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Conclusões controversas deixam caso sem desfecho

Teses da Promotoria e polícia divergem sobre motivação do crime

Fábio Martins
Cynthia Tavares
20/01/2012 | 07:01
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Com conclusões conflitantes do Ministério Público e da Polícia Civil, dez anos após o assassinato do prefeito de Santo André Celso Daniel, o caso continua sem solução sobre a motivação da morte. A tese da Promotoria é que o petista foi vítima de crime encomendado, enquanto a polícia finalizou a investigação em meses enveredando por delito comum.

O prefeito foi encontrado morto numa estrada de terra em Juquitiba, na Grande São Paulo, alvejado por oito tiros, em 20 de janeiro de 2002, após dois dias de sequestro. O caso já foi reaberto duas vezes, investigado pelo Ministério Público, pela Polícia Civil, Polícia Federal e pela CPI dos Bingos. Para o MP, a morte de Celso está associada a esquema de corrupção montado na Prefeitura para financiar campanhas eleitorais do PT, inclusive a que levou Lula, em 2002, à Presidência. Sete pessoas ligadas ao episódio morreram.

Um dos promotores que acompanharam a apuração do crime, Roberto Wider Filho fez duras críticas à averiguação da polícia por "não se preocupar em confirmar interrogatórios", encerrando o caso em três meses com "várias falhas". Segundo ele, a polícia aceitou passivamente um adolescente como executor. "É praxe verificar circunstâncias de uma confissão. Distribuímos várias fotos, entre elas uma do Celso, e indagamos se algumas daquelas pessoas participaram da execução. Ele disse que nunca tinha visto aquela pessoa. E era a vítima."

Wider sustentou que após ser convidado para integrar a coordenação da campanha de Lula, Celso, desconfiado de desvios de recurso sem destinação exclusiva ao PT, tentou quebrar o esquema, por isso, foi vítima de crime encomendado pelo ex-assessor Sérgio Gomes da Silva, o Sombra. Eles estavam juntos quando o petista foi arrebatado, na saída de um restaurante da Capital.

Advogado de Sombra, Roberto Podval, afirma que a investigação do MP se deu de maneira "bastante criticável". "Pediram prisão do Sérgio (Sombra) com base em duas testemunhas: uma chamada de Maria Louca e outra de Zorro. Eles ficaram impregnados pelo próprio equívoco. Foram cinco apurações, sendo que o PSDB estava no comando do Estado e poderia ter interesse em atrelar o caso à conclusão da Promotoria, mas apenas o MP politizou." Para o advogado, a apuração passou dos limites da ética, pois Sombra "era o braço-direito e só se prejudicou com a morte". "Todo contexto político do Sérgio só existe com o Celso vivo. Teria papel importante em Brasília com a ascensão do prefeito."

O julgamento de Sombra, em júri popular, está previsto para este ano.

Promotor especial indicado para atuar no júri de Marcos Bispo dos Santos, o Marquinhos, único condenado, Francisco Cembranelli disse que ficou convencido do crime de mando em face de todas as provas colhidas pelo Gaeco em processo de 40 volumes. "Minha conclusão do episódio é a mesma da denúncia apresentada pela Promotoria. Sustentei a versão no júri, respaldada em levantamentos concretos. Prova disso é que foi acolhida pelo Judiciário."

Irmão de Celso, Bruno Daniel alega que a investigação da polícia apresenta inúmeras lacunas. "Documentos com rasuras, ausência de documentos, de investigações importantes, de laudos e contradições evidentes." Outro fato que, para Bruno, deixa claro o crime político são as condições da morte. "Celso foi torturado, o que evidencia que não se tratou de crime comum. A polícia não levou isso em consideração. Os depoimentos do Sérgio são contraditórios com laudos técnicos e a polícia não investigou qual poderia ser a origem dessas contradições." 

Família espera que versão do MP seja acatada pelo júri 

A família de Celso Daniel espera que a tese defendida pelo Ministério Público seja acatada pela Justiça. A promotoria acredita que o assassinato do petista teve motivação política.

O único júri realizado até aqui acatou a investigação da promotoria e condenou Marcos Roberto Bispo dos Santos, o Marquinhos, a 18 anos de prisão. Bruno Daniel, irmão do prefeito, deseja que os outros réus tenham o mesmo destino. "Nossa expectativa é a de que os demais indiciados sejam também encaminhados a júri popular e novamente prevaleçam as teses do MP. Se isso ocorrer, novos fatos podem vir à tona, quem sabe dando origem inclusive a outras investigações, novos indiciamentos e condenações, até aqui inesperados para muitos. Mas tudo isso tem sido lento demais", afirma.

Uma década depois da morte do seu irmão, Bruno ainda acredita na eficiência da Justiça. "Chegamos até aqui, com indiciamentos, uma condenação e a expectativa de novos júris populares a partir de um árduo e meticuloso trabalho. Portanto, minha crença não é vazia, é permeada pela ação", ressalta.

Ele, porém, não esconde sua desconfiança quanto ao andamento do caso. "Como se costuma dizer, justiça que tarda não é justiça. É necessário também se perguntar: por que tantos outros casos já chegaram a seu final e este tem demorado tanto?", questiona.

Apesar da demora pelo desfecho, o crime irá prescrever somente em 2023. O promotor Roberto Wider Filho explicou que em caso de homicídios, o tempo para arquivar os autos é maior. Responsável por grande parte da investigação, ele não esconde a frustração de ver o caso sem solução. 

RETORNO

Bruno estava exilado na França desde 2005 por conta de diversas ameaças que recebeu. Retornou ao Brasil no fim do ano passado e tenta reconstruir a vida ao lado de sua família. Ele define o momento do exílio como "penoso" e descarta projetos político-partidários. 

Morte de prefeito marca momento de medo dentro do PT 

O sequestro e o assassinato de Celso Daniel causaram instabilidade e medo no PT. Ele foi o segundo prefeito do partido morto em três meses.

Em setembro de 2001, o chefe do Executivo de Campinas, Antônio da Costa Santos, o Toninho do PT, foi morto com onze tiros.

Após a morte de Celso, caciques do partido como Luiz Inácio Lula da Silva, José Dirceu, Aloizio Mercadante e José Genoino passaram a andar com coletes à prova de balas.




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