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Crowe interpreta capitão britânico em 'Mestre dos Mares'
Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
29/01/2004 | 20:04
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O tal cafundó a que se refere o subtítulo de Mestre dos Mares: O Lado mais Distante do Mundo é nada menos que a costa brasileira e as ilhas Galápagos, para as quais é mandado o capitão vivido por Russell Crowe neste épico marítimo que estréia nesta sexta-feira em três salas da região. Existe então uma relatividade, sobretudo para os brasileiros, que reforça o ponto de vista do diretor Peter Weir sobre as guerras napoleônicas. Seu partido é o dos combatentes ingleses que resistiram a Napoleão Bonaparte e o derrubariam em 1815, em Waterloo. Weir demonstra a relatividade do heroísmo, sempre condicionado à doutrina a qual ele está submetido.

Essa perspectiva vem do romance de Patrick O’Brian no qual o longa-metragem é inspirado. A par das indicações que disputará no Oscar, Mestre dos Mares diz a que veio – é o vice-campeão de candidaturas ao prêmio (dez), atrás somente de O Senhor dos Anéis – O Retorno do Rei, com 11. Com o filme de Peter Jackson, Mestre dos Mares disputará diretamente oito estatuetas, entre elas as de filme, direção, figurino, maquiagem e efeitos visuais. E, como seu adversário, é também um exemplar do cinema tecnicamente corretíssimo. Já com o brasileiro Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, a disputa será nas categorias direção, montagem e fotografia.

Russell Crowe já foi O Informante (cuja interpretação merecia Oscar e não levou), já foi Gladiador (não merecia e levou) e também Uma Mente Brilhante (que não deveria sequer ser cogitado para o prêmio e, coerentemente, não levou). Agora seu papel, ignorado no Oscar 2004, é o do capitão Jack Aubrey, comandante da fragata britânica HMS Surprise. Em 1805, a embarcação é enviada aos mares do hemisfério Sul com duas missões, sem prioridade aparente: coletar espécimes animais nas ilhas que hospedariam depois as teorias de Charles Darwin (1809-1882) e intervir na rota de um navio francês que navega em águas brasileiras.

Mestre dos Mares sintetiza aí duas necessidades da humanidade que se intensificariam no século XX. No navio inglês estão representados tanto o desejo de onisciência sobre a natureza como o ímpeto belicista. Se o capitão Aubrey é a parte que cabe aos militares, o médico Stephen Maturin (Paul Bettany) defende a classe dos cientistas.

São os principais personagens de Mestre dos Mares, dois amigos que gastam horas em duetos musicais, um ao violino, outro ao violoncelo. Reproduzem o olhar externo aos conterrâneos de Napoleão. Em determinado momento, o capitão incita seus comandados à luta: “Vocês querem chamar Bonaparte de rei? Querem ver seus filhos cantando a Marselhesa (hino nacional da França)?”. Essa demonstração de ufanismo confronta o uso que o imperador, depois de substituir no governo jacobinos e girondinos (artífices da Revolução Francesa), faz dos ideais de fraternidade, igualdade e liberdade.

Peter Weir (O Show de Truman) humaniza um ambiente exclusivamente masculino e opressivo pela condição de isolamento. Uma guerra está em curso e o mapa-múndi está ameaçado de mutação, nem por isso ignora-se os conflitos internos do homem, um átomo se comparado à grandeza das fronteiras que atiçam o expansionismo. A tripulação do HMS Surprise, que tem até um marujo de 12 anos de idade, não sai de foco mesmo nas cenas de batalha naval, grandiosas como manda a cartilha do blockbuster. A guerra que se pretende bem-sucedida depende não só das armas, mas também da saúde psicológica e da intimidade de seus soldados. Homem e máquina unidos por Weir à moda de David Lean, um mestre do gênero (Lawrence da Arábia e A Ponte do Rio Kwai).




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