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Venda de porta em porta cai em outubro
Gabriela Manzini e Maria Eugênia Cruz*
02/11/2009 | 07:50
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"De todos os anos, esse é o período de maior dificuldade que eu já enfrentei." A declaração de Rita de Oliveira, 50 anos, expõe a angústia de alguns vendedores em domicílio, também conhecidos como vendedores de porta em porta. Esses comerciantes, diante de um público geralmente sem tempo para ir às compras, vão às casas e locais de trabalho de seus consumidores para vender os produtos.

Rita trabalha nessa atividade há seis anos. Vende bijuterias, roupas, bolsas, lingeries femininas, perfumes e hidratantes. Antes de trabalhar na área, não tinha experiência com vendas.

Mas neste ano, principalmente de agosto ao início de outubro, a vendedora enfrenta dificuldades para comercializar as mercadorias. "Em julho, estava tudo normal. Em agosto, as clientes não pagaram as compras de julho e não compraram. Em setembro, isso se repetiu."

Segundo Rita, as principais justificativas dos clientes são a volta às aulas e as férias adiadas até agosto. Às vezes perda de emprego também. A vendedora afirma que janeiro e fevereiro são meses em que costuma vender bastante. Mas no intervalo de agosto até a primeira quinzena de outubro, ela admite que nunca enfrentou um problema como esse.

A vendedora vê a crise econômica mundial como um dos fatores que contribuíram para que seus clientes diminuíssem o consumo. É o caso de Cleonice Anjos de Oliveira, 27 anos, que há sete anos costumava comprar principalmente roupas, bijuterias e lingerie de vendedores de porta em porta. Segundo Cleonice, essas compras consumiam cerca de R$ 150 de seu orçamento.

Atualmente, ela, que trabalhou em vendas e administração, está desempregada. Uma vez ou outra consegue alguma atividade na área de eventos. "Além de ter ficado desempregada há um mês, tive que alugar um novo apartamento. Então, as compras ficaram para outro momento", revela. "Estou poupando tudo. Até moedinhas. Compras agora só para o Natal", disse a consumidora.

A cliente de Rita, apesar dos problemas econômicos pessoais, acredita que 2009 está sendo atípico. "Essa época (de agosto até o começo de outubro) é sempre mais complicada. Mas este ano está um pouco mais." Apesar da melhora dos indicadores econômicos, ela avalia que o efeito psicológico da crise ainda inibe os consumidores.

Fidelidade - A vendedora Rossana Dória Castelli, 43, vive uma realidade um pouco diferente, apesar de concordar com as dificuldades atuais no comércio. "Tenho amigos que também vendem. O pessoal está gastando menos", disse. Para Rossana, o que a ajuda um pouco é a fidelidade de sua clientela ao produto que comercializa. Ela revende produtos da Natura, de pronta-entrega. "Eles (clientes) pedem muito prazo. Quem gosta sempre junta ou arranja um dinheirinho e não deixa de comprar."

Rossana é revendedora há 11 anos. No começo, trabalhava com catálogo. A cliente encomendava e o produto chegava depois. A vendedora mudou a estratégia. Também passou a adquirir e estocar os produtos para entregá-los no ato. "A tendência do panfleto, do livrinho, é acabar. Antigamente, para achar um xampu diferente ou um sabonete elaborado era só assim, de porta em porta. Mas hoje, as pessoas encontram esses produtos em supermercados, que estão engolindo os pequenos."

Em tempos bicudos, a estratégia continua a mesma. "O diferencial é o prazo para pagar, a embalagem elaborada, entrega em domicílio. Eu levo na casa da pessoa. Se não tiver um diferencial você quebra."

O economista Marcel Solimeo, da ACSP (Associação Comercial de São Paulo), concorda com a tática de Rossana. Ele avalia que, em tempos de crise, a concorrência da venda domiciliar aumenta. Isso pode ser um dos fatores que têm derrubado alguns vendedores de porta em porta. "Mais gente passa a complementar ou substituir a renda com a venda domiciliar", afirmou.

Outro fator apontado por Solimeo pela queda nas vendas é que, historicamente, setembro é um mês fraco, pois não há no comércio datas comemorativas que impulsionem o consumo. Além disso, "as pessoas, do ponto de vista financeiro, ainda estão em um período de expectativa, de reajustes salariais. A primeira parcela do 13º é só em novembro."

Em agosto e outubro, há datas em que o comércio pode aproveitar: Dia dos Pais e Dia da Criança. Mas nenhuma se compara ao Natal, que se soma ao período de férias e ao recebimento do 13º. Por isso, esse ritmo mais fraco acaba envolvendo setembro.

Nesse período, surgem as grandes liquidações em shoppings centers, que podem passar a impressão de que estão atingindo bons resultados. No entanto, Solimeo chama de "vendas forçadas", já que a redução dos preços das mercadorias é um atrativo para tentar aquecer o comércio.

Tecnicamente, chama-se sazonalidade os períodos ruins e bons de vendas do comércio. Solimeo explicou que outro motivo para as vendas nos últimos dois meses e meio estarem indo de mal a pior é essa comparação sazonal. "Como em 2007 e 2008 o varejo vinha em uma rotina crescente, então setembro acabou sendo bom. Mas, historicamente, é um mês mais fraco", explica.

Segundo o economista, como 2008 foi atípico, período em que o País apresentou um dos maiores índices de crescimento da economia, não teve mês fraco. "Quando você está em um momento de crescimento, até a sazonalidade acaba sendo anulada."

E a crise? - Solimeo afirmou que o setor de cosméticos é um dos que vêm resistindo ao momento, assim como os supermercados. Ainda de acordo com ele, o segmento de confecções, por outro lado, foi bastante afetado. "Está se recuperando aos poucos, mas essa recuperação deve ser sentida mais no fim do ano."

O economista faz previsões para os meses finais do ano. "Começamos a sentir os efeitos da crise em outubro de 2008, e já estamos melhores do que no fim do ano passado, Por isso, teremos bons resultados no mercado interno," avalia. "Não acho que vai ser tão exuberante quanto 2008, que foi fora do comum, mas será melhor (do que atualmente)", finaliza o economista.

*O conteúdo editorial desta página é de responsabilidade da Universidade Metodista de São Paulo, com supervisão editorial da jornalista Margarete Vieira Pedro.




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