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Para muitos não foi golpe

Antes que algum hater efusivo se manifeste, é importante dizer que este não é...

Carlos Ferrari
05/04/2016 | 07:00
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Antes que algum hater efusivo se manifeste, é importante dizer que este não é um texto que pretende tratar dos atuais problemas políticos do Brasil. Sobre isto, tenho frequentemente me posicionado nas redes sociais, e creio que são muitos os conteúdos à disposição para contribuir com uma melhor compreensão e consequente formação de opinião a respeito do que tem se passado.

A proposta para nossa conversa é relembrar um dos momentos mais tristes e delicados da história recente do Brasil. Falo do golpe militar de 1964, momento em que o País sofreu grande abalo em meio a condições econômicas, culturais e legais que poderiam ser essenciais para que se consolidasse um sopro de democracia na recém-fundada capital federal.

O mundo dividido pela guerra fria era rico em oportunidades, dada as grandes revoluções na indústria, nos meios de comunicação, nas artes e, claro, nos comportamentos individuais e coletivos. Isso tudo pavimentava um caminho que se mostrava totalmente antagônico ao que de fato o País passaria a enfrentar a partir de 1º de abril daquele ano. Infelizmente, o que poderia ser apenas uma brincadeira de mau gosto de dia da mentira, transformou-se em pesadelo que duraria mais de 20 anos. Pessoas foram torturadas, muitas desapareceram e outras tantas se viram obrigadas a deixar o País por pensar e se posicionar de maneira distinta aos que estavam a frente do poder.

Tudo isso não é novidade e não faltam filmes, livros e tantos outros registros históricos que felizmente nos lembram diariamente desse período que sufocou artistas, estudantes e intelectuais oriundos das mais diferentes áreas de produção do conhecimento, botando assim freios não apenas em nosso amadurecimento democrático, mas também na Educação de qualidade de nosso povo como um todo.

Digo felizmente porque é importante lembrar em detalhes para lutar com ímpeto e convicção necessários para que jamais vivamos isso novamente. Muitos brasileiros que viveram naqueles anos sequer perceberam o que estava acontecendo. O discurso, que trazia consigo elementos relacionados a valorização da família, da moral e dos bons costumes, imprimia a sensação de ordem e progresso, fazendo assim do pátria amada local digno de cantos ufanistas como “Eu te amo meu Brasil, eu te amo.”

O falso patriotismo, vazio de certezas e paixões verdadeiramente relacionadas à construção de uma pátria mãe gentil livre e descomprometida de posturas conservadoras e preconceituosas infelizmente serviu por anos para assegurar sobrevida para uma estrutura de poder arcaica e descompromissada com seus seguimentos mais fragilizados e vulneráveis.

Um golpe infelizmente não se materializa apenas por meio de intervenções violentas e truculentas. A tomada do poder se dá em boa medida de maneira silenciosa, mas repleta de discursos, posturas e propostas que dialogam com o senso comum, trazendo apoio de parcela substantiva da população.

Essa lição vivenciada pelo Brasil deve servir, sobretudo, para fazer de nosso povo uma população mais atenta. Discutir política não é pecado nem tão pouco crime, logo, fugir disso significa abrir mão de pensar e propor o País.

Não reconhecer o golpe é também não reconhecer as dores daqueles que perderam seus familiares, é negar os crimes de tortura praticados em porões do Estado brasileiro, é sobretudo dar as costas às duas décadas de direitos e liberdades negligenciadas.

Precisamos falar sobre isso. É fundamental que contemos para nossos jovens o quanto esse País precisou sangrar para voltar a ser livre, chamando a atenção de cada um deles para a importância de seus posicionamentos políticos para um futuro democrático e republicano.

* Carlos Ferrari é presidente da Avape (Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência), faz parte da diretoria executiva da ONCB (Organização Nacional de Cegos do Brasil) e é atual integrante do CNS (Conselho Nacional de Saúde). 




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