Decisão acata pedido da Defensoria Pública e deve beneficiar ex-moradores do antigo Edifício Di Thiene, demolido em 2019; Prefeitura entrou com recurso
A Justiça condenou a Prefeitura de São Caetano a retomar o pagamento do auxílio-aluguel a 102 famílias que foram desabrigadas após demolição do antigo Edifício Di Thiene, em 2019. A juíza Ana Lucia Fusaro, da 2ª Vara Cível da Comarca do município, acolheu o pedido da Defensoria Pública de São Paulo e determinou o fornecimento da assistência até que o Poder Público implemente uma política habitacional definitiva para essas pessoas.
Na época, o Paço havia prometido às famílias afetadas abrigo, auxílio emergencial, atendimento assistencial e entrega de novas unidades habitacionais através de convênio com a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano) – previstas para serem finalizada em dezembro de 2022. Até o momento, as obras nem sequer foram iniciadas. Segundo o órgão estadual, a Prefeitura ainda não enviou os documentos técnicos, ambientais e fundiários para poder dar sequência à análise do terreno indicado para construção dos imóveis.
O Paço solicitou efeito suspensivo da decisão da juíza sobre o auxílio-aluguel, porém o pedido foi negado. Além disso, o Executivo entrou com recurso e o caso deverá ser levado para julgamento em segunda instância no TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo). No documento de apelação, a administração são-caetanense alega que o auxílio-aluguel só poderia ser pago mediante autorização legislativa, sem garantia de que o suposto projeto de lei seria aprovado pela Câmara, e que o benefício deveria estar previsto no orçamento de 2024 do município.
“Não se pode considerar que um indivíduo (ou entidade familiar) tenha uma vida saudável quando sequer tem um teto para se abrigar da chuva e do sol, uma mesa para cear, uma cama para descansar, um banheiro para se banhar, um local para receber seus familiares e amigos, entre tantas outras condições minimamente”, argumentou a juíza Ana Lucia Fusaro, da 2ª Vara Cível da Comarca de São Caetano na decisão.
As famílias desalojadas do antigo Edifício Di Thiene receberam o auxílio-aluguel por cerca de 21 meses (18 iniciais, sendo prorrogados para mais três). A primeira parcela foi de R$ 800, e as demais, de R$ 400 – valor pago entre 2019 e 2022. Além disso, alguns dos moradores ficaram abrigados, por mais de um ano, no CRE (Clube Recreativo Esportivo), no bairro Fundação.
A ex-moradora do edifício Ana Kelly Fragoso da Silva Santana, 36 anos, diz que após a desapropriação do terreno muitas famílias foram morar com parentes em outras cidades, pois não conseguiram arcar com o valor do aluguel em São Caetano.
“O auxílio-aluguel foi estipulado em 18 meses, porque era esse o prazo em que eles disseram que iriam fazer as habitações. Inclusive eles diziam que, se atrasasse a construção, iriam prorrogar, o que não aconteceu. Depois eles deram mais três meses, dizendo que era esse o tempo de resolver a questão do terreno para depois fazer o convênio com a CDHU”, afirma Ana.
No recurso apresentado no processo, a Prefeitura alega que continua prestando auxílio às famílias do Edifício Di Thiene, sendo que os auxílios concedidos, segundo o Paço, chegam a R$ 890 por mês. Esse valor compreende os benefícios de cesta básica (R$ 315,74), auxílio suplementar alimentação (R$ 150), vale-gás (R$ 125) e a tarifa zero do transporte, sendo duas passagens diárias (o que equivaleria a R$ 300 mensais).
“Alegar isso no processo é um absurdo, sendo que todos os moradores do município em situação de vulnerabilidade também recebem ou têm direito a esse auxílio. No meu entendimento, responder isso, que pagam benefícios para os munícipes, é agir de má-fé, porque a assistência social a que o processo se refere é a habitacional. Sem contar que várias famílias perderam esses mesmos auxílios porque precisaram deixar o município por não conseguir pagar o aluguel. Perdemos nossas casas, isso é desrespeitar nossos direitos”, finaliza Ana.
Suplício do Di Thiene já dura anos
Ocupado havia pelo menos três décadas, o edifício Di Thiene, que ficava em terreno privado localizado no bairro Fundação, foi demolido totalmente em novembro de 2019 – as 102 famílias que viviam no local foram despejadas em 2018. Antes de sua demolição, em junho do mesmo ano, o prédio havia sido interditado pela Defesa Civil após desabamento parcial da laje, que deixou oito pessoas feridas.
As famílias chegaram a ocupar prédios municipais após saírem do terreno, entre eles o Cras (Centro de Referência da Assistência Social) e o CRE (Clube Recreativo Esportivo) Fundação. Durante a pandemia da Covid-19, em maio de 2021, cerca de 80 famílias retornaram ao terreno onde ficava o Edifício Di Thiene, porém, esse grupo foi retirado pela PM (Polícia Militar) após determinação de reintegração de posse da Justiça.
Em agosto de 2021, a novela envolvendo as famílias desabrigadas ganhou outro capítulo. No dia 6 daquele mês, pelo menos 25 pessoas que estavam abrigadas no CRE foram impedidas de entrar no espaço pela GCM (Guarda Civil Municipal) e dormiram na rua em frente ao clube.
Na época, a Prefeitura de São Caetano alegou que a maioria dos moradores do Di Thiene, que estavam vivendo no CRE, teriam ido embora por conta própria e que não era mais possível manter o número reduzido de desabrigados dentro do imóvel.
No início, cerca de 60 famílias estavam vivendo no clube e aguardavam a construção de novas habitações pelo CDHU – que ainda não ocorreu.
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