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Sto.André usou verba da saúde irregularmente em 99
Kléber Werneck
Do Diário do Grande ABC
15/03/2003 | 19:30
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Uma verba de R$ 2,035 milhões (cerca de US$ 4.070 milhões na época; hoje seriam aproximadamente US$ 6.105 milhões) proveniente em sua maior parte do SUS (Sistema Único de Saúde) foi usada irregularmente pela Secretaria de Saúde de Santo André em novembro de 1999, sob a alegação de empréstimo, e até hoje não foi devolvida. O dinheiro que deveria ser utilizado para cobrir a realização de exames ambulatoriais, internações hospitalares, pagamento de fornecedores e outros procedimentos médicos, como determina o Ministério da Saúde, foi aplicado no pagamento do 13º salário dos servidores, o que é de responsabilidade direta da administração.

O remanejamento irregular consta na ata da 27ª reunião do Conselho Municipal de Saúde, que aconteceu em 25 de novembro de 1999, no auditório da Faisa (Fundação de Assistência à Infância de Santo André), documento ao qual o Diário teve acesso. A proposta de empréstimo foi colocada em votação no Conselho, que a aprovou por 17 votos a sete, mesmo sabendo do impedimento legal. “Aprovamos porque ficamos sensibilizados com a situação dos funcionários e porque a Prefeitura se comprometeu a devolver o dinheiro, o que até hoje não aconteceu”, confirmou a conselheira Rose Carvalho, que à época era suplente e participou da reunião.

No documento, o então secretário de Saúde, Homero Nepomuceno Duarte (ocupou o cargo de 1997 a 2000), alegava aos conselheiros que a Prefeitura atravessava uma grave crise financeira, “inclusive sendo renegociados pagamentos a fornecedores”, e necessitava do dinheiro do FMS (Fundo Municipal de Saúde) para saldar os salários dos funcionários. O FMS é composto por verba repassada pelo SUS e uma parte ínfima das multas oriundas da Vigilância Sanitária.

Duarte, que atualmente faz parte do Conselho Curador da Fundação do ABC como representante da Prefeitura de Santo André, admitiu a manobra com a verba, considerando-a “legal” e afirmando ser uma “prática comum dentro das prefeituras”. Ele alegou que o município recebeu o dinheiro pelo serviço médico prestado pela própria Prefeitura e que, a partir do momento em que a quantia entra no caixa, pode ser aplicado em qualquer setor da Saúde.

“A lei municipal 7.603, que criou o FMS, prevê o pagamento de funcionários”, disse o ex-secretário, ressaltando que as contas de sua gestão foram aprovadas pela auditoria do Ministério da Saúde, pelo próprio Conselho Municipal e pelo TCE (Tribunal de Contas do Estado).

Consultado pelo Diário sobre o assunto – foi enviada a ata por fax –, o Ministério da Saúde forneceu, por meio de sua assessoria de imprensa, parecer contrário à alegação de Duarte. Segundo o órgão, os recursos repassados pelo governo federal são destinados a pagar o custeio de exames que já foram realizados e, portanto, têm destino certo. Os investimentos devem obedecer a programação pactual, que é definida entre União e município no momento do acordo com o SUS. O ministério informou que firma contrato apenas com prestadores de serviços públicos, que são hospitais, postos de saúde, clínicas e estabelecimentos do gênero, mas não paga salários de funcionários.

Sobre a devolução do dinheiro, Duarte afirmou que a verba retornou à Saúde em forma de serviços e obras realizadas pela Prefeitura, mas não especificou. “O dinheiro foi devolvido via pagamento de obras para a área da saúde, que foram feitas com dinheiro do Tesouro Municipal, e isso foi demonstrado contabilmente”, disse o ex-secretário. Ele ressaltou que não havia nenhuma cláusula no acordo que obrigava a Prefeitura a “devolver em espécie”.

A Prefeitura também entende não ter compromisso de devolver o dinheiro.

O coordenador de relações com a comunidade da Secretaria de Saúde, Antônio Padre, que à época do remanejamento era vereador, disse que a verba foi “liberada” para o pagamento dos funcionários. “Vendo a ata, fica claro que foi aprovado (o empréstimo) por 17 votos a 7, e em momento algum se fala em devolução para o FMS”, afirmou Padre.

Uma outra ata do Conselho, no entanto, desmente o coordenador e o ex-secretário. No relatório da 41ª reunião ordinária, ocorrida em 28 de março de 2001 – quando o atual secretário de Saúde, Michel Mindrisz, já estava no cargo e Padre no Conselho –, é cobrada a devolução do dinheiro por parte da Prefeitura. “Sra. Rose e sr. Alcides (conselheiros) questionam quando será devolvido o dinheiro emprestado pelo FMS à Prefeitura”, diz o documento. Michel, inclusive, participou da reunião.




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