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Depressão pode levar a atos de violência extrema

Autores de crimes recentes na região, seguidos de suicídios, tinham quadros da doença

Vanessa de Oliveira
Do Diário do Grande ABC
24/03/2014 | 07:00
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Celso Luiz/DGABC


O gerente de qualidade Márcio Ferreira, 34 anos, matou a noiva, Natália Martins, 28, no estacionamento da Volkswagen, em São Bernardo, e, em seguida, se matou. Em menos de um mês, na mesma empresa, o soldador Vagner Ferreira Francisco, 36, alvejou o colega de profissão Walter Pereira Rodrigues, 40, e também se suicidou. Em São Paulo, no bairro Alto da Lapa, a médica pediatra Elaine Munhoz, 56, matou o filho Giuliano Landini, 26, e a namorada dele, Mariana Marques Rodella, 26, e depois tirou a própria vida. O que esses casos têm em comum? Todos os autores dos crimes tinham quadros de depressão.

Doença orgânica que pode ser desencadeada por algum evento da vida (perda de um ente querido, fim de um relacionamento, entre outros), a depressão faz com que a resposta do organismo seja totalmente desproporcional ao acontecimento. “Não é preciso um motivo para que a pessoa entre em depressão. Por ser uma doença cerebral, às vezes ela surge sem nenhum fator óbvio”, explica o neurologista Leandro Teles, integrante da ABN (Academia Brasileira de Neurologia).

Em casos mais graves, a pessoa pode apresentar sintomas psicóticos que a levem a atos de violência. “A depressão grave comporta outros sintomas. A pessoa pode ficar impulsiva, supervalorizar alguma situação, perder a crítica, voltar-se com raiva contra alguém. Pode ainda ter alucinações, como ver vultos ou ouvir vozes, achar que está sendo perseguida, coisas que podem levá-las a matar alguém e a se matar”, fala Teles.

NA PELE

Morador da região, um motorista e jardineiro de 48 anos, que preferiu não se identificar, está depressivo há quatro anos. O problema iniciou-se com a morte da mãe, seguida da avó materna, quatro meses depois. A gota d’água foi quando, em uma partida de futebol, fraturou a perna, precisando repousar por três meses, o que o fez perder uma grande oportunidade de trabalho.

O momento mais difícil da depressão foi justamente quando começou a ouvir vozes. “Elas diziam para tirar a vida da minha esposa, do meu filho e a minha própria vida. Cheguei a ligar para minha paisagista dizendo que já tinha matado minha mulher, o próximo seria meu filho e, em seguida, eu. Foi quando minha esposa ligou para o meu irmão para vir socorrê-la. Foi a pior fase da depressão: pensar em tirar a vida de quem mais amo neste mundo”, relembra.

Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), só no Brasil 10% da população sofre com o problema.

Patologia é confundida com momentos de tristeza comuns

A enfermeira Ana (o nome foi trocado a pedido da entrevistada), 29 anos, teve o primeiro sintoma da doença ainda criança, aos 11, quando a avó paterna – a quem era muito apegada –, morreu segurando sua mão. Seis meses depois, outra perda: o avô materno.

As características da depressão começaram a se intensificar, porém, por falta de conhecimento sobre o assunto, a busca por tratamento não foi rápida. “Inicialmente não percebi apoio por parte da minha família. As pessoas que convivem com quem tem depressão devem primeiro buscar entender o que é a doença e quais limitações ela pode trazer ao indivíduo”, explica Ana.

O consultor em infraestrutura sênior Leandro Dicieri, 31, teve depressão aos 24 e passou pela mesma situação. “Eu mesmo não acreditava na existência da doença, então, tratávamos como uma coisa que logo iria passar”, recorda.

O neurologista Leandro Teles diz que o desconhecimento sobre o assunto está na confusão que as pessoas fazem entre depressão e tristeza. “Tristeza é um momento emocional, proporcional ao evento que lhe deu origem. Depressão é uma doença do cérebro. Ao menor sinal de que a coisa não está bem, procure um médico”, frisa o neurologista.

Pesquisa estuda tratamento sem necessidade de remédios

Pesquisadores da USP (Universidade de São Paulo) estudam os efeitos de uma técnica para o tratamento da depressão chamada estimulação transcraniana por corrente contínua. Não farmacológico e indolor, o procedimento consiste na colocação de dois eletrodos na cabeça do paciente, na área do cérebro que está mais relacionada aos sintomas da depressão.

Desde novembro do ano passado, os cientistas estão comparando a estimulação transcraniana por corrente contínua com o escitalopram, medicamento eficaz no tratamento da depressão. “Provar o êxito dessa técnica seria um grande avanço no tratamento da depressão, porque há muitos pacientes que não toleram os efeitos do remédio”, explica o médico psiquiatra e coordenador da pesquisa, Andre Brunoni.

Atualmente, 40 pessoas passam pelo teste. A meta é recrutar mais 200 pacientes, com idade entre 18 e 75 anos. Interessados em participar devem enviar um e-mail para pesquisa.depressao@gmail.com.

Os primeiros resultados observados pelos pesquisadores são animadores. “Os pacientes estão respondendo muito bem ao tratamento e parece que está sendo tão eficaz quanto o antidepressivo”, destaca o médico.  




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