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Um ‘Gepetto’ em Mauá
Illenia Negrin
Do Diário do Grande ABC
16/10/2005 | 08:20
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Não bastasse o dom, ainda tem a semelhança física. Há quatro anos, o artesão Carlos Alberto Vanin, 48 anos, parou de fabricar móveis, ofício que levava por toda a vida. Passou a tirar da madeira objeto mais sutil e feliz: brinquedos educativos. Foi aí que se transformou no Gepetto do Grande ABC. O galpão que fica no bairro Santa Cecília, em Mauá, é a oficina dos divertimentos e virou ponto turístico para as crianças da cidade. Carlos parece ter sido tirado do livro infantil, cercado de Pinóquios e outras invenções que dançam ao redor dele. Um homem de cabelos brancos que, quando fala, parece contador de história, com um quê de cientista maluco.

“Veja só, as crianças faziam fila para visitar a oficina. Ficavam ali, no meio daquela serragem, vendo como é que se fazia um brinquedo. Tinha escola que fazia até excursão para lá. Uma maravilha.” O Gepetto usa os verbos no passado para contar a rotina do galpão. É que os negócios não andam bem ultimamente, e ele teve de interromper – temporariamente – a produção. “As pessoas acham caro um brinquedo de madeira custar R$ 30. Vendíamos muito para escolas, que investiam no lazer pedagógico. Mas a crise financeira pegou todo mundo de jeito.”

Carlos já inventou cerca de 200 brinquedos diferentes. A maioria, desses de montar, com peças que podem ser encaixadas de vários jeitos e ganhar a forma que a criança quiser. É o avião que vira carrinho, que vira girafa, que vira prédio. Não só idealizou os modelos, como também as ferramentas que viabilizam a produção das partezinhas, e algumas máquinas que ajudam a acelerar a produção. Mesmo assim, um brinquedo pode demorar dois dias para ser confeccionado. Tipo de trabalho que só o paciente e o detalhista fazem com o sorriso no rosto.

Ele próprio se define como artesão, mas faz questão de tirar o glamour do rótulo. “Sou marceneiro. Carpinteiro. Meu avô era e meu pai era. Faço qualquer trabalho em madeira, crio as minhas máquinas. E a combinação de tudo isso é o artista, o artesão.” Carlos virou Gepetto porque cansou dos adultos. Trabalhar para crianças, afinal, é mais fácil. No sobrado em que vive com a mulher e os três filhos, no Jardim Palermo, em São Bernardo, uma simples olhada evidencia a habilidade do escultor. Ou a imaginação dele, que voa rápido e longe. Os móveis, as portas, a escada, os detalhes dos batentes, os brinquedos espalhados pelos quartos das crianças, Carlos fez tudo. E ainda encontrou tempo para projetar um elevador – ainda fora de operação – que leva até o terceiro piso da casa. “Quis o elevador para facilitar. No meio do churrasco, quando falta alguma coisa, dá preguiça de descer até a cozinha e depois subir tudo de novo.”

Com mais tempo livre e fazendo planos para reativar a oficina, Carlos começou a brincar de fazer mosaico, há três meses. Faz reproduções de quadros célebres, redesenhando com vidrinhos minúsculos e coloridos. O da Monalisa ficou perfeito. “Vou fuçando, sou curioso. Aprendo rápido.” Agora, quer encontrar o tal caminho das pedras para ressuscitar o negócio. Aí as idéias voltam para o papel e a madeira volta a ganhar as formas que alegram os adultos, as crianças e o criador.




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