As ditaduras na América Latina ocupam o centro das discussões no próximo encontro dos Seminários Avançados Sobre a Literatura Moderna Latino-Americana, marcado para sábado, às 15h, na Casa da Palavra, em Santo André. A forma como reagiram a literatura de Brasil, Argentina e Chile são o recorte sobre o qual trabalhará o coordenador da série, Ricardo Lísias.

Em pauta, portanto, estará o 11 de setembro. Não aquele que os estadunidenses lembraram com grande apoio da mídia internacional e ocidental este mês, pelos cinco anos dos atentados às torres gêmeas. A data será lembrada pelo dia em que o general Augusto Pinochet, à frente do Exército, cercou e bombardeou o palácio de La Moneda, em Santiago do Chile, disposto a derrubar o governo democrático e socialista de Salvador Allende, que suicidou-se naquele mesmo dia de 1973.

Toda essa discussão passará pelo filtro de Noturno do Chile, romance de Roberto Bolaño que coloca o ditador golpista como um dos personagens da trama, situada num período que antecede e precede a tomada do poder à força pelos militares.

O personagem central é o padre Sebastián Urrutia Lacroix, que num monólogo febril reconstrói na memória o Chile pré e pós golpe. Integrante da Opus Dei, o padre entra ainda jovem para a elite da literatura chilena, graças a seu talento e a uma mãozinha do crítico literário e proprietário rural Farewell.

A convite de dois empresários, Odeim e Oidó (Medo e Ódio em espanhol, escritos de trás para frente), Lacroix viaja à Europa com a missão de visitar igrejas cujo trabalho de conservação se tornaram referência e estudar as técnicas aplicadas.

Quando retorna ao Chile, Lacroix encontra um país em convulsão, com uma burguesia assustada com as idéias socialistas de Allende, pressionado por causa da queda brusca do preço do cobre – principal item de exportação chileno.

Em suas memórias à beira da morte, Lacroix comenta uma festa realizada pela milionária e candidata a escritora Maria Canales, casada com o estadunidense Jimmy Thompson, numa mansão bem distante do centro de Santiago.

A certa altura da festa, um escritor de vanguarda à procura de um banheiro entra por acaso no sotão da mansão, onde encontra um homem amarrado em uma cama metálica, coberto de feridas, com os olhos vendados e a respiração sôfrega. Mais tarde. aqueles convivas descobririam que Thompson era agente da Dina, a temível polícia política de Pinochet. E que a linda mansão era usada como centro de interrogatórios e tortura.

Um retrato do próprio Chile que, a despeito de seu propalado crescimento econômico, tem uma ferida aberta marcada pelo saldo de 15 mil pessoas assassinadas nos 17 anos de ditadura Pinochet, mais de 30 mil presos e torturados e centenas de desaparecidos políticos.

Sobre o Brasil, segundo Lísias, o legado literário deste período é um tanto confuso. O que não é de se estranhar, por conta da censura vigente na ditadura. Mas o tema está mais vivo que nunca e são inúmeros os exemplos em que a arte, nas mais diferentes linguagens. Ainda evoca a imagem de um passado recente marcado por sangue, dor e tragédias.

Os Seminários Avançados Sobre a Literatura Moderna Latino-Americana são uma iniciativa conjunta da Secretaria de Cultura, Esportes e Lazer de Santo André, da Escola Livre de Literatura e da Casa da Palavra, com apoio do Diário. Os textos de orientação dos seminários, publicados no jornal impresso, permanecem disponíveis para consulta no site do Diário.

Seminários Avançados Sobre a Literatura Moderna Latino-Americana - Série de seminários. Sábado, das 15h às 18h. Na Casa da Palavra - Praça do Carmo, 171. Tel.: 4992-7218. Entrada franca. Até 18 de novembro.