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São-bernardense põe sentimentos no papel ao resgatar as histórias da música de protesto na América Latina

Evaldo Novelini
11/04/2024 | 09:56
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Livro autobiográfico de Bruna Ramos da Fonte traz ensaios, poesias e fotografias (FOTO: Rafa Marques/Divulgação)


Que ninguém se engane com o rótulo usado para promover Apenas Uma Mulher Latino-Americana: Em Busca da Voz Revolucionária (Rocco, 272 páginas, R$ 69,90), da escritora são-bernardense Bruna Ramos da Fonte, cujo lançamento oficial está marcado para hoje, às 18h, na Livraria da Vila (Avenida Paulista, 509, Capital). A editora diz que se trata de uma viagem através da chamada música de protesto produzida no Brasil e nos países da América Espanhola durante o período da Guerra Fria (1947-1989). Mas o livro é bem mais do que isso.

A começar pela miscelânea de gêneros presentes. Jornalista, biógrafa, poeta, fotógrafa, musicista e consultora em diretos humanos, Bruna reuniu todos os seus talentos ao longo dos capítulos. Os ensaios, carregados de memórias pessoais e sentimentais, se sobressaem, mas há um caderno de fotos, que ela mesma registrou enquanto percorria países latino-americanos em busca de informações para o livro, e um apêndice com poesias, escritas durante estada no Chile, hóspede da compositora Tita Parra – neta de Violeta Parra, fundadora da música popular chilena e autora do clássico Gracias a La Vida, gravado por Elis Regina.

Violeta Parra (1917-1967) é uma da expoentes do movimento que é a espinha dorsal de Apenas Uma Mulher..., a Nueva Canción Latinoamericana, surgido nos anos 1960 e que, a partir de elementos folclóricos nacionais, fazia músicas denunciando as mazelas sociais decorrentes da implantação de ditaduras nos países da América Latina – no Brasil, inclusive, em 1964.

Costurando episódios históricos às passagens da própria vida, Bruna constrói sua autobiografia ao mesmo tempo em que apresenta músicos como Victor Jara (Chile), Silvio Rodriguez (Cuba), Pablo Milanés (Cuba) e Mercedes Sosa (Argentina), cuja produção denunciava as arbitrariedades provocadas pela supressão democrática em seus respectivos países, especialmente a tortura e a censura.

Bruna também aborda artistas brasileiros – o título do livro, aliás, é homenagem a um dos grandes sucessos do cearense Belchior, Apenas um Rapaz Latino-Americano. A obra resgata biografias esquecidas, como a do pianista fluminense Tenório Jr., que desapareceu durante turnê com Vinicius e Toquinho em Buenos Aires, em 1976. Ele teria sido sequestrado pela polícia secreta argentina, sob suspeita de subversão, torturado durante nove dias e assassinado com tiro na cabeça.

Ao chegar ao fim das 272 páginas, o leitor terá aprendido bastante sobre a cena musical latino-americana e conhecido um pouco mais de Bruna – que tem bisavós ciganos e, segundo a dedicatória, apaixonou-se enquanto redigia Apenas Uma Mulher.... “Parece que tudo o que fiz até hoje foi trilhando um caminho para que eu pudesse escrever esse livro. Todos os que vieram antes é como se fossem parte de um quebra-cabeça, cada um era uma pecinha, que agora eu montei”, sintetiza a autora, que é biógrafa de Sidney Magal e Roberto Menescal e concebeu romance sobre Mozart. 

Autora declara que o livro só existe porque ela nasceu no Grande ABC

Logo no início de Apenas Uma Mulher Latino-Americana, Bruna Ramos da Fonte diz que seu interesse pela música de protesto é resultado direto do local em que nasceu. Ela descreve o Grande ABC como o “lugar conhecido mundialmente por ter sido o berço das lutas sindicais brasileiras”, essenciais na derrubada da ditadura instalada em 1964.

“Não teria escrito esse livro se não fosse daqui”, diz Bruna. Nascida em 1991, em São Bernardo, seis anos depois que a democracia foi restabelecida, ela teve contato com histórias contadas pelos “milhares de latino-americanos” que emigraram “fugindo das perseguições sofridas por seus próprios governos” para trabalhar nas fábricas do Grande ABC.

Boa parte da formação musical, Bruna deve à mãe, Marisa, ex-vendedora de discos na histórica Discoteca Aldo, em Santo André, onde podia ouvir todos os álbuns que quisesse.




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