Desvendando a economia Titulo Plano Real
Os 20 anos ‘sem’ inflação

Somente em 1993, a inflação
mensurada pelo IPCA registrou 2.477,15%

Sandro Maskio
06/07/2014 | 07:28
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Um das cenas que me lembro de minha vida foi o pronunciamento do presidente José Sarney e do então ministro Dílson Funaro sobre a adoção do Plano Cruzado, em 28 de fevereiro de 1986. Deste dia até julho de 1994, quando entrou em circulação o real, houve cinco trocas de moedas no País, e foram cortados 12 zeros da moeda nacional. Esta numerosa troca de moedas foi provocada por diferentes estratégias de combate a inflação adotadas no período. Somente em 1993, a inflação mensurada pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) registrou 2.477,15%.

Para aqueles que, felizmente, não vivenciaram este período, imagine que tenha gasto valor equivalente a R$ 100 na ceia de Réveillon do último ano. Se a inflação anual registrada for igual a de 1993, significa que no próximo dia 31 de dezembro gastará aproximadamente 2.477% mais, o equivalente a valor aproximado de R$ 2.577,15.

Lembro-me da época em que cursei a graduação. Eu assinava o contrato com a faculdade no começo de janeiro, e recebia 12 boletos em branco, pois os valores mensais eram informados a cada mês, dois dias antes do vencimento. Era praticamente impossível saber qual seria o valor da mensalidade a ser paga em dezembro. A prática comum das famílias, e em casa não era diferente, era realizar as compras no mercado logo que recebesse o pagamento, para o mês todo, e quando possível para mais de um mês. Se o trabalhador demorasse em utilizar seu pagamento, dia a dia o poder de compra da renda auferida naquele mês ia diminuindo, o que promovia a corrida aos supermercados e aos postos de gasolina, entre outros. Se após as compras sobrasse algum dinheiro, então era imprescindível aplicar no over night, ou nos fundos de aplicação financeira atrelados aos títulos de dívida pública. Títulos estes que possibilitavam aos bancos ganhar dinheiro apostando no giro (float) desses títulos, afastando-os dos serviços de geração de crédito.

A partir do início da circulação do real, com as demais medidas e estratégias para segurar os preços, o país conseguiu domar o dragão inflacionário. A queda da inflação trouxe mudanças radicais no cenário econômico. Houve a ampliação do horizonte de planejamento dos empresários e trabalhadores, pois se tornou possível, por exemplo, saber o valor das mensalidades escolares ao longo do ano. A fatia mais pobre da sociedade também deixou de sentir os efeitos da intensa corrosão da inflação sobre a renda. As contas públicas tornaram-se mais transparentes, pois não era mais possível utilizar-se de expedientes inflacionários para seu financiamento, o que permitiu ao governo ter uma clara dimensão da estrutura de despesas e receitas, ampliando as condições de planejamento e gestão dos mesmos, entre outros efeitos.

A contenção da inflação abriu espaço para que a equipe econômica dos governos passasse a focar suas ações em outros tópicos importantes, que haviam ficado em segundo plano desde a década de 1970, a exemplo do sistema previdenciário, ainda que insuficiente para sua sustentabilidade e a construção de políticas voltadas à melhoria da distribuição de renda, iniciada na tímida ação do Bolsa Escola, e aprofundada na década de 2000. Viver no Brasil de hoje é completamente diferente, em comparação com as condições prevalecentes no período de elevada inflação. A inflação média registrada no período pós-real é de 0,64% ao mês, ou 360% no período. Ainda que não seja um nível inflacionário extremamente baixo, é importante reconhecermos a importância destas conquistas. 




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