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Falta objetividade ao Consórcio
Roney Domingos
Do Diário do Grande ABC
24/01/2005 | 14:42
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Estudo da FGV (Fundação Getúlio Vargas) encomendado pelo Consórcio Intermunicipal do Grande ABC mostra que a entidade, criada em 1990 para planejar as políticas públicas locais, vive, ironicamente, às voltas com a falta de objetividade na condução de projetos, má distribuição de tarefas e até mesmo dificuldade para programar compras triviais como clipes e papel. Os técnicos apresentaram lista com 13 principais falhas. Também sugeriram modificações na estrutura organizacional. A principal delas é a criação de Assembléia Geral no topo do organograma atual da entidade, acima portanto do Conselho de Prefeitos, que hoje é a instância máxima. Isso significa mais transparência e participação na entidade. Se a proposta for aceita, contemplará uma das principais reivindicações dos agentes públicos e privados que se relacionam com o Consórcio.

A Assembléia Geral teria obviamente a participação dos administradores, mas contaria também com representantes indicados pelas câmaras municipais e representantes da sociedade civil. A instância poderia sugerir programas e ações relevantes aos municípios consorciados. A argumentação do estudo é técnica, para a adequação do Consórcio (uma associação) ao novo Código de Direito Civil. O estudo até prevê que a Assembléia Geral será desnecessária depois de aprovada a lei que regulamenta os consórcios públicos, em tramitação na Câmara Federal. No entanto, do ponto de vista político representa uma novidade. Isso porque, baseados na argumentação de que a sociedade já tem assento na Câmara Regional, os prefeitos mantêm a tradição de tomar decisões a portas fechadas. Dentro do novo organograma, o clube de prefeitos manteria as as funções e prerrogativas, mas sob uma espécie de "controle externo" garantida pela Assembléia Geral. O Conselho de Prefeitos também perderia parte de seu poder de interferência sobre a gestão dos projetos. A responsabilidade seria transferida unicamente para a coordenação administrativo-financeira. A reformulação busca definir com clareza as atribuições para evitar conflitos de competência. "Observa-se que a maioria dos cargos não corresponde às funções na prática desempenhadas pelos funcionários."

As mudanças na estrutura organizacional do Consórcio – atualmente uma associação de direito privado – depende de uma variável externa: a aprovação, pela Câmara dos Deputados, do projeto de lei 3.884/04 que regulamenta o artigo 241 da Constituição Federal, regra que daria aos consórcios entre municípios maior autonomia administrativa e operacional, como a possibilidade de realizar concurso público para admitir servidores.

Na concepção atual, o Consórcio tem 12 cargos: presidente (um dos prefeitos eleitos com mandato de um ano à frente da entidade), dois assessores (Jurídico e Executivo) e coordenadora-geral. Abaixo da cúpula, estende-se uma linha horizontal ocupada por coordenadora de atividades, auxiliar administrativo, secretária sênior, assessor de imprensa, subcoordenadora de programas e projetos, motorista, mensageiro e servente.

A nova concepção sugere 13 cargos: abaixo do presidente, a secretaria executiva, a quem estariam subordinadas as assessorias juridica e de imprensa. A coordenação administrativo-financeira cuidaria dos recursos humanos, gestão de materiais, orçamento e contabilidade e jurídico. A coordenação de projetos cuidaria da análise de projetos, acompanhamento de avaliação de projetos e de informações gerenciais. O custo da máquina (folha mais contratados) não teria elevações significativas. Atualmente é de R$ 1.015.381,50 por ano e poderia subir para R$ 1.286.808,06. A nova estrutura considera redefinição dos salários, criação de novos cargos e extinção de contratos terceirizados em função da absorção de atividades pela nova estrutura.

  

Problemas internos – Uma das principais contradições encontradas pela auditoria está no fato de que o Consórcio tem apenas três técnicos para cuidar de projetos – o principal objetivo da entidade –, mas emprega mais de dez funcionários na área administrativa e de apoio. Os projetos regionais que deveriam receber o grosso da atenção são acompanhados por empresas terceirizadas. Em quatro meses de estudo e após entrevistas com integrantes da equipe do Consórcio Intermunicipal, os técnicos da FGV constataram, entre outros pontos, que 1) não existe interação entre as atividades administrativas e técnicas; 2) falta banco de dados com informações sobre a região e as informações guardadas apenas por quem trabalha com elas tendem a perder-se a cada troca de equipe; 3) há concentração e centralização de atividades nas mãos de uma só pessoa/cargo ; 4) falta agilidade e profissionalismo na execução das atividades; 5) não há procedimentos administrativos claros; 6) os computadores disponíveis são velhos e apenas um deles tem software licenciado; 7) não há sequer estoque mínimo de materiais (papel, grampo, cartuchos) e as compras são feitas em caráter de urgência; 8) os grupos desenvolvem projetos e buscam recursos para financiá-los de forma isolada; 9) não há um setor específico para captação de recursos.

  

Problemas externos – A análise da FGV ressalta que a despeito dos problemas internos, o Consórcio obteve grandes avanços na construção do diálogo "de baixo para cima", embora esses avanços não tenham sido acompanhados de resultados concretos. "O arranjo do ABC talvez proporcione um embrião de um novo processo mais flexível e articulado de governança regional, mas os avanços não foram acompanhados pela implementação de um conjunto de projetos e ações de curto prazo", diz uma parte do texto. "A flexibilidade da arquitetura institucional da regionalidade do Grande ABC tem se mostrado simultaneamente forte e frágil. Houve avanço no diálogo, mas isso não produziu resultados práticos." Em outro trecho, afirma que instituições como o Consórcio "conseguem proporcionar consensos sem institucionalidades, entre outros motivos, porque falta redefinir quem é quem no pacto federativo entre União, Estados e municípios." Para complementar o raciocínio, o texto destaca que "a legitimidade política do Consórcio precisa se reforçar e ser complementada pela legitimidade funcional em termos de capacidade de solucionar problemas metropolitanos."




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