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Riding With the King: encontro de criador e criatura
Joao Marcos Coelho
Especial para o Diário
17/06/2000 | 16:11
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Rolava uma quente noitada de blues em 1949, em Twist, no Estado do Arkansas, quando dois homens iniciaram uma briga feia por causa de uma mulher chamada Lucille. Um esbarrao no querosene que iluminava o ambiente provocou o incêndio. Todo mundo saiu correndo, inclusive o guitarrista Riley B. King, 24 anos. Já a salvo das chamas, King percebeu que esquecera seu instrumento de trabalho, e voltou perigosamente para resgatar sua guitarra. Naquele momento, batizou-a com o nome de Lucille. Ali também selava seu destino, mudando seu nome para Blues Boy King e, em seguida, B.B.King. Na virada dos anos 50, ele fazia um blues urbano e moderno, uma prefiguraçao do rhythm'n'blues que dominaria os vinte anos seguintes - primeiro como fonte oculta do melhor rock, depois alcançando o sucesso que merecia.

Riding With the King (WEA, R$ 20 em média), lançado mundialmente no último dia 13, registra um encontro muito aguardado no universo do blues: o do criador e da criatura. E nao decepciona. Confessadamente, o guitarrista inglês Eric Clapton, 55 anos, bebeu das fontes de B.B.King. Os Yardbirds; a parceria com John Mayal; o excepcional Cream (entre 1966 e 1968) - seu estilo era um caldeirao onde brilhava como elemento fundamental a guitarra de B.B.King. Em 1967, eles se encontraram no New York Café Au Go Go e deram uma canja inesquecível, que nao foi registrada sequer por um gravador pirata.

Mas agora é oficial: eles entraram em estúdio, confortavelmente, e gravaram uma dúzia de clássicos que têm tudo para ganhar o próximo Grammy e firmar-se como um dos melhores, senao o melhor, disco de blues do ano. É música de puro prazer e encantamento, instintiva, fluente e que nao deixa ninguém indiferente.

Para se entender a importância de B.B.King no fim dos anos 40 e a novidade que ele representava, é bom ouvir Days of Old, um clássico daqueles anos, com uma pegada forte e uma verdadeira usina de suingue funcionando por baixo da guitarra e do vozeirao de King. Aliás, Clapton está à esquerda do ouvinte, e King à direita.

Mas, clássico por clássico, a faixa mais incandescente é sem dúvida o maior blues de BB, Three O'Clock Blues, destilado em oito mágicos minutos que entremeiam magníficos solos do guru negro e de seu discípulo branco. Fora, é claro, um hit dos anos 30, Key to the Highway, assinado por ninguém menos do que Big Bill Broonzy. King ainda assina Ten Long Years e a tocante When My Heart Beats Like a Hammer. E, concessao à indústria do disco, que precisa faturar, uma música para tocar nas FMs, Come Rain or Come Shine, eternizada por Ray Charles e que aqui merece um registro apenas médio, com dispensáveis cordas, backing vocals etc.

Um destaque para os músicos que acompanham esta noitada do melhor blues em branco-e-preto: o baterista Steve Gadd, o tecladista Joe Sample, Tim Carmon pilotando muito bem o Hammond, que dá o som característico do R&B; e os competentes guitarristas Andy Fairweather Low e Doyle Bramhall II.




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