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Necessidades de cegos são ignoradas na região

Só oito semáforos são adaptados aos deficientes visuais; dia a dia deles é repleto de dificuldades

Flávia Fernandes
Especial para o Diário
03/06/2019 | 08:51
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Claudinei Plaza/DGABC


Juntas, as sete cidades somam 825 km² de extensão territorial e população de 8.299 cegos e 64.982 pessoas com grande dificuldade de enxergar, conforme o Censo de 2010 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). No entanto, as prefeituras disponibilizam apenas oito semáforos sonoros para auxiliar esses indivíduos nas atividades do dia a dia. Os equipamentos estão localizados em São Bernardo (um), São Caetano (um), Diadema (um), Mauá (um) e Ribeirão Pires (quatro).

Santo André já contou com três semáforos sonoros. No entanto, os equipamentos estão desativados e sem previsão de reinstalação.
Não bastasse a dificuldade para atravessar as vias públicas, deficientes visuais ainda precisam lidar com ausência de piso tátil (estrutura que possibilita a demarcação e o direcionamento para aqueles que não são capazes de enxergar o caminho) em todas as cidades.

Auxiliar da biblioteca municipal de Santo André, localizada no Centro da cidade, Márcia de Oliveira Freitas, 46 anos, precisa se deslocar diariamente da sua casa, na Vila Luzita, até o trabalho. Para isso, depende do transporte público – são dois ou três coletivos. A rotina não seria tão árdua se a munícipe, que é cega, tivesse à disposição um ambiente acessível.

A falta de semáforos sonoros faz com que Márcia fique paralisada nas travessias mais movimentadas que precisa passar todos os dias, como as ruas Bernardino de Campos e General Glicério,na região central de Santo André. “Em alguns semáforos, fico mais de cinco minutos esperando alguém vir me ajudar”, comenta.

Mesmo quando a ajuda chega, Márcia relata algumas dificuldades. “Tem quem pegue no pé da bengala e saia puxando. Outras pessoas simplesmente te ignoram. E ainda tem aquelas que, em vias seguidas, te ajudam a atravessar uma e depois te deixam para trás”. Em vias com fluxo menor de veículos, no bairro onde mora, ela conta que levanta a bengala ou tenta ouvir o som dos automóveis para conseguir atravessar.

Outro problema enfrentado por Márcia são as calçadas irregulares, quebradas e que não apresentam acessibilidade para o deficiente visual. “Pouquíssimos são os lugares com piso tátil e, quando há, são de má qualidade. Fora as pessoas que não são conscientizadas do uso e ficam paradas nele.”

A dificuldade para saber o nome das ruas também é destacada por Márcia no dia a dia. “Sei que é coisa de futuro, mas o ideal seria que cada esquina tivesse uma placa acessível para o deficiente visual com o nome das ruas. Facilitaria muito.”
Diante de tantos obstáculos, a auxiliar de biblioteca não consegue evitar as lesões. Ela revela ser comum ferimentos ao tropeçar em escapamentos de motos que ficam nas calçadas, portões abertos, placas de comércios, orelhões e lixeiras, por exemplo.

EXPERIÊNCIA
A equipe do Diário acompanhou Márcia em trajeto pela Vila Bastos, em Santo André, próximo ao local onde a auxiliar de biblioteca trabalha. Na Rua Doutor Messuti, árvore cheia de folhas no chão e galhos quase na altura do pedestre toma praticamente o espaço todo da estreita via. Para piorar, ao lado da árvore, o piso da calçada está quebrado e com desnível que pode acidentar até mesmo quem não tem dificuldades para enxergar.

Um pouco mais à frente, em contraste com o cenário anterior, há centro de fisioterapia com calçada de piso tátil. “É preciso conscientização da população com relação ao deficiente. Suas necessidades, características e dificuldades precisam ser conhecidas. Também precisamos nos sentir independentes”, alerta Márcia.

Prefeituras destacam projetos de expansão

Apenas duas das sete cidades da região apontaram projetos de expansão de políticas públicas destinadas a pessoas com deficiência.
A Prefeitura de Santo André informou que o DET (Departamento de Engenharia de Tráfego) estuda reinstalar equipamentos de semáforo sonoro na cidade e realiza contatos com empresas do ramo para verificar a tecnologia. A cidade afirmou que, em abril, passou a contar com a Secretaria da Pessoa com Deficiência, cujas atividades incluem o desenvolvimento de projetos que “contribuam para a adequada condução das políticas públicas visando a melhoria da qualidade de vida das pessoas com deficiência e de suas famílias”.

Diadema observou que trabalha para melhorar a acessibilidade dos moradores que são cegos, sem especificar as ações pretendidas.
Ribeirão Pires explicou que, além dos semáforos sonoros, conta com piso tátil e direcional na região central da cidade, onde há maior fluxo de pedestres, mas não destacou planos de ampliação.

São Bernardo, São Caetano, Mauá e Rio Grande da Serra não se pronunciaram sobre o tema até o fechamento desta edição.
O Consórcio Intermunicipal do Grande ABC informou que “tem como objetivo a garantia e priorização da cidadania das pessoas com deficiência no Grande ABC”, sem detalhar ações ou projetos ventilados.

CÃES-GUIAS
A Secretaria Especial de Direitos Humanos do Ministério da Justiça estima a existência de apenas 160 cães-guias no País. Isso devido aos altos custos com treinamento e a falta de profissionais capacitados. A estimativa é de que os custos do animal treinado seja de aproximadamente R$ 35 mil. O Instituto Iris, de São Paulo, organização sem fins lucrativos que realiza a doação dos animais conta, atualmente com 3.000 pessoas em fila de espera.




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