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Lula: apenas a 'nova ordem social' vai garantir a paz
Do Diário OnLine
21/09/2004 | 15:19
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu nesta terça-feira, na abertura da 59ª Assembléia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), que a fundação de uma "nova ordem social" mundial, sem miséria e mais igualitária, é a única garantia de paz duradoura. Em seu discurso diante dos principais líderes do planeta, em Nova York (EUA), o presidente ainda cobrou a expansão do Conselho de Segurança da ONU, com a inclusão de novos membros permanentes; o respeito à legitimidade do CS nas questões de segurança e mudanças em prol da 'socialização' dos órgãos internacionais de financiamento.

O discurso de Lula, proferido logo após a fala do secretário-geral da ONU, Kofi Annan, seguiu à risca as linhas principais da política externa do governo brasileiro. O empenho mundial pelo combate à fome, especialmente por parte das grandes potências, foi o grande mote da palestra, que durou cerca de 14 minutos. O presidente ressaltou que o mundo passa por mudanças e exige a fundação de uma "nova geografia econômica e social".

O chefe de Estado do Brasil abriu sua intervenção na ONU falando que tem "um compromisso de vida com os silenciados pela fome, pela desigualdade e pela desesperança". Lula destacou a importância da Assembléia Geral do ONU, congregando diversas nações, mas observou que "a transferência política não se confirmou nos campos econômico e social".

O presidente fez críticas à atuação das grandes potências no cenário mundial. Apontado como um líder das nações em desenvolvimento, Lula criticou o fato de "os antigos súditos se transformarem em devedores perpétuos do sistema financeiro internacional". Ele ainda frisou que a "globalização assimétrica e excludente aprofundou o legado devastador de miséria" entre os países pobres.

Lula reafirmou aos líderes mundiais que não será possível construir um cenário mundial de paz enquanto houver gente passando fome. "Da crueldade não nasce o amor. Da fome e da pobreza jamais nascerá a paz. O ódio e a insensatez no mundo nutrem-se dessa desesperança", discursou.

Ele lembrou que "somente este ano morreram mais de 1.700 pessoas em conseqüência de atentados terroristas", citando os ataques em Madri (Espanha), Jacarta (Indonésia), Bagdá (Iraque) e Beslan (Rússia). Em seguida, o presidente lançou um aviso às lideranças mundiais. "A humanidade está perdendo a luta pela paz. A situação exige dos povos e de seus líderes um novo centro de responsabilidade individual e coletiva. Se queremos a paz, devemos construí-la. Se queremos de fato eliminar a violência, é preciso remover suas causas profundas. O caminho da paz duradoura passa por uma nova ordem mundial, que garanta progresso social para todos os países."

Convocando seus pares a mais uma reflexão sobre os rumos do mundo, Lula afirmou que é preciso provocar as mudanças necessárias antes que todos sejam obrigados a olhar para trás e apenas constatar: "fizemos tão pouco quando tanto nos era permitido." O presidente brasileiro sublinhou que "a arquitetura política que permite a paz e a democracia" é o grande diferencial entre a civilização e a "barbárie".

FMI - Lula não perdeu a oportunidade de mandar estocadas aos Estados Unidos, representados na Assembléia Geral pelo próprio presidente George W. Bush. O chefe brasileiro fez uma defesa veemente em favor de mudanças na gestão das instituições multilaterais de fomento, em especial no FMI (Fundo Monetário Internacional). "Esses organismos foram criados para encontrar soluções, mas, às vezes, por sucessiva rigidez, tornam-se parte do problema", apontou Lula.

"O FMI deve credenciar-se para fornecer o aval e a liquidez necessários a investimentos produtivos, especialmente infra-estrutura, saneamento e habitação, que permitirão inclusive recuperar a capacidade de pagamento das nações mais pobres."

O presidente destacou que o Brasil vem buscando a parceria de outros países para criar mecanismos que proporcionem o desenvolvimento justo. Ele lembrou que a reunião realizada na segunda-feira, com mais de 60 líderes mundiais, deu ênfase à luta contra a miséria no cenário internacional. "Acredito firmemente que o processo desencadeado ontem elevará o patamar da luta contra a pobreza no mundo."

Em outra estocada contra a política externa norte-americana, especialmente em referência às práticas de combate ao terrorismo, Lula defendeu que "a comunidade internacional não pode aceitar que a violência de Estado se sobreponha ao diálogo democrático".

O presidente citou a falta de soluções para os conflitos no Oriente Médio e disse que o governo brasileiro não acredita "na interferência de assuntos internos de outros países". Ainda assim, segundo Lula, o Brasil não se "refugia na omissão e na indiferença diante de problemas que afetam nosso vizinhos". Para exemplificar, ele lembrou o papel do país no processo de reconstrução do Haiti, atendendo à convocação da própria ONU.

Lula voltou o discurso à América Latina e descreveu a seus pares que a região experimenta "uma cultura de paz, um período de amadurecimento democrático com uma vibrante sociedade civil" – apesar de seus "graves problemas sociais e econômicos". O presidente destacou as vitórias que os países latinos e outros membros do G-20 – grupo dos países em desenvolvimento - vêm conseguindo na OMC (Organização Mundial do Comércio) contra as barreiras protecionistas dos países ricos e afirmou que elas não devem se limitar a êxitos isolados.

"É fundamental continuar desenhando uma nova geografia econômica e comercial, preservando as vitais relações com os países desenvolvidos, criando sólidas fontes com os países do Sul, que por muito tempo permaneceram isolados uns dos outros."

Conselho de Segurança - Outro ponto explorado pelo presidente em seu discurso foi a abertura do Conselho de Segurança da ONU a novos membros permanentes – condição que é pleiteada por Brasil, Alemanha, Japão e Índia. Antes disso, porém, Lula defendeu o respeito ao órgão nas questões de conflitos.

"Nenhum organismo pode substituir as Nações Unidas na missão de assegurar ao mundo convergência em torno de objetivos comuns. Só o Conselho de Segurança pode conferir legitimidade às ações no campo da paz e da segurança internacional. Mas sua composição deve refletir a realidade de hoje e não perpetuar a situação posterior à Segunda Guerra Mundial", defendeu Lula. "As propostas de reformas que simplesmente vistam a atual estrutura com novas roupagens e não prevejam um incremento no número de membros permanentes são manifestamente insuficientes", completou.

Lula encerrou seu discurso com uma frase do profeta Izaías: "a paz só virá como fruto da Justiça."




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