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Feldman esbanja sensibilidade em novo livro
Mauro Fernando
Do Diário do Grande ABC
16/03/2002 | 16:51
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  O humor inteligente e o lirismo intrínsecos à obra de Cláudio Feldman estão de volta. O escritor e poeta nascido em Bauru em 1944 e morador de Santo André desde 1959 lança no dia 22, no Elos Clube, em São Bernardo, seu 38º livro.

O inspirado Papéis Achados na Bolsa de um Canguru reúne em 57 páginas histórias curtas, poemas e pensamentos soltos. O autor explica o título: “As coisas que se depositam em sua bolsa (a do canguru) – restos de alimentos, folhas de outono, água da chuva (...) e os próprios canguruzinhos – formam um aglomerado caos aleatório, onde tudo pode acontecer”.

De fato, Feldman aponta sua pena para várias direções, da indignação com aspectos sociais, como em A Fala do Mendigo e em Jornal, a metáforas poéticas da condição humana, como em Paletó e em Rinoceronte.

Pessoa(s), na página 46, investe ao mesmo tempo contra a simplificação do raciocínio e o maniqueísmo: “Não cabem duas cabeças/ Debaixo do mesmo chapéu?/ Em Fernando Pessoa/ Cabiam várias.”

O fastio profissional e a ambição do sonho mais simples, às vezes simplório, que, graças à rotina sufocante, crescem juntos a cada dia – o que se verifica com facilidade, de modo empírico, em um bom papo de bar – estão em Desejo. A constatar na página 33: “Era médica de transtornos da ereção, próteses de pênis, terapia sexual, ejaculação precoce e reversão da vasectomia, mas seu maior desejo sempre foi viajar para a Disneylândia.”

Setembro de ‘70: Dops faz um belo contraponto poético à política da eliminação pura e simples do pensamento adversário. À página 32: “Nenhum canto de pássaro atravessa estas paredes/ Sonoras torturas tecem/ A pequena hiroshima de cada dia/A primavera respira cabisbaixa”.

Com ironia, Zero remete a Tio Vânia, de Anton Tchecov, peça em que o autor joga luz sobre a questão do demérito que ocupa posto de destaque em detrimento do talento – é inegável que o ambiente televisivo esteja repleto de exemplos desse gênero. Está na página 40: “No dia em que entrou uma nulidade para a Academia Brasileira de Letras, disse o sarcástico Amadeus Pereira: – Para fazer 40 é preciso um 0”.

Em Batalhas (página 16), Feldman analisa a briga da pena com a espada: “A batalha de Waterloo demorou 6 horas, tempo que Flaubert levava, muitas vezes, para burilar uma frase.”

Como se percebe, o que dá liga a Papéis Achados na Bolsa de um Canguru é a sensibilidade com que Feldman trata de assuntos que afligem o ser humano de qualquer época e de qualquer lugar.




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