas maiores (por ser reajustado com base em outros índices) e, por isso, a diferença de ganhos fica tão discrepante.

Independentemente dos cálculos usados, o que se sabe é que o dinheiro tão necessário na velhice fica cada vez mais escasso.

O recebimento da pensão do marido, que já morreu, garante o pagamento das contas de Maria Henriques, 59 anos. "Minha sorte é que ganho um salário melhorzinho, devido ao meu esposo ter trabalhado a vida toda." Mesmo conseguindo pagar seus débitos, Maria mora com sua mãe, Dair Sgrignoli, 80 anos, aposentada rural. "Ela ganha um salário-mínimo. Se morasse sozinha não dava para cobrir as despesas. Mesmo assim, ela não tem convênio, já que os planos de saúde passam de R$ 1.000. É uma realidade muito difícil. Trabalha-se muito e não temos garantia de nada", diz a pensionista.

Segundo Silvio Paixão, professor de MBA em sistema financeiro da Fipecafi, quem tem renda média de R$ 4.000 aos 65 anos gasta por volta de R$ 1.500 com medicamentos e convênio médico, por exemplo. "Portanto, é preciso adquirir patrimônio que traga renda para ajudar quando a capacidade de trabalho diminuir", explica Paixão referindo-se ao fato de que as pessoas que vivem com salário maior do que o teto oferecido pela Previdência Social certamente terão que se readequar o padrão de vida na aposentadoria - caso não tenha reservas financeiras.

O diretor de políticas sociais da Associação dos Aposentados do Grande ABC, Luís Antônio Ferreira Rodrigues, reclama que só 13% dos 222, 9 mil aposentados da região recebem próximo do teto. "Mas na hora de pedir o benefício, eles perdem entre 7% e 8% do teto e têm de entrar com pedido de revisão para aumentar o valor", esclarece.

DE VOLTA AO BATENTE - Como a grana não é suficiente, muitos trabalhadores precisam permanecer no mercado de trabalho - no Grande ABC metade dos aposentados teve de voltar ao batente.

Mesmo tendo contribuído com a Previdência e trabalhado o tempo certo, o descanso não veio junto com a aposentadoria no caso de Alderano Cassetari, 63 anos. Para ele, que se aposentou em 1995 e ganhava cerca de dez salários-mínimos, hoje o benefício não soma cinco salários. "Para complementar a renda abri meu próprio negócio, uma loja de móveis em São Bernardo. No entanto, não estou conseguindo mantê-la e vou fechá-la. É mais vantajoso alugar o espaço", lamenta o ex-ferramenteiro de indústria.

 

Expectativa de vida aumenta e benefício é pago por mais tempo

O futuro do caixa da Previdência Social é cada vez mais preocupante - o deficit, que em novembro de 2011, era de R$ 4,467 bilhões, subiu para R$ 5,381 bilhões, no mesmo mês do ano anterior, crescimento de 20,4%.

"O fluxo de pessoas que se aposentam é maior do que o fluxo de profissionais que chegam ao mercado de trabalho. E, basicamente, o dinheiro arrecadado é usado para pagar os benefícios das pessoas que estão aposentadas, por isso a conta não fecha", explica o diretor e consultor sênior de previdência da Mercer, Eduardo Correia.

Além disso, as pessoas estão vivendo mais - o que faz aumentar a demanda por benefícios por mais tempo. De acordo com o IBGE, em 2011, a esperança de vida ao nascer no Brasil era de 74 anos e 29 dias, incremento de três meses e 22 dias em relação a 2010, quando a expectativa era de 73,76 anos. Mas também não significa que os brasileiros deixarão de receber o montante no futuro. "O dia que a Previdência der o calote quer dizer que o País quebrou. O que pode ocorrer é alterações, como na idade mínima para se aposentar, com o objetivo de diminuir o número de pessoas que recebem o benefício."

No Brasil, o homem precisa ter no mínimo 53 anos de idade e 30 anos de contribuição, já há mulher dever ter 45 anos de idade e 25 anos de contribuição para ter direito ao benefício. Correia, da Mercer, lembra que outros países alteraram recentemente a idade mínima para se aposentar. Na Itália, os homens precisam ter pelo menos 66 anos de idade e as mulheres não ganham o benefício com menos de 62 anos. Na Dinamarca, ambos devem ter 65 anos.

ATIVIDADES - Em comemoração ao Dia Nacional dos Aposentados, o Sindinapi (Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da Força Sindical) e a sede regional de São Paulo realizam hoje manifestação contra as decisões tomadas pelo governo federal em não extinguir o fator previdenciário e não conceder aumento maior do que a inflação para os beneficiários que recebem acima de um salário-mínimo. O ato, que conta com o apoio da Diocese de São Paulo, acontece em frente à Igreja da Sé, a partir das 9h.

 




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