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Gracindo, o vilão da telinha
Renata Petrocelli
Da TV Press
20/03/2004 | 18:08
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Acostumado a interpretar papéis cômicos no teatro, Gracindo Júnior não entende por que a grande maioria de seus personagens na TV é composta por vilões. O ator garante que, se pudesse, não aceitaria mais fazer o tipo. Por um lado, pela vontade de mostrar um trabalho diferente na TV. Mas, sobretudo, por acreditar que a energia negativa dos antagonistas respinga na vida do ator. “A maioria do público é muito ingênua. A gente brinca dizendo que as pessoas vão sentir raiva da gente. E sentem mesmo”, diz Gracindo, sem resistir a uma reivindicação bem-humorada. “Acho que os atores que fazem vilões deveriam ganhar mais”.

O suposto aumento salarial não valeria para Celebridade, novela das nove da Globo, na qual Gracindo interpreta o ressentido Ubaldo. O ator não classifica o ex-presidiário como um vilão, embora reconheça o peso que ele carrega nas costas. Por isso, adora a sensação de inadequação que o personagem experimenta desde que teve reconhecida a autoria da canção Musa do Verão. “Ele não sabe como se comportar”, avalia Gracindo, que não pretende, de uma hora para outra, tirar toda a carga de ódio e mágoa do personagem. “Ele continuará meio maníaco. Afinal, foram 15 anos de injustiça”.

Aos 60 anos de idade e 45 de carreira, Gracindo parece sério e fechado. Mas quando começa a falar de sua paixão pelo trabalho, abre um sorriso cativante. Atualmente, divide suas atenções entre a novela, a direção da peça Anjos de Cara Suja, em excursão pelo país, e dois grandes projetos. Um deles é um livro misturando a história da comunicação no país à trajetória de seu pai, o ator Paulo Gracindo. “Ele está sempre comigo”.

TV PRESS – O que fez você aceitar o convite para viver o Ubaldo, apesar da vontade de não interpretar personagens com grande carga negativa?

GRACINDO JÚNIOR – Em primeiro lugar, o fato de ser uma novela do Gilberto Braga, com quem nunca trabalhei, apesar de sermos amigos. Também por ser uma novela das nove, na Globo, o que é interessante para qualquer ator. Mas o mais importante é que se trata de um personagem sempre comentado por todos os outros personagens da trama. Desde o começo, mesmo antes de aparecer, ele ameaçava, de certa forma, a estrutura das outras famílias de personagens. Antes de eu entrar em cena, ele já era anunciado, tinha um entorno, uma mítica que dá a ele uma dimensão muito grande. E isso é importante porque em novela, na realidade, o espectador diário, constante, é raro. Você vê 15 minutos, toma um café, vai ao banheiro, atende a um telefonema, recebe uma visita. Então, o que importa é o todo da história. E o Ubaldo, pelo fato de ser sempre citado, de estar envolvido nas desconfianças das pessoas, é muito divulgado. Isso faz dele um personagem muito interessante.

TV PRESS – O mistério em torno dele, principalmente no início da trama, em algum momento dificultou sua composição?

GRACINDO – Ao contrário, isso até ajuda a trabalhar minha criatividade. De repente, recebo um texto e vejo que existe um certo humor que não havia na personalidade dele ao longo de toda a novela. Então tenho de pensar como eu faço o Ubaldo bem-humorado. O humor dele tem de ser sarcástico, sacana, mau, tem de machucar. Tenho de estar preparado para dar significado a qualquer texto que vier. E é isso que faz do ator um co-autor da novela. Não basta apenas o autor escrever, porque há 10 mil maneiras de se fazer uma cena, de se ler um texto.

TV PRESS – De que forma você tem trabalhado as mudanças no comportamento do Ubaldo, a partir do momento em que ele começa a atingir seus objetivos?

GRACINDO – Parto do princípio de que ele está completamente perdido. E é um dado novo para mim, ainda estou estudando como tirar um pouco aquele peso, porque também não me interessa mudar completamente a personalidade dele. Ele sofreu muito e não é o fato de ganhar este dinheiro que fará dele uma pessoa completamente doce. Agora ele está obcecado pela idéia de ter uma família, de ficar junto da Laura. Isso não é normal numa pessoa dura e inclemente como ele sempre foi. Acho que tem de ter uma coisa meio escondida por aí. Pelo menos eu, como ator, vou tentar provocar isso, mesmo sem saber. A gente sempre fantasia muito em torno dos personagens que nos dão.




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