Ao contribuir com 1,3% do PIB (Produto Interno Bruto), as escolas particulares da região, assim como a federação nacional que representa as instituições, reivindicam ao governo a criação de uma Câmara Setorial do Ensino Privado. O órgão serviria para que as escolas passassem a receber incentivos do governo, dentre eles fiscais, a exemplo de outros segmentos, como a agricultura, as indústrias e o sistema bancário. A idéia é que a câmara também fique responsável por avaliar o impacto pedagógico de decisões políticas, como a que vai instituir em 2007 o ensino fundamental de nove anos e a obrigatoriedade em inserir na grade curricular o ensino de língua espanhola. A melhoria do ensino, seja público ou privado, também está entre as propostas que as escolas querem incluir no órgão.
Em 2004, de acordo com dados da Federação Nacional das Escolas Particulares, as instituições privadas garantiram aos governos uma economia de R$ 20 bilhões, valor que possivelmente foi maior no ano passado. Isso porque prestam um serviço que, pela Constituição Federal, é dever do Estado. Como comparação, e até como argumento, citam a saúde privada, que no país contribui com 1% do PIB. No Estado de São Paulo, mais de 1 milhão de alunos estão inseridos nas escolas particulares nos ensinos fundamental e médio. No ensino oferecido pelo governo estadual, são cerca de 6 milhões.
“Vários segmentos recebem do governo uma série de incentivos, mas as escolas particulares sempre são deixadas de lado. Se tivéssemos benefícios, poderíamos oferecer em contrapartida mais bolsas de estudos e desconto nas mensalidades, por exemplo, além de dar nossa contribuição ao ensino público. Mas parece que os governos não acreditam que temos algo a oferecer. A impressão que tenho é que dar apoio às instituições particulares é atestar a incompetência do ensino público, o que não é verdade. Nossa intenção é contribuir, acrescentar e crescer. Há espaço para todo mundo”, afirma Oswana Fameli, presidente da Aesp-ABC (Associação das Escolas Particulares do Grande ABC).
Segundo ela, não é intenção das particulares concorrer com o ensino público, que tem como prerrogativa a universalização, mas sim oferecer cooperação técnica para a reformulação do ensino, bem como na orientação das políticas. “As decisões acerca do ensino são políticas, e não pedagógicas. Um exemplo é a obrigatoriedade, a partir deste ano, que todas as escolas tenham na grade curricular o ensino de língua espanhola. A maioria das particulares já oferecem aulas de espanhol, mas não há professor suficiente da disciplina no mercado de trabalho para suprir toda a demanda. Para impor a medida, não foram avaliadas as complicações pedagógicas.”
Para Oswana, que é diretora do Centro Educacional Paineira, em Santo André, também seria levado para discussão na câmara a flexibilização da grade curricular, o que daria mais autonomia às escolas. “A instituição que quer oferecer um diferencial fica amarrada ao conteúdo mínimo exigido pelo governo, aos parâmetros curriculares nacionais, que têm de ser cumpridos. O modelo não nos permite explorar mais as habilidades individuais dos alunos ou nos força a aumentar a carga horária para cumprir o plano da escola.” Questões trabalhistas, como a que estabelece a contratação de estagiários, também seriam discutidas pelo órgão.
Para Aparecida Petak, diretora do Colégio Barão de Mauá, em Mauá, a criação da Câmara Setorial do Ensino Privado possibilitaria estabelecer um código de ética para as escolas. “O conteúdo pedagógico é fiscalizado pela Diretoria Regional de Ensino, mas seria preciso criar mecanismos e regras para as escolas privadas enquanto empresas, como a concorrência desleal.” Quanto à contribuição que as escolas privadas poderiam dar ao ensino público, ela cita como exemplo uma política da Secretaria Estadual de Educação que não surtiu efeito. “No ano passado, o Estado solicitou para as escolas que oferecem ensino técnico o envio de propostas para reformular a estrutura dessa modalidade. Deram uma semana às escolas. Quem pôde enviar uma proposta a tempo ficou sem qualquer retorno. A intenção era boa, mas a discussão não avançou.”
Regionalização – A reivindicação para que seja criada a Câmara Setorial é antiga. Oswana Fameli afirma ter solicitado diversas vezes o avanço dessa discussão. O mesmo informa a Federação Nacional das Escolas Particulares. A educadora diz ter feito vários contatos com o MEC, Estado, Consórcio Intermunicipal do Grande ABC e prefeituras, sempre obtendo a negativa como resposta. “A região poderia tomar essa iniciativa para si. Podemos propor uma política, que depois pode ser ampliada para outras esferas. Temos condições de sair na frente, mas falta apoio.”
A secretária de Educação de Santo André, Cleusa Repulho, que coordena o grupo que trata do assunto no Consórcio, está em férias e, segundo sua assessoria, não havia outra pessoa que pudesse discutir a questão. A reportagem também procurou a Secretaria Estadual de Educação, o MEC e a Secretaria Nacional de Educação Básica, mas os órgãos informaram que não comentariam o assunto.Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.