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Obras de Maria Leontina e Milton Dacosta estao expostas no Rio
Do Diário do Grande ABC
30/04/1999 | 14:40
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A exposiçao "Um Diálogo", em cartaz até o dia 23 no Centro Cultural do Banco do Brasil (CCBB) no Rio, nasceu do desejo de colocar lado a lado a obra de Maria Leontina (1917-1984) e Milton Dacosta (1915-1988), dois dos maiores pintores brasileiros deste século que este ano estariam completando 50 anos de casados. "Mas o fato de eles terem vivido juntos por quase 35 anos acabou tornando-se secundário, ganhando força o diálogo que existiu entre eles e aquele que os dois estabeleceram com a história da arte brasileira e internacional", explica o curador da mostra, Frederico Morais.

Dacosta e Leontina conheceram-se em 1947 e casaram-se em 1948. Nessa época ambos pintavam naturezas-mortas, tema recorrente no período, e já caminhavam em direçao ao abstracionismo que dominaria a arte brasileira na década seguinte, depois da abertura da 1.ª Bienal de Sao Paulo, em 1951. A carreira de Dacosta havia começado muito antes - ele foi um dos fundadores do grupo Bernardelli em 1931 - e havia sofrido um impacto profundo de Portinari nas décadas de 30 e 40 (a quem rejeita posteriormente com vigor). Ela descobriu a arte tardiamente, aos 27 anos, mas rapidamente o casal passou a caminhar no mesmo ritmo, participando dos mesmos eventos e ganhando prêmios similares.

Os estilos também divergiam. A pintura de Dacosta era influenciada pelo cubismo, com forte toque metafísico, como revelam quadros como "Composiçao", de 1942. Já a raiz de Maria Leontina era expressionista, mesmo que ela tenha sabido, segundo o curador, "conter os excessos emocionais". Portanto, a sintonia entre os dois nao deve ser entendida como uma influência de um sobre o outro. "O que é importante é que nenhum deles abriu mao de sua individualidade", explica Morais. Isso ocorreu até mesmo do ponto de vista físico, já que os pintores jamais compartilharam o mesmo ateliê.

A maior proximidade plástica entre eles se deu nos anos 50, a década do construtivismo. "Como muitos artistas daquele período, eles também sentiram a forte pressao em favor do abstracionismo geométrico", explica Morais. Como brincou Leontina: "Aqueles quadradinhos ficavam rondando a cabeça da gente naquela época". "Sem abrir mao de seu estilo, eles refletiram essa vontade de ordem e ampliaram o diálogo silencioso em suas obras", resume o curador. Mesmo assim, Leontina preserva um certo lirismo que lhe é característico, enquanto o marido mergulhou mais profundamente na frieza do construtivismo.

A mesma radicalidade marca a saída de Dacosta do abstracionismo. Na década de 60, o pintor retoma a figuraçao e dá início às Vênus que, segundo muitos críticos, marcaram um retrocesso definitivo em sua produçao. Já Maria Leontina, que nao teve em vida o mesmo reconhecimento que o marido, parece ter apurado sua pintura nos últimos anos de vida. "Ela se mostra mais propensa à renovaçao, trabalhando uma série de novos temas como a série das "Páginas", que acho o auge de sua obra", afirma o crítico.

Essa radicalidade, associada à grande sensibilidade de Leontina, tem encantado as novas geraçoes de artistas e conquistado o público carioca. Outra explicaçao para o maior sucesso relativo da obra da artista é que ela nao foi analisada com a mesma freqüência que a dele e ainda tem muito a crescer. Mesmo sem ter desejado abordar se o fato de Leontina ser mulher explica sua menor receptividade pela crítica da época, Frederico Morais comemora o fato de "um dos méritos da exposiçao ser o de revalorizar seu trabalho".

O crítico nao se surpreende que até o momento ninguém tivesse tido a idéia de confrontar a obra dos dois, evidenciando esse diálogo. "Acho que as pessoas ficam um pouco assustadas com a possível pieguice do tema", sugere. Mas no fundo, o que a exposiçao revela é o rico encontro entre dois grandes artistas brasileiros.




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