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A ‘lenga-lenga’ e a democracia
Marcelo Figueiredo
07/03/2025 | 08:56
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O presidente Lula publicamente tem criticado e pressionado o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis para liberar autorização para a Petrobrás explorar a Foz do Amazonas. Afirmou ainda que o Ibama, “sendo órgão do governo, não pode ser contra o governo”. O seu comportamento e sua frase dizem muito sobre o populismo latino-americano e naturalmente o brasileiro, e suas características.

É evidente que há interesses contrapostos na região. De um lado atuam as ONGs (Organizações Não Governamentais) na defesa do ambientalismo, real ou imaginário. De outro lado há interesse na exploração comercial da região, rica imagina-se em petróleo e gás. O desafio é encontrar um equilíbrio sustentável.

Em primeiro lugar devemos colocar as coisas em seu devido lugar. O Ibama não é um órgão de governo que cumpra a política pública ou partidária traçada pelo presidente. Lembre-se a etimologia da palavra autarquia: autos (próprio) e arquia (comando, direção). Portanto, autarquia significa comando próprio. Sem razão o Presidente da República ao menos até aqui.

No caso, trata-se de uma autarquia federal criada pela Lei 7735/1989, que tem por objetivo legal fiscalizar, monitorar e controlar o meio ambiente. As autarquias foram criadas exatamente serem um instrumento de descentralização técnica da administração pública direta.

Caso não tivessem nenhuma autonomia para atuarem não haveria razão para existirem. Não há dúvida que as autarquias submete-se ao controle administrativo do ente político que a tenha criado. Tal controle também é chamado de tutela. Mas essa tutela não pode interferir diretamente na vida da autarquia, sob pena de desconhecimento de que sua criação por lei lhe outorga uma série de direitos e deveres.

Dentre seus diversos objetivos institucionais e atribuições legais verificamos o necessário licenciamento ambiental, competência eminentemente técnica. Se é verdade que a decisão de explorar petróleo no mar do Amapá é política, de outro lado, o licenciamento para fazê-lo comporta uma decisão técnica. Essa e outras diferenças o presidente da República parece ignorar.

Lamentavelmente há algum tempo a América Latina é dominada pelo populismo, fenômeno que se situa em uma zona cinzenta entre a democracia e o autoritarismo; o populismo utiliza ambos os conceitos para se manter no poder. Há uma relação direta entre o líder e o povo através de uma estrutura vertical de poder; em geral há também um enfraquecimento das instituições democráticas e, particularmente dos mecanismos de freios e contrapesos.

No populismo, o que vale é a visão do ‘chefe’, não há um debate democrático das melhores soluções construídas pelo poder popular ou representativo. Há simplesmente versões edulcoradas pelo discurso demagógico ou eleitoreiro do líder que, em geral, só pensa em como continuar no poder. Quem sabe um dia possamos superar o populismo demagógico.

Marcelo Figueiredo é advogado, consultor jurídico e professor de Direito Constitucional e Comparado.




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