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‘Governo Lula foi um desastre’, diz Hélio Bicudo
Do Diário do Grande ABC
25/11/2006 | 22:08
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“Acho que os episódios que se acumularam no ano passado e que, provavelmente, irão prosseguir nesse novo mandato de Lula mostram exatamente o que aconteceu com o PT, que abandonou ética, moral e probidade para ser farinha do mesmo saco.” Assim, de forma ácida, o ex-deputado federal e ex-vice-prefeito da Capital, Hélio Bicudo, avalia as transformações sofridas pelo partido desde 1980, quando foi criado.

Para ele, o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi um desastre, principalmente sob o prisma ideológico do partido.

Atualmente, Bicudo – que é promotor, jurista e jornalista – faz parte da Fundação Interamericana de Defesa dos Direitos Humanos, assim como outros ex-presidentes e ex-altos funcionários da Comissão Interamericana dos Direitos Humanos, onde avalia denúncias, como a que envolve a falta de repasse da Funai a tribos indígenas do Pará.

DIÁRIO – Em que circunstâncias aconteceu sua filiação no PT?

BICUDO – Na verdade, não fui um dos fundadores. O PT foi fundado mais ou menos em fevereiro de 1980 e eu entrei em abril ou maio. Entrei porque antes das greves do ABC, um grupo de pessoas de São Paulo, do qual participavam Fernando Henrique Cardoso, José Serra, Chico de Oliveira e Plínio de Arruda Sampaio, tinha a idéia de formar um partido socialista. Tanto que lançamos FHC ao Senado em uma sublegenda do MDB para ver qual cacife tínhamos para montar partidos. Mas as coisas nem sempre acontecem como planejamos. A partir da greve do ABC surgiu a idéia do PT. Muitos de nossos companheiros queriam um partido socialista e a idéia de sindicalistas não cabia em uma mesma legenda. FHC e Serra permaneceram no MDB, outros foram para o PT e, no fim, estávamos eu e o Chico de Oliveira numa sala discutindo. Decidimos esperar. Aí aconteceu o PT e vimos que era o local adequado para as idéias que queríamos que fossem levadas adiante. Por isso, não fui fundador do partido. Até certo ponto posso dizer que vi a sigla nascer, porque me incorporei ao partido logo após a sua formação.

DIÁRIO – O sr. representa três áreas importantes: o Ministério Público, a Imprensa e a política. Como vê a atuação desses setores no Brasil?

BICUDO – O MP tem uma longa história e, na verdade, ele recebeu na Constituição Federal de 1988 sua estrutura atual, que abre espaços grandes para atuação em todos os setores da vida pública. Foi muito importante para a concretização – que ainda está a caminho – da democracia no Brasil. O MP é uma instituição autônoma, atual, com absoluta liberdade, e pode intervir de maneira clara no setor público.

Seja no que diz respeito às leis penais, ao patrimônio público, meio ambiente, à familia, à criança e ao adolescente. Tem panorama e zona de atuação grande. Acho a atuação boa e importante. Evidentemente que pode encontrar excessos de uma ou outra pessoa. A instituição tem agido com bastante relevância. A Constituição diz que a atuação do MP deve ter em vista o sistema democrático. Já a imprensa tem dado contribuição importante quando investiga, quando se torna investigadora dos gastos praticados pelos homens públicos, que até pouco tempo passavam incólumes perante à Justiça e que, hoje, pelo menos já são apontados. Acontece que o procedimento penal no Brasil é muito evasivo e demorado. Por isso, muitas vezes essa sensação de impunidade ocorre, porque os processos se delongam no tempo. Então, o povo não acredita muito na Justiça, porque o Poder Judiciário é realmente lento, o que não acontece no MP. Infelizmente, o Judicário no Brasil se burocratizou, os juízes dão apenas expediente e não procuram se aprofundar.

DIÁRIO – E os partidos políticos?

BICUDO – O partido político é um instrumento importante no jogo democrático. Mas na organização de hoje, pequenos grupos dominam partidos e impedem o crescimento da militância no vertical, ou seja, se alguém quer ocupar um cargo mais importante, a direção abafa. Tem alguns privilegiados que comandam legenda e não mudam. Em qualquer sigla, as cúpulas são as mesmas desde o início. Não é que queira criticar, mas Roberto Freire (PPS) e Lula (PT) comandam os respectivos partidos há anos. Isso precisa ser mudado. Quando se fala da reforma política, que é a maneira engraçada de os presidentes partidários escaparem de outras soluções, ela deve ser muito mais partidária do que política.

DIÁRIO – Qual a diferença entre o PT de 1980 e o de agora?

BICUDO – Há muita diferença. Antes era partido de esquerda, que objetivava um sistema socialista e democrático para o país e que, em determinado momento, em vez de lutar por esses ideais, passou a lutar pelo poder. E a qualquer preço. Acho que episódios que se acumularam no ano passado e, provavelmente, irão prosseguir nesse novo mandato do Lula mostram exatamente o que aconteceu com o PT, que abandonou ética, moral e probidade para se tornar farinha do mesmo saco.

DIÁRIO – O que o sr. acha do governo Lula?

BICUDO – Acho que foi um desastre, do ponto de vista da ideologia do PT. Você pode dizer que hoje pessoas comem mais, porque é muito discutível o Bolsa-Família. A própria CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil) já fez críticas contundentes a respeito do programa. Porque a maneira pelo qual ele existe, eu o equiparo à atuação dos coronéis do século passado, que davam sapatos para as pessoas votarem. O problema é mais à frente. Não adianta só alimentar, tem de tratar da Saúde e da Educação do país, que é o que vai propiciar o desenvolvimento.

DIÁRIO – O que seria essencial para o país crescer?

BICUDO – Acho que o problema do Brasil é Educação e Saúde. Precisa criar um sistema abrangente. Cristovam (Buarque, PDT, presidenciável) falou bastante sobre isso durante as eleições.

DIÁRIO – De que maneira vê a atuação dos tribunais internacionais, como no caso da sentença dada ao ex-ditador iraquiano Saddam Hussein, condenado à morte?

BICUDO – Os tribunais internacionais estão pecando desde 1943, por serem tribunais de vencedores contra vencidos. Não há distribuição de justiça. Hoje tem progresso, que é o TPI (Tribunal Penal Internacional), mas nem todos os países aderiram, entre eles os EUA, que podem cometer qualquer crime, mas não podem ser sancionados por esse tribunal. Esse no Iraque é comandado pelos americanos. A sentença não é correta, seria se tivesse sido dada no TPI, que é isento.

DIÁRIO – Em que o sr. trabalha atualmente na Fundação?

BICUDO – A Vale do Rio Doce está em área ocupada por várias etnias indígenas. E segundo a empresa expôs, contribui para o orçamento da Funai com parte substancial para atender necessidades dos indígenas, como alimentação, atendimento médico, educação e moradia. Mas acontece que isso não é feito. A Funai não faz o repasse, mesmo com a contribuição efetiva da Vale. Então, o índio pressiona o Poder Público bloqueando a ferrovia Belém-Carajás e invadindo área da mineradora. Isso mostra que o Estado comete dupla violação dos direitos humanos, primeiro ao não atender os índios e, depois, por meio da ação das tribos, que afetam pessoas que viajam pela ferrovia e impedem a mineradora de trabalhar.



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