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Museus falham em acessibilidade
Camila Galvez
Do Diário do Grande ABC
28/02/2011 | 07:39
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A finalidade de um museu é ser aberto a todos, mas não é o que acontece no Grande ABC. A falta de acessibilidade de prédios históricos tombados ou em processo de tombamento dificulta a entrada de pessoas com deficiência.

O especialista em Direito do Consumidor Jefferson Lambert, 36 anos, enfrenta o desafio. Ele tornou-se cadeirante há quatro anos e meio, depois de sofrer assalto em Santo André no qual levou seis tiros. "Nasci de novo, mas para uma realidade completamente diferente. Tive de me adaptar a outro mundo", afirmou.

Quando precisou entrar a trabalho no Museu de Santo André Dr. Octaviano Armando Gaiarsa, no Centro, Lambert encontrou pela frente oito degraus, vencidos com a ajuda de quem passava na rua e se dispôs a carregá-lo. A dificuldade, porém, começou antes: a vaga para deficientes físicos em frente ao museu não tem calçada adaptada. "Só consigo vencer a barreira por causa da guia rebaixada da garagem de uma faculdade", explicou.

O imóvel é tombado pelos órgãos municipal e estadual de preservação e faz parte de um conjunto de prédios construídos pelo governo do Estado de São Paulo no início do século passado para abrigar os grupos escolares. A Prefeitura alega que há regras rígidas para reformas.

Insuficiente

A situação se repete no Museu Municipal de São Caetano, no bairro Fundação. O casarão histórico que pertenceu à família de imigrantes italianos De Nardi é de 1896 e está em processo de tombamento pelo órgão de preservação do patrimônio na cidade.

Ali, uma rampa de acesso foi construída em 1988, ano em que o casarão se tornou museu. No entanto, a cadeira de rodas precisou ser empurrada, ou seja, sozinho ele não entraria. "O museu fica fechado e a campainha é muito alta. Além disso, os banheiros não são acessíveis", reclamou.

Na Câmara de Cultura de São Bernardo, tombada pelo município, o cadeirante encontraria o mesmo problema: não há rampas de acesso. A única forma de entrar é vencer os quatro degraus. Funcionários disseram que há projetos, mas que nunca saíram do papel.

Enquanto isso, Lambert filosofa. "Ouvi certa vez alguém dizer que um degrau para uma pessoa sem limitações é somente um degrau, mas para alguém que tem dificuldade de locomoção, é uma muralha". Palavras de quem enfrenta o problema diariamente

Projetos das prefeituras não têm prazo para sair do papel

Os locais visitados pela equipe do Diário têm projetos de acessibilidade. Entretanto, nenhuma prefeitura soube responder quando devem sair do papel e quanto vão custar.

Segundo a administração andreense, o prédio do Museu Dr. Octaviano Armando Gaiarsa prevê a instalação de uma rampa de acesso para cadeirantes, em estrutura metálica e piso de ladrilho hidráulico, compatível com as exigências dos órgãos que cuidam do patrimônio histórico.

Em São Caetano, a Secretaria da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida foi criada neste ano e deve avaliar a demanda que existe atualmente na cidade, como é o caso da acessibilidade do Museu Histórico Municipal. Projetos poderão ser criados, mas por enquanto não há nada em vista.

Já São Bernardo afirmou que a Câmara de Cultura é um bem tombado e, como tal, necessita de uma série de aprovações para qualquer intervenção. Reformá-la faz parte dos planos da Prefeitura, que anunciou ainda a instalação de uma rampa de madeira que se encaixará nos degraus da entrada e permitirá o acesso.

Adaptar patrimônio é possível, garantem especialistas

O fato de o museu ser um patrimônio tombado não é desculpa para ser inacessível. Pelo contrário: é possível conciliar preservação arquitetônica e acessibilidade, desde que haja planejamento e investimentos.

Para a professora de Engenharia Ambiental e Urbana da UFABC (Universidade Federal do ABC) Silvia Passarelli, tornar patrimônios históricos acessíveis para todos é dever do poder público. "O que falta é vontade política de investir na questão da acessibilidade, não só de prédios tombados, mas de todos os bens públicos, inclusive das calçadas", alfinetou.

Ela explicou que existe um conceito chamado desenho universal, que planeja uma cidade acessível para todos. Seria necessário realizar mudanças no tamanho das calçadas e das esquinas, que precisariam ser mais largas para permitir a passagem de cadeiras de rodas, além de colocar guias rebaixadas a cada esquina. "Todas essas obras são de alto custo, mas precisam ser feitas para que a Constituição seja cumprida, já que determina a todos o direito de ir e vir", destacou.

Opinião semelhante tem a presidente do Instituto do Patrimônio do Grande ABC, Ana Gedankien. Ela, que tem 81 anos, também tem dificuldades para entrar no Museu de Santo André. "Precisava ter rampa, e dá para fazer a obra sem afetar o patrimônio histórico. Para isso existe o setor de Engenharia, para pensar no acesso de todos", disse.




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