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Brigada gaúcha faz espionagem para o Exército
Do Diário do Grande ABC
15/01/2000 | 14:28
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Toda a antiga estrutura do serviço secreto da Brigada Militar (PM2), que na ditadura era vinculada ao extinto Serviço Nacional de Informaçoes (SNI) e ao setor de informaçoes do Exército, foi reproduzida e ampliada no novo e poderoso Sistema de Inteligência da Brigada Militar (BM) e se mantém mesmo num governo considerado de esquerda, como o de Olívio Dutra (PT).

Integrantes da BM atuam como agentes na obtençao de informaçoes para o Exército. Em pelo menos duas ocasioes, o Exército ignorou o secretário de Segurança, José Bisol, mantendo contato direto com a Brigada Militar para seleçao de homens que integrariam a Força de Paz no Timor Leste e para um exercício militar no interior do estado.

Embora oficialmente seu objetivo seja o combate à criminalidade, o Sistema de Inteligência da BM adota, apoiado em sua Diretriz Central, procedimentos que fazem lembrar a época da ditadura.

O serviço utiliza criptografia, com uma seqüência hierarquizada de controle, e tem normas de recrutamento de pessoal destinadas a "impedir a açao adversa de infiltraçao" ou ingresso de pessoas que "mostrem incompatibilidade para o manuseio de conhecimento restrito". O Sistema de Inteligência da BM produz relatórios sem assinatura dos responsáveis.

O alerta para a autonomia com que o Sistema de Inteligência vem atuando é dado pelo presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul, Jair Krischke.

Os procedimentos sao baseados na Diretriz Geral de Inteligência baixada pelo coronel José Dilamar Vieira da Luz, comandante-geral da Brigada Militar no governo de Antônio Britto (PMDB), antecessor de Olívio Dutra.

Segundo Krischke, o coronel Dilamar atuou no SNI e era considerado o melhor quadro do setor de Inteligência da Brigada Militar. Sua diretriz continua em vigor "e orienta a açao da antiga PM2, atual Seçao de Inteligência, Operaçoes e Treinamento (SIOT)", confirmou o chefe do serviço, tenente-coronel Ubirajara Azevedo Dias. Ele disse que as açoes do SIOT se limitam à área de delinqüência, conforme a Constituiçao Federal.

"A SIOT se tornou o maior poder interno na BM, numa estrutura caríssima, sempre com prioridade na obtençao dos equipamentos mais sofisticados e modernos, em relaçao aos outros setores", contestou Krische. "Enquanto faltam viaturas para o policiamento, a SIOT tem 26 veículos só em Porto Alegre, incluindo uma Blazer, três Vectra, três Prêmio, uma Ipanema, 11 Corsa, quatro Fiat Uno, uma Parati, um Gol e uma Kombi".

O comando da Brigada Militar alegou que as "viaturas discretas" estao regularizadas e atuam na apuraçao de "desvios de conduta praticados por policiais militares e em apoio ao policiamento ostensivo".

Mas o secretário José Bisol, disse que foi para acabar com essa e outras situaçoes que resolveu unificar a atuaçao operacional da Brigada Militar e Polícia Civil, incluindo os setores de inteligência das duas corporaçoes. Segundo Bisol, a SIOT "nao ficará com todas aquelas viaturas, redistribuindo parte delas para o policiamento comum".

Krischke defende a "extinçao do sucedâneo da PM2, a SIOT", já que a funçao da BM é de policiamento preventivo e ostensivo e "nao de espionagem". Ele advertiu sobre os riscos para a cidadania e a democracia que pode representar essa estrutura sofisticada e poderosa, mesmo que oficialmente direcionada para coleta de informaçoes contra o crime. "Nao existe um controle sobre a PM2 ou SIOT", ressaltou.

A estrutura e atribuiçoes do Sistema de Inteligência da BM ocupam 32 das 73 páginas da Diretriz Geral de Inteligência. Tem 20 órgaos subordinados à Agência Central de Inteligência e se estende por Núcleos de Inteligência, distribuídos por quase todos os quartéis da corporaçao.

Krischke assinalou que um dos erros da Constituiçao de 1988 foi manter a ligaçao das PMs com a Inspetoria Geral das Polícias Militares, órgao do Ministério do Exército criado pela ditadura. Esse vínculo, acrescentou, faz com que, às vezes, os governos estaduais percam o controle sobre as atividades de seus policiais militares.

Dois episódios recentes, confirmados pela assessoria do secretário de Segurança, comprovam isso: o Exército consultou a BM sobre utilizaçao de uma de suas unidades para atuar no Timor Leste, nao concretizada pela falta de pessoal no policiamento.

Houve emprego de unidades da BM num exercício do Comando Militar do Sul na Regiao das Missoes. Nos dois casos, o secretário José Bisol só soube dos fatos após terem ocorrido.

Krischke disse ter tido acesso a um roteiro de vídeo feito há algum tempo pelo Comando Militar do Sul (CMS), apresentado depois no Ministério do Exército, sobre a açao na área de informaçoes. "Ficou claro que os PMs da SIOT sao os agentes de campo na obtençao de informaçoes para o Exército", denunciou.




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