Aos 68 anos, Araci Garcia convive com a dor e a saudade, à espera da liberdade do seu filho caçula
No domingo, dia 9 de maio, quando todos estarão comemorando o Dia das Mães – mantendo as medidas de distanciamento físico impostas pela pandemia de Covid-19 –, a dona de casa Araci Inácia Garcia Thomas, 68 anos, vai sentir ainda mais forte a saudade do filho mais novo, Felipe, 32. O rapaz está preso há quase dois anos, nessa que é a sua terceira passagem pelo sistema carcerário. Esperançosa, Araci, que mora em São Bernardo, acalenta o coração e espera que seja a última vez que o filho esteja privado da liberdade. “Vou deixar nas mãos de Deus e, independentemente do que aconteça, ele sempre vai ser meu filho.”
Felipe foi o filho temporão, o último de quatro irmãos, 17 anos mais novo que o primogênito, Cristiano, 48. Nasceu com apenas um mês de diferença do seu primeiro sobrinho, filho da irmã Juliana, 46. Jorge, 38, completa o quarteto. Aquela criança tranquila, “boazinha”, como explicou sua mãe; que adorava desenhar e fazia isso muito bem; que nunca deu trabalho na escola e sempre teve boas notas; que na adolescência chegou a fazer um curso técnico no Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) na área de cerâmica, foi preso pela primeira vez antes dos 19 anos.
Araci conta que o filho passou três anos na cadeia. Quando cumpriu a pena, após um mês e dois dias em liberdade, foi preso novamente. Dessa vez a sentença foi maior e ele ficou seis anos e cinco meses, mais uma vez, privado da liberdade. “Tentou formar família, acabou não dando certo. Não sei bem o que se passa na cabeça dele, sei que há dois anos foi preso de novo”, afirma a mãe. A pena, agora, é de quase seis anos. “Já tem 11 anos que a gente vive essa angústia”, completou. Em todas as vezes, o jovem foi detido por tráfico.
A dona de casa relata que sempre manteve as visitas ao filho. No ano passado, no entanto, com o avanço da pandemia de Covid-19, as visitas presenciais foram suspensas e ela está há um ano e dois meses sem encontrar pessoalmente o caçula. O marido “já desistiu”, e agora, apenas a mãe e a companheira de Felipe ainda mandam as coisas para ele e fazem as visitas virtuais. “Os irmãos sempre perguntam dele, mas a maioria das pessoas acha que eu deveria fazer como o pai dele, abrir mão”, explica. “Hoje me arrependo de não ter trabalhado, se tivesse uma profissão, poderia ter minha renda, ajudar mais. Mas dediquei minha vida a cuidar dos meus filhos”, lamentou.
Com quatro filhos, sete netos e quatro bisnetos (o quinto está a caminho), Araci lembra que quando era mais jovem, pensar sobre ter ou não filhos não fazia parte da realidade da maioria das mulheres. “Hoje se tem mais opções. Naquela época, era o que toda menina queria. Brincava de casinha, de boneca, já ensaiando para a vida adulta”, pontua. A conclusão dos estudos só veio depois que os filhos já estavam maiores. Completou o ensino médio e o sonho de uma faculdade foi adiado. Mas ainda vive em seu coração. “Penso em fazer educação artística ou nutrição.”
Para o filho que está preso, deseja que tudo o que ele passou nos anos em que esteve detido sirva de aprendizado. “Esses dias recebi uma carta dele, com um cartão, muito lindos. Já me mandou com medo de não chegar a tempo do Dia das Mães”, afirma. “Disse que está muito arrependido, que se teve que passar por isso para valorizar, agora está valorizando. Nunca ficamos tanto tempo sem nos ver”, conta Araci. “Disse que pensa seriamente em construir tudo que ele não teve. Uma vida que ele não teve. E eu falo ‘amém’, vou aceitar isso e vou ter fé. Vou colocar nas mãos de Deus que isso vai se concretizar. Mas tem que partir dele. A gente, enquanto mãe, apoia”, conclui.
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