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Planalto volta a sofrer pressao do Congresso
Do Diário do Grande ABC
30/10/1999 | 15:27
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O governo vai sofrer, nos próximos meses, uma forte pressao dos parlamentares que devem condicionar a aprovaçao da emenda que recria a contribuiçao dos servidores inativos à liberaçao de verbas orçamentárias e à indicaçao de afilhados políticos para cargos federais. Com isso, o Executivo volta a ficar refém da necessidade de obter maioria absoluta no Congresso. Até entao, a estratégia do Planalto era evitar que qualquer assunto a ser aprovado precisasse dos três quintos de votos na Câmara e no Senado.

O presidente Fernando Henrique Cardoso chegou a ser aconselhado por alguns aliados a nao tentar aprovar nenhuma emenda constitucional, já que mesmo com o apoio dos governadores o custo para o Executivo sairia muito alto. Mas a opiniao dos que defendiam o contrário venceu. "O governo nao ficará refém do Congresso por causa disso", diz o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Aloysio Nunes Ferreira. "Na verdade, somos reféns o tempo todo, porque o governo e o Congresso sao interdependentes", completa.

Mesmo assim, os líderes aliados já admitem a existência de pressao de deputados e bancadas regionais para a liberaçao de emendas ao Orçamento. "Com as metas fiscais, o Orçamento ficou muito contingenciado", explica o líder na Câmara, Arnaldo Madeira (PSDB-SP). "Pode ser que a emenda dos inativos influencie uma cobrança maior pela execuçao orçamentária."

Madeira tem razao. Pesquisa feita pelo gabinete do deputado Agnelo Queiroz (PC do B-DF) no Sistema Integrado de Administraçao Financeira do Ministério da Fazenda detectou que, até o início de outubro, apenas 45,46% das emendas parlamentares haviam sido executadas.

Ou seja, faltava mais da metade para ser liberada em apenas três meses do ano. "A liberaçao de emendas é sempre um trunfo para o governo porque serve como moeda de troca nas votaçoes importantes", denuncia Queiroz, apostando que isso deve acontecer no caso da aprovaçao do texto dos inativos. Em geral, nos Estados governados por oposicionistas, como Rio Grande do Sul, Acre e Rio de Janeiro, a execuçao é menor. Em Minas Gerais, foi liberado apenas 3,29% do total de emendas.

Mas, em alguns casos, sao os próprios aliados que sofrem com o aperto do Planalto. É o caso do Paraná que, até agora, teve a menor execuçao orçamentária, com irrisórios 3,21% do total. A revolta é tanta entre os 30 deputados paranaenses que a ordem é nao votar pelo texto dos inativos. "Se o governo nao liberar nossas emendas, será muito difícil votarmos esse texto" avisa o coordenador da bancada, deputado José Borba (PMDB-PR), lembrando que o Executivo deverá perder 25 votos aliados.

Queixa - Na versao dos deputados, o problema é que o Planalto acaba transformando em barganha política aquilo que deveria ser um direito dos parlamentares. É por meio de emenda parlamentar que um político consegue mostrar prestígio no eleitorado, levando para as cidades obras como a construçao de poços, até ginásios de futebol.

"Em alguns municípios, nossas emendas representam 100% dos investimentos existentes", observa o deputado Eunício Oliveira (PMDB-CE). "Portanto, nao é justo que o governo fique negociando com essas emendas", critica, lembrando que, em véspera de votaçao importante, os ministros montam gabinetes provisórios na Câmara para atender aos deputados. "Isso nao serve mais", reforça o vice-líder do PMDB, deputado Henrique Eduardo Alves (RN). "Se o governo nos respeitar, ficaremos mais confortáveis para cumprir nossos deveres."

Nao é só entre os aliados que o governo sofre pressoes condicionadas à aprovaçao do desconto dos inativos. O governador do Rio, Anthony Garotinho (PDT), agora tenta negociar para o Estado dois grandes empréstimos. O primeiro, com o BNDES, de R$ 180 milhoes, é para obras de mais uma estaçao do metrô em Copacabana. O outro, com a Caixa Econômica Federal, de R$ 10 milhoes, é destinado a um programa habitacional na regiao de Sepetiba. "Ao invés de ficar negociando a aprovaçao da emenda dos inativos, o Garotinho deveria pedir o apoio da bancada", sugere o deputado Eduardo Paes (PTB-RJ).

O próprio Paes conta que já foi vítima do desprezo do governo federal. Parlamentar de primeiro mandato, ele diz que precisou ameaçar o ministro de Orçamento e Gestao, Martus Tavares, caso nao recebesse a bancada fluminense. "Tive dificuldade para ser recebido pelo ministro e, por isso, ameacei transformar-me numa oposiçao intransigente", conta o petebista.

Cargos - Já em relaçao à obtençao de novos cargos no governo a equaçao é mais difícil. Apesar das cobranças, praticamente nao há novas vagas. Mesmo com a renovaçao de deputados, a maior parte dos cargos nao foi trocada, continuando com os afilhados de parlamentares derrotados nas últimas eleiçoes. Mais recentemente, o PMDB pressiona por uma troca de cadeiras que deve ganhar força com a necessidade do governo de ganhar apoio para votar a emenda dos inativos.

A maior investida é do próprio presidente do partido, senador Jader Barbalho (PA), que quer tirar da Companhia Docas do Pará o afilhado político do governador tucano Almir Gabriel. O Planalto já adiou três vezes a decisao dessa disputa. A Companhia Docas também é alvo de cobiça em vários Estados. No Ceará, o PMDB quer tirar a técnica Marfisa Aguiar, uma indicaçao de Ciro Gomes (PPS) e Tasso Jereissati (PSDB). Já no Espírito Santo, a operaçao foi bem-sucedida. O afilhado político do deputado Newton Baiano (PPB-ES) nao está mais no cargo.

Outro assédio dos peemedebistas contra os tucanos é pelo comando da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), órgao do Ministério da Ciência e Tecnologia que serve de instrumento para financiar o setor. Mas até agora o partido nao obteve sucesso. Enquanto isso, no Ministério da Integraçao Nacional, o peemedebista Fernando Bezerra está refazendo a indicaçao dos cargos com pedidos de aliados. Na última semana, ele colocou na sua assessoria especial o ex-deputado Gonzaga Motta (PMDB-CE).

O mesmo Bezerra fez na Sudene, quando trocou, em setembro, Aloísio Sotero, afilhado político do vice-presidente Marco Maciel, pelo técnico Marcos Formiga, indicado pelo governador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE). A bola da vez é o Departamento Nacional de Obras Contra a Seca, chefiado pelo pefelista Hildeberto Araújo. Agora, o PMDB tenta indicar um nome para tirar o afilhado político do senador Hugo Napoleao (PFL-PI). Mesmo assim, a avaliaçao é de que a dança das cadeiras deve ser restrita. "Afinal, nao há órfao em cargo público", diz o senador Lúcio Alcântara (PSDB-CE). "Os nomeados sempre encontram novas paternidades."




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