A estrela do PT de São Caetano ruiu. O racha entre os dois grandes expoentes da legenda na cidade, o vereador Horácio Neto e Hamilton Lacerda, presidente da macroregião do PT no ABC, deflagrado na quarta-feira, dividiu os militantes e deixou o partido enfraquecido. Mesmo que ambos permaneçam no PT após as apurações, um perderá força e ficará desmoralizado perante a militância. “Nesse processo, quem cresce é o Hamilton”, analisa o deputado federal Professor Luizinho (PT-Santo André), ex-líder do governo Lula em Brasília.

A afirmação é justificada por Luizinho pela atitude de Neto de ter ido à tribuna expor divergências internas do partido. “Ele tirou a atenção do foco político principal na cidade, que é a possibilidade de Hamilton Lacerda assumir o comando da Prefeitura caso o atual prefeito, José Auricchio Júnior (PTB), seja impugnado.” O deputado refere-se ao recurso acatado pelo TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de ação de impugnação de mandato eletivo contra Auricchio. Como Lacerda ficou em segundo lugar nas eleições de 2004, poderá assumir o Paço Municipal caso ocorra a impugnação do atual prefeito.

Para Luizinho, as ações de Neto vão de encontro aos interesses de Auricchio. “Mesmo que eles não tenham combinado, a atitude favoreceu o prefeito”, analisa. O deputado ainda avalia que Horácio Neto demonstrou medo e destempero, que configuram tentativa de armar o que chamou de “cama de gato” para Hamilton.

Já o deputado federal Ivan Valente (PT-São Caetano) saiu em defesa de Horácio Neto. “Para mim fica claro que um setor do partido tentou fazer armação para cima do vereador. Ele tem conduta impecável. É uma farsa que será desmascarada facilmente.” Questionado sobre o prejuízo ao partido em um momento que Lacerda pode assumir a Prefeitura, Valente saiu pela tangente: “Hamilton sempre fez campanha mais rica que a de Horácio. A questão não é essa”. Para ele, quem planejou a cilada não merece estar no PT.

Integrantes da executiva municipal do PT também estão divididos nesta briga. Na quarta-feira, durante sessão extraordinária da Câmara, Horácio Neto foi à tribuna acusar Hamilton Lacerda de tentar armar cilada contra ele. Já Lacerda afirma ter sido a vítima da armação. A questão gira em torno de um dossiê contra a mulher de Lacerda, Maria Isabel Fonseca. O documento, em forma da CD, teria sido vendido a R$ 600 pelo jornalista Samuel Silva de Oliveira, do jornal Voz do ABC, para Horácio Neto. O vereador diz que não comprou a gravação. Já Lacerda diz o contrário. No meio desse fogo cruzado, o partido tenta juntar os cacos.

Para a presidente do diretório municipal, Madalena Mendes, questionou a a titude de Hamilton Lacerda, mas não quis avaliar a possibilidade de expulsão. “Cada um tem sua história no PT. Vamos analisar os fatos.”

Expulsão –O vice-presidente do diretório de São Caetano, Ricardo Rios, diz que Horácio Neto teria direito de se defender dentro do partido, mas preferiu se reunir com bancada do prefeito. “A atitude dele de ir à tribuna é de quem passou o farol vermelho da ética partidária”. Rios cogita expulsão e diz que a “limpeza” tem de ser feita agora, antes de o PT assumir uma administração.

O colega de bancada de Neto, Edgar Nóbrega, avaliou o “dia seguinte” como devastador. Para Nóbrega, nada restou da relação com o vereador. Ele acrescenta que as apurações devem ser ágeis e que fará uma plenária no sábado, às 9h, com os filiados do partido. “O encontro terá tom de desagravo”, disse.

Pedidos – Em menos de dois dias, a Comissão de Ética do diretório municipal petista de São Caetano recebeu dois requerimentos. Um deles, de Francisco José de Souza Ribeiro, conhecido como Chicão do Sindicato dos Químicos, pede investigação dos fatos. Chicão (que deixou o sindicato em 2000) incluiu-se como testemunha, assim como Lacerda, Samuel e Neto. O segundo requerimento, apresentado pelo vereador, é para investigar tentativa de fraude supostamente perpetrada por Chicão, Lacerda e Samuel.

Roberto Barbosa, presidente da Comissão de Ética do diretório, não quis comentar os fatos e diz que tem de ser isento nesse momento. “Não posso emitir juízo de valor.” Barbosa acrescentou que a reunião para início das apurações será convocada para terça ou quarta-feira.

Nesta sexta-feira, às 10h, Hamilton Lacerda apresentará novo pedido à Comissão de Ética da executiva estadual. O documento será apresentado ao secretário-geral Luiz Turco. Segundo Lacerda, esse pedido é mais específico e questiona a forma como Neto fez acusações públicas a petistas sem ter provas. “Nosso estatuto é claro. Diz que nenhum petista pode acusar um companheiro de legenda sem ter elementos”, disse.

Enquanto isso, Horácio Neto afirma que irá protocolar no Fórum da cidade, segunda-feira, uma ação por injúria, calúnia e difamação. “Além disso, enviei ofício às direções nacional e estadual comunicando o acontecido e pedindo solidariedade pela agressão que sofri. Também enviei e-mail para os senadores Aloizio Mercadante e Eduardo Suplicy”, disse.

Pontos das versões apresentadas ainda obscuros:

1) Samuel Silva de Oliveira é filiado ao PT e proprietário do jornal Voz do ABC. Então, por que Horácio Neto dizia não o conhecer, já que por ser editor do impresso, sempre foi figura de presença na cidade?

2) Durante discurso na tribuna da Câmara, Horácio Neto expõe o que seria a conversa com Samuel: “Já te falei que eu não tenho nenhum interesse. Pode guardar a fita”. Se Samuel já havia conversado com Neto, então já se sabia as intenções do jornalista em vender o dossiê? Então, por que  o vereador aceitou o convite do encontro?

3) Se Samuel recebeu mesmo R$ 600 pela venda das informações, onde está o dinheiro?

4) O próprio Samuel e Hamilton Lacerda dizem que com o dinheiro recebido, o jornalista convidou amigos para almoçar em uma churrascaria. Mas se havia intenção de flagrar Horácio Neto em tentativa de extorsão, por que não guardar o valor recebido como prova?

5) Samuel diz não ter gasto o dinheiro. Então onde está a verba?

6) Se Horácio Neto pagou pelas gravações, porque não pediu o dinheiro de volta a Samuel, que teria pego o CD de volta assim que Chicão flagrou ambos na lanchonete? Aliás, quem ficou com o CD? Samuel diz que ficou com Chicão, enquanto este diz que ficou com Samuel?

7) Por que comprar um dossiê com informações que não comprovariam nada contra a mulher de Hamilton Lacerda, Maria Isabel Fonseca, umamvez que as informações já haviam sido amplamente divulgado pela imprensa?

8) Se Hamilton Lacerda teria armado cilada contra Horácio Neto, qual seria a intenção de fazer isso quando há possibilidade do PT assumir a prefeitura de São Caetano? E qual o objetivo de Neto em acusar Lacerda, uma vez que a denúncia pode prejudicar o partido, que tem esperanças de assumir o comando do Paço Municipal?