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Estatuto da Criança chega aos dez anos e faz balanço
José Carlos Pegorim
Da Redaçao
08/07/2000 | 16:18
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  O ECA, como ficou conhecido o Estatuto da Criança e do Adolescente, completa dez anos de promulgaçao na próxima quinta-feira, dia 13. Considerada por juristas uma das legislaçoes mais avançadas do mundo sobre o tema, ela enfrenta o desgaste das seguidas cenas de revolta na Febem (Fundaçao Estadual do Bem-Estar do Menor). Mas falta informaçao positiva sobre o estatuto: resultados de onde ele foi efetivamente implementado, o que deu certo e os modelos a seguir.

Em meio à discussao sobre o rebaixamento da idade penal, definida como uma "proposta indecente" pela diretora do Departamento de Criança e Adolescente do Ministério da Justiça, a delegada de polícia Olga Câmara, 47 anos, o governo apresenta, na quinta-feira, o balanço do que se fez e do que nao se alcançou em dez anos. Elaborado em parceria com o Fórum de Defesa da Criança e do Adolescente, Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) e Unicef (Fundo das Naçoes Unidas para a Infância), um dos principais objetivos do balanço é apresentar experiências que tornam realidade as açoes previstas no ECA.

Falta muito para implementar o estatuto na prática, acredita Olga. Nas 5,5 mil cidades do país, apenas 2,3 mil têm conselhos tutelares - órgao civil que zela pelo cumprimento do ECA - funcionando. "Se tivéssemos pelo menos um conselho em cada município, poderíamos dizer que a violência está sendo monitorada", diz.

Faltam núcleos de infância e adolescência nas defensorias públicas, delegacias especializadas em crimes contra as crianças e os adolescentes, ou varas privativas nessa mesma área (separadas das varas que recebem crimes praticados por jovens), tal como as que existem em Pernambuco, Bahia, Paraná, Ceará, Paraíba, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Em Pernambuco e no Pará, a Polícia Militar tem setores especializados - e, na maior parte dos casos, o policial é o agente público responsável por levar os casos de infraçao envolvendo adolescentes à Justiça.

Em Salvador, funciona o Case (Centro de Atendimento Socioeducativo), entidade modelo, tanto pela arquitetura adaptada ao ECA quanto pela proposta pedagógica, onde sao internados os adolescentes infratores. "Mato Grosso do Sul e Roraima também têm instituiçoes modelares nessa área."

Internaçao, porém, é apenas a mais severa - e deveria ser a menos usual - dos cinco tipos de medidas socioeducativas (como o estatuto designa as puniçoes aos adolescentes infratores) previstos na legislaçao. Sao elas a advertência, a prestaçao de serviços comunitário, liberdade assistida e a semiliberdade. Em matéria de medidas em meio aberto - quando nao há o recurso à internaçao -, os exemplos podem estar em cidades tao diferentes quanto Recife e Santo Angelo (RS).

O exemplo local também é significativo: este mês, Sao Bernardo teve as políticas públicas destacadas entre as cinco melhores do país pela Fundaçao Abrinq pelos Direitos da Criança. No ano passado, a Abrinq destacou Santo André, cujo programa principal é o Andrezinho Cidadao.

Em 55% dos casos envolvendo adolescentes infratores que chegaram as suas maos, o juiz da Vara de Infância e Juventude de Sao Bernardo, Luiz Carlos Ditommaso, 42 anos, decidiu por medidas em meio aberto. Em 38%, preferiu internar - o que, em Sao Paulo, significa mandar para a Febem. A reincidência, no ano passado, foi de 7% no primeiro grupo: "Nas situaçoes limítrofes, entre internar e decidir por medidas em meio aberto, opto por essas porque tenho respaldo."

O respaldo, na cidade, chama-se Fundaçao Criança, que ficou com patrimônio e obrigaçoes da antiga Fubem (Fundaçao Municipal do Bem-Estar do Menor), mas nao seus métodos. Ao seu tempo, a única infeliz congênere da Febem no Estado mantinha celinhas, derrubadas simbolicamente há dois anos. "Mas o que mais me assustou quando eu cheguei nao foram as celinhas, foi encontrar um abrigo fechado", disse a assistente social Rosemary Pereira, atual presidente da fundaçao.

Ela chegou no início de 1998, e o abrigo para receber crianças e adolescentes vítimas de maus-tratos e abandono tinha inspetores que iam com elas a todo e qualquer lugar. "Era uma postura repressora, ainda tributária do antigo Código de Menores."

Os abrigos de Sao Bernardo - e na regiao, aliás - mudaram muito. De domingo até quinta-feira, o Diário publica uma série de reportagens enfocando vários aspectos da implementaçao do ECA no cotidiano das pessoas e das cidades. Com a palavra, estarao juízes, entidades públicas e ONGs, para mostrar parte do que ainda falta mudar.




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