Com dois anos de investigação, promotoria
apontará responsáveis por cobrança de propina
Exatamente dois anos após o Diário denunciar com exclusividade a existência de suposto esquema de corrupção na sede do Semasa (Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André), a fase de investigação criminal da Polícia Civil e Ministério Público está perto do desfecho. Sem mandato no Executivo, o ex-prefeito Aidan Ravin (PSB) é colocado como um dos principais mentores da lista. A promotoria tem apenas mais um depoimento a colher no Fórum e depois vai oferecer denúncia do caso à Justiça em cerca de dois meses.
O promotor Roberto Wider Filho sustentou que há “provas seguras” da materialidade do crime cometido na autarquia por conta de documentos remetidos e apreendidos, inclusive comprometendo Aidan. “Algumas delas indicam atuação direta do prefeito na gestão daquela crise”, disse ele, ao completar que existem elementos de autoria dos delitos. “Por isso deve ser oferecida a denúncia. Quando o inquérito voltar novamente com pedido de prazo ou conclusão da autoridade policial, quero ter realizado a oitiva e já dar esse encaminhamento. Isso vai levar no máximo 60 dias.”
O procedimento de denúncia é a manifestação do MP para que se inicie a ação penal. A promotoria apresenta a medida e se o juiz que ficar à frente do caso acolher a acusação, abre processo criminal. Depois disso, os envolvidos denunciados podem ser chamados de réus. Delegado que presidia o inquérito policial, Gilmar Camargo Bessa foi transferido para São Paulo. Ele não comentou o andamento ao justificar que o caso está sob segredo de Justiça. Anteriormente, alegou que havia indícios para condenação no escândalo.
Depois do oferecimento da denúncia, o processo deve demorar mais 90 dias para apresentação da defesa preliminar, por envolver servidores públicos. Finalizado esse período, a expectativa é que se tenha a sentença do juiz.
No momento, o MP levanta a participação de cada envolvido na suposta fraude no setor público. “A identificação de alguns dos responsáveis pela cobrança indevida (de propina) necessariamente não faz prova contra outros. Estamos verificando a responsabilidade individual”, frisou Wider, ao salientar que as acusações feitas posteriormente pelo advogado Calixto Antônio Júnior se confirmaram. “Ficou comprovado que ele representava o prefeito dentro do Semasa.”
O advogado foi indicado para atuar na autarquia, mesmo sem ser funcionário, para fazer fundo de caixa para campanha eleitoral, segundo a denúncia. No processo administrativo interno do Semasa número 5.463/11, apresentado por Calixto ao MP e à polícia, é detalhado que o ex-assessor de gabinete Antônio Feijó determinou a servidores da autarquia que os pagamentos a fornecedores seriam liberados somente pelo ‘novo funcionário’ (Calixto) a partir de novembro de 2011. A orientação havia sido feita por Aidan, de acordo com o documento. O advogado também entregou cópia da conta de seu celular, em que constam ligações a Aidan e a Feijó.
Questionado, Aidan diz estar tranquilo ao relatar que não teve participação nem conhecimento de qualquer irregularidade no Semasa. “Acreditei na capacidade do (então) superintendente (Ângelo Pavin) e minha orientação sempre foi a legalidade e a transparência. Não posso ser responsável por possíveis atos de outras pessoas. Sei o que eu fiz e foi sempre muito correto e ético”.
Pavin não foi encontrado para comentar o assunto.
O CASO
Em 4 de março de 2012, o Diário publicou denúncia de que empresas que aguardavam licença ambiental no Semasa eram procuradas por representantes da autarquia, que estariam cobrando propina para garantir a liberação do documento. Representantes de construtoras e um diretor do Semasa confirmaram o esquema. Durante a investigação do MP e da polícia, constatou-se também possível extorsão de credores do Semasa – a autarquia só pagava por produtos e serviços se recebesse verba de volta.
Coaf foi acionado para obter provas
Além do pedido de quebra de sigilos telefônicos e bancários dos envolvidos, os órgãos de investigação acionaram o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) para identificar movimentações suspeitas de dinheiro. Entre as atribuições do órgão federal está prevenir a utilização dos setores econômicos para a lavagem de dinheiro. Quando uma pessoa adquire imóvel, carro, faz pagamento à vista, o que demonstra atitude anormal, a ação é comunicada ao Coaf.
Esse levantamento seria uma das provas documentais anexadas ao processo, hoje com cerca de dez volumes. A averiguação foi submetida a diversos atrasos. Situação que atrapalhava a evolução dos trabalhos era, à ocasião, o foro privilegiado de Aidan. “Quando houve solicitação de quebra, estava ali incluído pedido contra o prefeito. Foi remetido ao TJ (Tribunal de Justiça), que envia à Procuradoria-geral. Essa tramitação burocrática gera demora natural até por conta da participação de novos operadores do direito”, mencionou o promotor.
Outra circunstância que amarrou a apuração foi o retardamento no envio dos documentos de quebra de sigilo requeridos. Após seis meses de espera pelos dados, por exemplo, a informação da operadora telefônica veio errada, em período diferente daquele requisitado, obrigando a novo pedido.
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