A psiquiatra brasileira Nise da Silveira, que morreu em 1999, aos 94 anos, e que tem a história contada em filme recém-lançado, estrelado por Glória Pires, já dizia: "Todo mundo deve inventar alguma coisa, a criatividade reúne em si várias funções psicológicas importantes para a reestruturação da psique. O que cura, fundamentalmente, é o estímulo à criatividade.”

E foi justamente esse estímulo que resultou na terceira edição do Mental Fashion Day, desfile de moda promovido pela Secretaria de Saúde de Santo André e realizado na manhã de ontem, com a participação de 54 usuários da rede de atenção psicossocial da cidade. O serviço compreende quatro Caps (Centros de Atenção Psicossocial); cinco serviços residenciais terapêuticos; duas repúblicas terapêuticas; um consultório na rua (veículo); e um Caps itinerante, além de Núcleo de Projetos Especiais.

O evento, que ocorreria na Praça do Carmo, no Centro, teve de ser transferido para a Casa da Palavra, devido ao mau tempo. Os modelitos, que tiveram como matéria-prima principal o jeans, ganharam originalidade com a customização, feita junto às monitoras de oficinas terapêuticas. Izaura Xavier, 57 anos, que ficou depressiva após perder a mãe na adolescência, era só orgulho da sua produção. “Eu mesma fiz minha roupa”, disse ela, mostrando a calça e os tênis customizados com diversos adereços. Ela produziu ainda um cocar indígena, em homenagem à avó materna, além de transformar uma jaqueta em um moderno colete, no qual atrás, o desenho de uma gaiola representava “a liberdade psicossocial”, explicou. “Com o tratamento do Caps, sou autônoma e tenho mais credibilidade social”, falou.

“A autonomia que as pessoas têm para desenvolver projetos é fundamental, pois é a base do tratamento da Saúde Mental”, salientou o secretário municipal de Saúde, Homero Nepomuceno Duarte.

O tema do desfile, baseado no histórico da vida de Nise da Silveira, foi Sonhos e Lutas. Representando os sonhos, a funcionária pública Julia Fabiano Couto da Silva, 34, em tratamento contra síndrome do pânico e transtorno de ansiedade, desfilou com modelo que simulava asas de borboleta. “Meu sonho é voltar a ser quem eu era e, com esse evento, a gente vê que pode brilhar”, falou.

Já Laércio Pereira dos Santos, 28, que trata no Caps os problemas de esquizofrenia, síndrome do pânico e depressão, representou a luta, por meio de uma capa preta com desenhos de animais fortes, como a onça. Para ele, a força para enfrentar a luta vem da fé. “Jesus é a força de todos nós.”

A coordenadora da Saúde Mental de Santo André, Maria Regina Tonin, ressalta a importância da atividade como grande aliada do tratamento. “É um momento de se colocar os desejos, de ter a autoestima melhorada, de eles serem fotografados, não colocando a doença em evidência, mas sim a saúde, longe de preconceitos que nós queremos quebrar.”