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'Permitir lista suja é fascismo', diz Chinaglia

Presidente da Câmara caracteriza divulgação dos nomes de políticos em 'lista suja' como "preconceituosa"

Rita Donato
Do Diário do Grande ABC
11/08/2008 | 07:09
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Com questões pontuais a serem solucionadas no Congresso Nacional, como a mudança no trâmite das medidas provisórias para evitar o trancamento da pauta, o presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia (PT), reserva tempo para participar de polêmicos debates.

Crítico ferrenho da divulgação dos nomes de políticos na chamada ‘lista suja' - impedida por determinação do Supremo Tribunal Federal -, o petista caracteriza a medida como "preconceituosa". "Não podemos concluir que alguém que está sendo julgado será considerado culpado. Isso é inverter os procedimentos e criar um planeta fascista. Prefiro o julgamento popular."

A mesma postura é adotada para defender a independência do Poder Legislativo e cobrar dos ‘companheiros' do Palácio um comportamento alinhado ao da Câmara para resolver problemas específicos como as reformas política e tributária. "Conversei com o ministro da Fazenda, Guido Mantega (na última semana), e cobrei: ‘É de verdade ou de mentira a votação da reforma tributária? Porque se é para votar então parem de mandar MP'".

Sem fugir do discurso político, Chinaglia fala da popularidade do presidente Lula, dos novos rumos do PT e confirma a inclinação do nome da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, para suceder o chefe de Estado. O único mistério paira sobre seu próprio futuro. "Sou muito pé-no-chão, qualquer discussão agora (sobre sua possível candidatura ao governo estadual) seria imatura."

DIÁRIO - É natural a morosidade dos trabalhos legislativos durante o período eleitoral?
ARLINDO CHINAGLIA - A lentidão é especulação. Fomos além do esperado em um período normal de trabalho. Votamos (na última segunda-feira) três MPs (medidas provisórias), sendo uma delas a reestruturação da dívida do setor agrícola no valor de R$ 70 bilhões. Mesmo com obstrução intensa dos democratas, conseguimos aprovar produzindo acordos. O fato é que a cada dois anos temos eleição e imaginar que deputados, senadores e militantes não participem do processo é distorção de visão.

DIÁRIO - Se as MPs não fossem usadas exageradamente, seria necessário alterar a tramitação para evitar o trancamento da pauta?
CHINAGLIA - Fui o primeiro a defender o fim do trancamento da pauta. Reuni-me cinco ou seis vezes com o Lula e ele demonstrou sensibilidade para ouvir e percepção democrática para que os poderes tenham papéis direcionados. Já conseguimos aprovar, por unanimidade, que a MP tenha vigência imediata. No lugar de uma Comissão Mista, a análise seria feita pelas comissões de Constituição de Justiça e Redação da Câmara e do Senado.

DIÁRIO - Por que o sr. é favorável à decisão do Supremo Tribunal Federal de vetar a ‘lista suja' dos candidatos?
CHINAGLIA - Primeiramente, ninguém define o que é uma ‘lista suja'. Além disso, não podemos concluir que alguém que está sendo julgado será considerado culpado. É evidente que não tenho nenhum compromisso com candidato que cometeu um crime e não defendo aqueles sem qualificações éticas e morais, mas não podemos condenar uma pessoa por estar respondendo (a um processo), isso é inverter os procedimentos e criar um planeta fascista. Essa lógica tira do povo o poder de decisão final. Prefiro o julgamento popular.

DIÁRIO - Qual a prioridade até o fim do mandato?
CHINAGLIA - Alterar o trâmite da MP e votar a reforma tributária. Conversei com o ministro da Fazenda, Guido Mantega (na última semana) e cobrei: ‘É de verdade ou de mentira a votação da reforma tributária? Porque se é para votar então parem de mandar MP'.

DIÁRIO - O Executivo prejudica o Legislativo a andar com as próprias pernas?
CHINAGLIA - Enquanto a Câmara e o Senado concordarem vai prejudicar. O Executivo tem caminho livre e exerce o poder para conseguir o que pretende. Estou trabalhando para construir um espaço institucional maior para a Câmara.

DIÁRIO - Alguns presidentes das câmaras do Grande ABC consideram a PEC 333 (aumento do número de vereadores e redução do orçamento) um contra-senso. Por que o sr. defende a medida?
CHINAGLIA - Ao reduzir os gastos, mostramos a preocupação em preservar o dinheiro público. Ao aumentar o número de representantes, fortalecemos a democracia e damos oportunidades a novos partidos. Não podemos afirmar que daremos margem para eleger desqualificados porque quem pensou isso do (presidente) Lula caiu do cavalo. Uma saída para evitar isso (eleger candidatos despreparados) é politizar a sociedade para que os melhores sejam escolhidos.

DIÁRIO - É possível que a reforma política saia do papel?
CHINAGLIA - É necessário, ao menos, mudanças pontuais. Todo mundo fica desesperado por coligação majoritária porque aumenta o tempo (de divulgação) em TV e rádio. Podíamos aprovar o seguinte: na coligação majoritária vale o tempo do maior partido, sem acrescentar tempo dos menores que, às vezes, são valorizados demais na disputa política.

DIÁRIO - Qual o entendimento do sr. com relação à postura do PT, que abriu o leque de alianças aos nanicos?
CHINAGLIA - Por acreditar que estávamos defendendo o que é ético, isso era suficiente. É um grande papel lutar por esses valores, ocorre que quando disputa-se programas e eleições, siglas compartilham ideologias. Não somos os únicos escolhidos e os donos da verdade. O PT ampliou as alianças e a ironia é que em cidades diferentes estamos alinhados com siglas distintas. Isso se deve por conta da pulverização partidária e porque as disputas locais nem sempre estão orientadas pela (executiva) nacional.

DIÁRIO - As coligações foram preponderantes para eleger o presidente Lula?
CHINAGLIA - Se pensarmos bem, o Lula foi eleito em uma coligação pequena. Do ponto de vista eleitoral não foi um erro porque ele tem tamanha legitimidade que ganhou praticamente só. A coligação ajudou, mas não foi fator decisivo.

DIÁRIO - É mais fácil ser oposição ou sustentação?
CHINAGLIA - O PT mudou depois que chegou no governo.Afinal, mudou a tarefa, como o partido não mudaria? A diferença é que a oposição defende o justo, o necessário, mas quando se está lá (no poder) tem de fazer caber tudo no orçamento e construir maioria para garantir aprovação dos projetos.

DIÁRIO - Citando a discussão de Belo Horizonte, onde PT e PSDB vislumbram união, o sr. não teme que o partido perca o fundamento?
CHINAGLIA - Eu acho que as pessoas não se acostumariam em ver, repentinamente, PT e PSDB juntos. Não por questões municipais, mas devido às disputas nacionais. É normal os partidos terem posição, aliás, se não tiverem melhor que fechem, mas quem decidir fazer a aliança terá de explicar à sociedade o motivo. É uma experiência que todos nós estaremos analisando, mas, nos dias de hoje, os maiores contendores nacionais são PSDB e PT.

DIÁRIO - Focando 2010. Arlindo Chinaglia é cotado para encarar a disputa ao governo do Estado?
CHINAGLIA - É cedo para falar da questão estadual. É normal que cada partido fique analisando um nome e é evidente quando alguém vira presidente da Câmara que haja especulação maior. Mas sou muito pé-no-chão, qualquer discussão agora seria imatura porque sabemos que ninguém vira candidato porque quer. É muito mais fácil os outros quererem.

DIÁRIO - Qual o nome que o sr. defende para suceder o Lula?
CHINAGLIA - Está muito cedo. Ele é o cara mais forte do PT e do Brasil, não há substituto no mesmo nível. Ele dá sinais nítidos de que a Dilma (Rousseff, ministra-chefe da Casa Civil) tem um passo à frente. É uma pessoa com muita capacidade, mas como nunca disputou eleição existe um grau subjetivo no processo eleitoral, ninguém consegue responder se ela consegue dar conta do aspecto subjetivo da massa.

DIÁRIO - Há explicação para a popularidade de Lula, que já se projeta independentemente da coloração partidária?
CHINAGLIA - Faz tempo que o Lula, do ponto de vista de imagem pública, ganhou imagem maior do que o PT, mas não significa que ele aplauda isso. Também é natural que candidatos busquem essa aproximação. Entre ter de dar explicação sobre o PT e se associar à imagem de um presidente com essa popularidade, os candidatos escolhem a segunda opção. Até partidos de oposição estão se associando. Campanha é ganhar voto e a síntese do PT é Lula.

DIÁRIO - Como ficará o partido sem o Lula?
CHINAGLIA - O PT não vai ficar sem o Lula. Lamento pelos adversários que terão o Lula solto por aí.




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