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Amor e devoção à ciência vira documentário
Alessandro Soares
Do Diário do Grande ABC
10/06/2003 | 20:04
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Um grupo de cientistas brasileiros amou a ciência acima de todas as coisas e pensou em desenvolver um projeto de nação para o país. Sem perceber, fizeram também História, “a mais importante das ciências”, segundo César Lattes, pois sem ela não há “realidade objetiva”. Ele e José Leite Lopes são os físicos que encabeçaram as articulações políticas para a criação do CBPF (Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). São também personagens do documentário em DVD Cientistas Brasileiros: César Lattes & José Leite Lopes (R$ 41 em média) que será lançado nesta quarta-feira, às 16h, na USP (Universidade de São Paulo).

Um debate sucederá a exibição do filme no Auditório Abraão de Moraes, no Instituto de Física. Estarão à mesa o presidente da Fapesp, Carlos Vogt, a física Amélia Império Hamburguer, da USP, Marcelo Tassara (ECA-USP), Roberto Martins, do Instituto de Física da Unicamp e o diretor do documentário, José Mariani. O filme será exibido também no canal por assinatura STV – Rede SescSenac de Televisão (Canbras, Net, Sky e DirecTV) na próxima sexta-feira, às 21h. O DVD faz parte da série RioFilme Documenta, em parceria com a Versátil Home Video, e o primeiro de uma série sobre cientistas brasileiros.

Esse filão documental nunca foi devidamente explorado por cineastas brasileiros. Mariani encontrou um meio de evitar teorias e minúcias técnicas que só agradariam catedráticos, tirando o jaleco de laboratório para contar a história da ciência no Brasil a partir do perfil desses dois importantes cientistas. A obra mostra o esforço desta geração que estudou no exterior e que usou esses contatos para desenvolver a pesquisa científica brasileira.

Lattes, 78 anos, nascido no Paraná, foi da primeira geração formada na USP (criada em 1934) e ficou famoso em 1947, aos 22 anos, com a descoberta da subpartícula atômica méson pi, fundamental para pesquisas nucleares posteriores. Estudou no exterior e voltou ao Brasil com prestígio suficiente para impulsionar o fomento a pesquisas. O pernambucano Lopes, 83 anos, fez cursos com Albert Einstein e outros cientistas nos Estados Unidos depois de integrar a primeira turma da extinta UDF (Universidade do Distrito Federal, criada em 1935). Os dois físicos lideraram o grupo que fundou o CBPF em 1949 e atuaram na criação do CNPq em 1951. Hoje, Lattes vive em Campinas, onde pesquisa na Unicamp, e Lopes é professor emérito do CBPF no Rio.

A primeira bomba atômica explodiu em 1945 e a Física se tornou a ciência da vez. Muito antes, ela havia encantado uma geração de brasileiros. “Eu queria fazer Engenharia Química quando um professor em Pernambuco me apresentou à Física e me apaixonei”, diz Lopes. “Essa geração brilhante tinha em comum um projeto desenvolvimentista de nação com o incentivo à pesquisa”, diz Mariani.

O documentário é narrado por Arnaldo Antunes e faz reverência sem caráter laudatório a homens que abriram caminhos por iniciativa própria e sofreram com reveses políticos e econômicos. Lattes, que poderia ter permanecido no exterior, preferiu ficar no país pois não achava correto ter estudado com bolsa brasileira no exterior e não voltar e aplicar seus conhecimentos. Lopes reclama da ausência da iniciativa privada no fomento à ciência, que “não dá um centavo para pesquisa, ao contrário dos Estados Unidos”, e critica o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que “não ajudou as universidades”.

O suicídio de Getúlio Vargas em 1954 e o golpe militar de 1964, com o AI-5 que exilou muitos cientistas, Lopes entre eles, foram decisivos no atraso no desenvolvimento da ciência no Brasil. Crises econômicas sucessivas e a política norte-americana de não-proliferação nuclear foram outros fatores que afetaram a pesquisa no país. Lattes e Lopes intercalam depoimentos com imagens pesquisadas em arquivos das Universidades de Bristol e Berkeley, da Nasa, do National Archives, do Arquivo Nacional, da Cinemateca do Museu de Arte Moderna e das famílias dos dois cientistas.




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