Cultura & Lazer Titulo
HQs facilitam a vida de quem se interessa pela obra de Proust
Danilo Angrimani
Do Diário do Grande ABC
20/03/2004 | 17:53
Compartilhar notícia


Muita gente nunca ouviu falar de Marcel Proust (1871-1922); outros ficaram sabendo que ele era um romancista que escreveu um catatau chamado Em Busca do Tempo Perdido, obra dividida em sete volumes, todos tão densos e caudalosos que provocaram a desistência de muitos leitores antes mesmo do mergulho inicial.

Quem tem preguiça de ler, mas sente curiosidade em saber por que os críticos falam tão bem desse autor francês, ou para os já apaixonados pela obra de Proust, saibam que até o fim deste mês chega às livrarias o segundo exemplar de Em Busca do Tempo Perdido na versão HQ (história em quadrinhos).

No fim do ano passado, em novembro, a editora Jorge Zahar lançou o primeiro volume de Proust em quadrinhos – No Caminho de Swann: Combray (R$ 39). Agora, é a vez de À Sombra das Raparigas em Flor (parte 1), que estará disponível para venda a partir do próximo dia 31.

A adaptação da obra de Proust para o gênero HQ foi feita pelo ex-marinheiro e ex-diretor de arte em agências de publicidade Stéphane Heuet. Ele se inspirou em Georges Rémi, o Hergé, (1907-1983), o belga que criou o repórter-detetive Tintin, para elaborar desenhos delicados, detalhistas e que conseguem reproduzir com fidelidade o universo das memórias revoltas de Proust.

No primeiro volume de Em Busca do Tempo Perdido, No Caminho de Swann: Combray, o autor relembra passagens de sua vida na pequena cidade de Combray, onde passou a infância, entre flores, doces perfumados, o carinho de sua mãe e de uma família numerosa.

O segundo, À Sombra das Raparigas em Flor, situa o narrador em sua adolescência, em Balbec, uma ensolarada cidade à beira-mar. É lá que ele descobre o horizonte sem fim, os barcos a vela e as mulheres, ou melhor, as meninas que estão deixando a adolescência e se transformando em mulheres. É lá também que ele se separa de sua mãe: “Pela primeira vez, percebia que minha mãe podia viver sem mim, ter outros interesses, outra vida.”

Reminiscências – As memórias, em Proust, têm uma perspectiva de névoa, de algo não muito definido, que aos poucos começa a se firmar e ganhar contornos mais nítidos. O que dá início a esse processo da lembrança pode ser o nascer do dia, visto de um quarto às escuras; pode ser também o cheiro de um doce típico, como uma madeleine, partido ao meio, ainda quente, momentos antes de se tomar o café.

O autor da adaptação para a história em quadrinhos conseguiu transmitir essa suavidade da memória do passado longínquo que estava se dissipando, e que retorna e se incorpora novamente no presente do narrador.

As armas que Heuet usa para resgatar o discurso proustiano e passá-lo para a HQ são criativas. Ele recorreu a desenhos de traço muito limpo, que reconstituem fielmente a época, e foi feliz na escolha de trechos e episódios marcantes da obra.

Quem gosta de HQ vai se sentir em casa, e os proustianos de carteirinha terão uma alternativa sedutora para atrair seguidores mais jovens, quase sempre intimidados pelo tamanho do edifício construído por Proust.

Unanimidade – Os críticos consideram Proust o maior escritor da época romântica. Costumam dizer que o autor fechou o ciclo de grandes romances do século XIX e abriu caminho para o que viria no século XX.

Antes de alcançar a unanimidade inteligente da crítica, Proust viu seu trabalho ser recusado pela Nova Revista Francesa. André Gide avaliou para a editora o primeiro volume de Em Busca... e jogou fora. Argumentou que se tratava de “mais um manuscrito com histórias de duquesas”.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;