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Segredos de 'confessionário' na boca de um padre petista
Elaine Granconato
Do Diário do Grande ABC
08/11/2009 | 07:32
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Nascido em Tupã, padre Odair Angelo Agostin trocou a pacata cidade do interior paulista para se transformar em uma liderança política de Diadema. Há 21 anos está à frente da Paróquia Nossa Senhora dos Navegantes, no Eldorado, bairro mais populoso do município com cerca de 70 mil habitantes. Além do trabalho social, é conhecido por sua veia política. É um padre petista, mas não de carteirinha. "Sou militante há muitos anos", confessa.

Porém, reconhece que o PT está perdendo a base, principalmente com as alianças feitas para governar. "Não tem como não se contaminar", avalia. O padre teme que haja "debandada" dos filiados da sigla. E filosofa: "Jesus Cristo também era político". A seguir acompanhe trechos da entrevista concedida ao Diário, que mesclou política, religião e até mesmo futebol.

DIÁRIO - Qual o seu partido?
PADRE ODAIR ANGELO AGOSTIN - Não sou filiado, mas sempre militei pelo PT.

DIÁRIO - Por que essa opção?
PADRE ODAIR - No geral, ainda digo que o PT é o melhor. Não por seu comando, mas pela história e ideologia.

DIÁRIO - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não representa o PT?
PADRE ODAIR - Não. O PT é maior do que ele, apesar de seu carisma. Admiro o trabalho, a coragem e a força desse menino. Um homem não pode estar acima do partido. Se ele morre, acaba tudo. Não é assim.

DIÁRIO - Pela primeira vez nas eleições presidenciais, o PT não terá Lula como candidato. Qual sua avaliação?
PADRE ODAIR - O Lula é quem vai puxar os votos. Será o cabo eleitoral.

DIÁRIO - Qual ideologia do PT o senhor defende?
PADRE ODAIR - Hoje, infelizmente, o PT está longe de onde começou. Porém, o que me atrai ainda é a origem dele. Nasceu no meio do povo trabalhador, sofrido e necessitado. Foi uma conquista. A igreja tem de estar próxima dessas pessoas. Os outros são partidos vêm prontos, com a ideologia de manter-se o poder.

DIÁRIO - A igreja tem tendência de se inclinar para partidos de esquerda. Os padres, principalmente, são simpatizantes do PT. Isso é real?
PADRE ODAIR - Sim, mas está mudando.

DIÁRIO - Como?
PADRE ODAIR - De uns dez anos para cá, a igreja tem se fechado e está ficando um pouco mais de fora, pois decepcionou-se. Muitas lideranças que saíram da igreja para o PT, ao entrarem no poder se esqueceram da origem e deram as costas à igreja. Muitos que trabalharam nas bases usaram da igreja só para subir. Hoje, a formação dos padres segue linha mais espiritualista do que socialista. Na minha época, era teologia da libertação. Inclusive, fiz parte da última turma.

DIÁRIO - Defina teologia da libertação.
PADRE ODAIR - Era mais engajada no social. Hoje, está na linha espiritual, ou seja, o homem voltado mais para Deus, longe do social. A igreja carismática, como chamamos, a linha direita da igreja, com os padres Marcelo Rossi e Fábio de Melo. Esse pessoal quer status, mídia, ao invés de ir à periferia. Incluo a chegada do novo papa. Já nós fomos formados em linha diferente, que também refletiu no PT.

DIÁRIO - Explique melhor.
PADRE ODAIR - O PT cresceu e esqueceu das bases. Hoje é cúpula. A base só é lembrada em época de eleição, igual aos outros partidos. Isso entristece.

DIÁRIO - O senhor percebe essa diferença?
PADRE ODAIR - Não tenha dúvida. Isso não é bom. O que diferenciava o partido era a ética, mas hoje está manchada por causa do mensalão, do José Sarney, entre outros. Sem aliança, não se governa. Candidato puro sangue, não se elege. Porém, com as alianças vem a contaminação.

DIÁRIO - O que a perda das bases pode provocar?
PADRE ODAIR - Uma debandada do partido. Eu, por exemplo, não tenho mais a mesma vontade de trabalhar. Decepcionei-me com as pessoas. Quando chegam no topo, nos dão as costas.

DIÁRIO - Fala em nomes?
PADRE ODAIR - Sim. O que fizeram com o Marquinhos (Marco Antonio Ernandes) em Diadema é inaceitável. É da comunidade, ministro na igreja, fez um bom trabalho na Prefeitura. Na hora que conseguimos novamente eleger o prefeito pelo PT, ele foi descartado, encostado. Isso magoou muito. Ninguém conhecia o Marquinhos, mas o lancei na política. Ele conseguiu se eleger duas vezes vereador e foi três vezes presidente da Câmara, além de secretário. Fez um bom trabalho, mas não foi valorizado.

DIÁRIO - Que tipo de valorização, uma secretaria?
PADRE ODAIR - Isso seria o mínimo que poderiam fazer Mas lhe puxaram o tapete.

DIÁRIO - A mágoa também é dele? Isso mudou alguma coisa?
PADRE ODAIR - É de ambos. Perdemos um pouco da vontade de militar. Não é campanha contra, mas quando vemos certas pessoas no comando, sem capacidade...

DIÁRIO - Revele os nomes.
PADRE ODAIR - Prefiro não.

DIÁRIO - O Marquinhos desistiu de disputar a Assembleia Legislativa?
PADRE ODAIR - Não dá para remar contra a correnteza.

DIÁRIO - Ele foi cogitado para ser articulador político do Executivo com o Legislativo, no lugar do ex-vereador João Merenda (PPS). Qual sua opinião?.
PADRE ODAIR - Você vai apanhar dos dois lados, do prefeito e dos vereadores. Para que virar menino de recados? Enquanto isso, alguns ficam à sombra. Lutei para que Marquinhos fosse vice do Mário Reali (prefeito de Diadema), mas fomos voto vencido.

DIÁRIO - O senhor não foi contra Gilson Menezes, hoje no PSB, para vice-prefeito?
PADRE ODAIR - Não tenho nada contra ele. Achávamos que era preciso por sangue novo, com chapa pura PT. Gilson já mudou de partido. Acatamos e fizemos tudo na campanha: ir para rua e, até na igreja, falamos que seria jogo duro. Vencemos. O governo escolhe toda sua secretaria e depois fala para o Marquinhos: pode escolher o que quiser. Ele não escolheu nada. Essa é a mágoa.

DIÁRIO - Como é o trabalho político na igreja?
PADRE ODAIR - É preciso politizar as pessoas da comunidade. Trabalhamos fé e política. Jesus Cristo era político. Todos somos políticos. Cristo morreu fazendo política, defendendo os pobres e o social, como o próprio Evangelho.

DIÁRIO - Qual sua relação com Mário Reali?
PADRE ODAIR - De muita amizade . Gosto dele, admiro-o muito e lutei para as campanhas dele, tanto para deputado estadual quanto para prefeito. Não concordo com alguns nomes do secretariado. Já disse isso a ele. Enquanto essa pessoa estiver na função que está,não trabalho como antes.

DIÁRIO - Explique.
PADRE ODAIR - Sou indiferente. Está bom para você, administre. Eu vou administrar a igreja. A indiferença vem desde a exclusão do Marquinhos do grupo e a colocação dessa pessoa no governo, dentro de um cargo vital. A mágoa também é da igreja, que sempre militou para o PT.

DIÁRIO - Avalie os dez primeiros meses de governo.
PADRE ODAIR - Ele só fala de precatórios, que a Prefeitura está engessada, Cada dia um seqüestro de receita. Sei que há dívidas de outros governos e não queria estar na pele do Reali. Ao mesmo tempo, temos orçamento de R$ 640 milhões no ano. Se tiro R$ 40 milhões, essa quantia vai arrebentar o orçamento? Sem falar dos recursos do governo Federal. Juntos, são cerca de R$ 800 milhões Dá para fazer mas, se não faz, não estou aqui para julgar. Assisto.

DIÁRIO - Avalie o PSDB.
PADRE ODAIR - É um câncer da sociedade. Só pensa em privatizar e tirar proveito das coisas. É partido dos ricos. Não consigo ver Diadema administrada pelo PSDB. Contudo, se isso acontecer, me submeterei às ordens do prefeito. Posso não gostar desse papa que está aí, mas ele foi eleito e tenho de aceitá-lo.

Religioso é palmeirense da cabeça aos pés

Além de politizado e militante petista, padre Odair Angelo Agostin tem outra paixão declarada na comunidade: é palmeirense roxo.

"Quando o time perde, não dá nem para falar com o padre", revela funcionária que trabalha na Secretaria da Paróquia Nossa Senhora dos Navegantes, em Diadema.

Indagado desde quando é torcedor da equipe do Parque Antártica, o religioso não pensa duas vezes: "Desde o ventre materno", ao acrescentar que, seu nome foi colocado pelo pai, fã do atacante Odair Titica (década de 1950).

Coincidência ou não, no dia da entrevista à reportagem do Diário o padre estava com calça, camisa e chinelos em vários tons de verde. Aliás, tudo em sua antiga casa remete ao Palmeiras, inclusive o lençol e a fronha.

Fanático, padre Odair fez a seguinte analagogia envolvendo a pintura A Última Ceia, assinada pelo artista italiano Leonardo da Vinci. A reproduzida na igreja, traz Jesus Cristo com as vestes em branco e verde. Porém, Judas, o traidor, é o único com as cores preto e branco.




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