Após uma vida dedicada ao trabalho, ele enfrenta série de obstáculos que vão desde a redução de direitos obtidos até tentativas de golpes
ouça este conteúdo
|
readme
|
O Dia Nacional do Aposentado, celebrado na última sexta-feira, serviu para reflexão sobre as dificuldades enfrentadas por milhões de brasileiros que já deram sua contribuição à sociedade, mas ainda enfrentam desafios diários para viver com dignidade. A data é comemorada porque é o aniversário da Previdência Social, que completou 102 anos. Atualmente, o Brasil possui aproximadamente 25 milhões de aposentados, de acordo com dados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) de dezembro de 2024. Desse total, 2,1 milhões são mulheres e 11,4 milhões, homens. Não declaram o gênero: 1.619.
Especialistas em Direito Previdenciário destacam que a aposentadoria representa um momento de transição na vida de muitos brasileiros. “Após décadas de contribuição à sociedade e ao sistema previdenciário, a expectativa é de que essa etapa seja de descanso, segurança e qualidade de vida. No entanto, para grande parte dos aposentados, a realidade é marcada por incertezas financeiras, dificuldade de acesso à saúde, aos benefícios previdenciários e, muitas vezes, pelo descaso do poder público”, afirma o advogado Ruslan Stuchi, sócio do Stuchi Advogados.
Na visão do advogado Mateus Freitas, a data é fundamental para destacar a relevância dos aposentados na sociedade e reforçar a luta pela garantia de seus direitos. “É um momento para conscientizar a população sobre a importância de planejar a aposentadoria desde cedo, a necessidade de proteger o sistema previdenciário, garantindo sua sustentabilidade e acessibilidade, promover o respeito e a valorização do idoso, incentivando a inclusão social e o reconhecimento de suas contribuições ao longo da vida”, aponta.
Para o especialista, as dificuldades enfrentadas pelos aposentados no Brasil revelam a necessidade de um sistema previdenciário mais eficiente, transparente e justo. “A burocracia, os baixos valores dos benefícios, os erros no cálculo e a crescente ameaça de golpes são desafios que precisam ser enfrentados com maior informação e proteção. O Dia Nacional do Aposentado é um momento de reflexão e de luta por direitos, destacando a importância de proteger aqueles que tanto contribuíram para a sociedade e de garantir que possam viver com dignidade e segurança”, frisa Freitas.
Entre as principais dificuldades dos aposentado no Brasil, os especialistas destacam: o baixo valor dos benefícios, a falta de educação previdenciária, o alto número de golpes e a dificuldade no acesso aos benefícios. “Muitos aposentados recebem apenas o salário mínimo, o que é insuficiente para cobrir despesas básicas, como saúde e alimentação. Além disso, alguns enfrentam dificuldades para obter revisões ou correções de seus benefícios devido a erros de cálculo ou informações incompletas. Isso acontece muito, pois a maioria desconhece seus direitos, como a possibilidade de revisão ou de acumulação de benefícios em determinadas situações”, revela Freitas.
Stuchi ressalta que existe atualmente diversos golpes direcionados aos aposentados. “Atualmente, uma das grande ameaças é o aumento de golpes direcionados aos aposentados. Alguns criminosos se passam por servidores do INSS ou advogados e oferecem falsas revisões de benefícios ou promessas de aumentos no valor recebido, exigindo depósitos ou documentos sigilosos, colocando em risco a segurança financeira dos aposentados.”
Outro golpe recente é o do pagamento de mensalidades para associações e instituições coletivas de aposentados e pensionistas. Algumas entidades estão na mira da Justiça por fraudes, principalmente, para obter pagamentos por meio de descontos consignados no valor da aposentadoria. Ruslan Stuchi revela que esses descontos são de, aproximadamente, R$ 45 por mês, um valor que muitas vezes passa desapercebido.
O especialista explica que os aposentados não são obrigados a aderir a essas associações e muitos estão sendo pegos de surpresa com os chamados “descontos de mensalidade associativa”.
“Milhares de aposentados estão sendo lesados sem saber. Os segurados do INSS não são obrigados a aderirem a essas associações. Isso é um fato opcional. Então, o que está acontecendo hoje é que essas associações, de maneira abrupta, errônea, de má-fé, realizam descontos, mesmo sem o aposentado ou o beneficiário estar ciente desse desconto. Ou seja, as associações e instituições que deveriam ter o propósito de defender os aposentados, os beneficiários do INSS, estão fraudando os segurados para obter vantagens e aumentar o patrimônio financeiro”, alerta o advogado.
Para os especialistas não existe problema em aderir a uma associação de aposentados no Brasil, mas desde que ela exerça funções legítimas. Existem inúmeras associações que cobram uma taxa associativa em torno de 2,7% a 3% do valor da aposentadoria.
Outro obstáculo é a Reforma da Previdência, de 2019. “Com a reforma diversas regras sofreram alterações que endureceram a concessão de benefícios, prejudicaram o cálculo para a aposentadoria dos brasileiros e deixaram como legado dificuldades para o acesso aos auxílios e aposentadorias do INSS. As regras ficaram mais severas, ou seja, o trabalhador vai ter de trabalhar mais tempo e contribuir mais para que consiga seu benefício, além de que ela reduziu muitos valores”, observa João Badari, sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.
Entre as principais mudanças está a exigência de idade mínima para aposentadoria: 62 anos e 15 anos de contribuição para mulheres, e 65 anos e 20 anos de contribuição para homens. A aposentadoria por incapacidade permanente (anteriormente chamada de aposentadoria por invalidez) teve sua fórmula de cálculo alterada, resultando em um valor menor do que o auxílio-doença. Além disso, o segurado que trabalha exposto a agentes nocivos à saúde passou a ter de cumprir a idade mínima para a concessão da aposentadoria especial, e o valor da pensão por morte também sofreu drástica alteração. Antes, a pensão era de 100% do valor da aposentadoria do falecido ou do valor que ele teria ao se aposentar. Agora, o cálculo considera 50% desse valor, mais 10% para cada dependente com direito ao benefício.
“Dois exemplos da severidade da reforma são: a pensão por morte e a aposentadoria por invalidez. No caso da pensão por morte, as seguradas e segurados passaram a receber menos da metade do valor do benefício que recebiam antes de 2019. Já no caso da aposentadoria por invalidez, na maioria esmagadora dos casos, ela é menor até mesmo que o auxílio-doença, que é um benefício provisório, ela é mais severa e seu valor é menor. A gente espera que o judiciário também corrija essas injustiças”, pontua Badari.
O advogado Celso Joaquim Jorgetti, sócio da Advocacia Jorgetti, considera a reforma um grande retrocesso social. “Com a aprovação da Reforma da Previdência, ficou muito mais difícil se aposentar. Foi implantada a idade mínima, prejudicando aqueles que começam a trabalhar mais cedo, o que faz com que muitos só possam se aposentar quando já não tiverem condições de trabalhar. No Brasil, historicamente, quem tem menor renda começa a trabalhar cedo e agora precisará trabalhar muitos anos a mais devido à exigência de idade mínima. Em alguns casos, o segurado terá que contribuir por até 40 anos para ter direito à aposentadoria”, explica.
Revisão da vida toda é esperada
Entre as ações mais aguardadas pelos aposentados está a decisão final sobre a revisão da vida toda, que permitiria o recálculo das aposentadorias com base em todas as contribuições feitas ao longo da vida, não apenas aquelas após 1994. O STF (Supremo Tribunal Federal) chegou a decidir favoravelmente aos aposentados em 2022, mas posteriormente modificou seu entendimento, negando o direito. Atualmente, cerca de 102 mil aposentados aguardam uma decisão final, com a expectativa de que o direito seja garantido àqueles que ingressaram com ações antes da mudança no entendimento do tribunal.
“Aguardamos que ocorra o desfecho no ano de 2025 dos embargos de declaração, para que aqueles que ingressaram com um processo, que são 102 mil aposentados. Eles esperam que o Supremo garanta o seu direito porque ingressaram com ação antes da mudança de entendimento do tribunal”, explica Badari.
Os especialistas destacam que o grande desafio é encontrar um caminho mais tranquilo e justo para a aposentadoria no Brasil. “A reforma foi necessária e novos ajustes devem ser feitos nos próximos anos. Seria fundamental que o governo e o Judiciário revisassem a exigência de idade mínima para a aposentadoria especial, pois teremos idosos com a saúde ainda mais fragilizada. A forma de cálculo da pensão por morte e da aposentadoria por invalidez também precisa ser revista, pois prejudicaram enormemente os cidadãos”, ressalta.
Para Ruslan Stuchi, o ponto mais danoso da reforma é a sua influência no mercado de trabalho. “A reforma da Previdência vai obrigar o brasileiro a permanecer mais tempo no mercado de trabalho, em um cenário em que as empresas se acostumaram substituir funcionários mais velhos – e com salários maiores – por trabalhadores mais jovens e baratos. O temor é que isso crie um exército de desempregados de meia idade que ainda não podem se aposentar”, conclui.
Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.