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Tráfico reage a plano do presidente do Equador de 'mão pesada' contra o crime, dizem analistas
09/01/2024 | 21:53
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O Equador experimenta uma escalada da violência extrema. Sequestros de policiais, incêndios de veículos, atentados com bombas e fuga de presos foram registrados nesta terça-feira, 9, ao redor do país, apenas um dia depois de que o presidente Daniel Noboa declarasse o estado de exceção na nação pela fuga de Adolfo Macías Salazar, alias "Fito" - líder de Los Choneros, a maior organização criminosa do país.

O terror inundou o país durante o dia. Nesta tarde, a polícia equatoriana confirmou que 7 policiais foram sequestrados. Três deles foram abduzidos nesta madrugada em Quevedo, a cerca de 140 km de Quito. Outro foi sequestrado na capital do país e ainda não há informações do resto.

Uma série de explosões foram registradas ao redor do Equador. Em Esmeraldas, no norte do país, pelo menos um veículo foi incinerado por membros das gangues. Vários carros também foram incendiados nas cidades de Riobamba, Azogues e Guayaquil. Já em Quito, houve uma explosão em uma ponte e o incêndio de um veículo com bombas de gás inseridas no seu interior. Uma motocicleta também foi incendiada nos arredores da capital.

Uma das detonações atingiu o exterior da casa do presidente da Corte Nacional de Justiça, Iván Saquicela, em Quito, sem registro de feridos.

Na província de Cuenca foram registradas pelo menos 5 ocorrências de explosões.

Além disso, em Guayaquil, homens armados e encapuzados invadiram o estúdio da emissora TC Televisión e ameaçaram os jornalistas e cinegrafistas. Sem dar mais detalhes, a polícia anunciou que controlou a situação no fim da tarde, com "várias prisões", e divulgou fotos que mostram pelo menos dez suspeitos deitados no chão, com as mãos atadas por lacres plásticos. Ninguém ficou ferido.

Hoje o Secretário de Comunicação da Presidência, Roberto Izurieta, advertiu que o governo não cederia à pressão. As autoridades afirmaram que prenderam duas pessoas suspeitas de uma das explosões e apreenderam uma arma de fogo e 16 dispositivos explosivos. "Os dois suspeitos supostamente deixaram uma mala abandonada e incinerada nos fundos de uma unidade policial em Quito, informou a polícia.

Nesta tarde, o presidente Daniel Noboa decretou que o país encontra-se em um "conflito armado interno" e considerou 22 facções como organizações terroristas, autorizando posteriormente as Forças Armadas do Equador a agir para combater os grupos.

"Ordenei às Forças Armadas que realizem operações militares para neutralizar esses grupos", disse o presidente nas redes sociais.

"Estamos vivendo uma onda de terror a causa de grupos narcotraficantes", disse ao Estadão Kleber Carrión, ex-oficial da Polícia Nacional Equatoriana e especialista em segurança e inteligência. "Há uma grande comoção em todas as províncias, especialmente nas províncias da costa, com muito medo e no aguardo de que o estado reaja com firmeza e dureza aos ataques dos grupos delitivos", afirmou ele.

"Isto está ocorrendo poucos dias depois da fuga da prisão de 'Fito'. Ele é o líder de uma destas organizações e parece ter muita influência sobre o resto dos grupos. A influência não seria no sentido ideológico, os grupos compartilham os mesmos objetivos que Fito: causar terror em todo o nosso território", afirmou o especialista, que acredita que os acontecimentos recentes possam ser uma espécie de ação retaliatória contra as políticas do Estado.

Neste domingo, 7, o governo afirmou que o narcotraficante Fito fugiu da cadeia. Na segunda-feira, 8, pelo menos seis presídios do país tiveram um cenário de caos, com rebeliões internas, incluindo a retenção de agentes penitenciários por detentos e a queima de colchões. Na Prisão Regional, onde se encontrava Fito, os detentos escreveram no pátio com pedras "PAPA FITO" e "FATALES GTR" em referência a outra organização criminosa. Em um campo esportivo do mesmo complexo haviam pintado "CON FITO SEMBRAMOS PAZ" ("com Fito semeamos paz").

Carolina Andrade, secretária de segurança de Quito, disse em entrevista ao Estadão que a escalada da violência deixou o país em estado de sítio nesta terça-feira, e que o Estado está buscando mobilizar seus ativos para controlar o cenário. Ela acredita também que alguns dos acontecimentos de hoje dão indícios de ser uma reação direta destes grupos criminosos às decisões recentes de Noboa.

Durante sua campanha à presidência do país, Daniel Noboa prometeu comprar barcos-prisões para abrigar, a 80 milhas da costa do oceano Pacífico, os líderes de gangues nacionais, que durante anos conseguiram controlar o narcotráfico e a violência urbana dos complexos prisionais sem interferência efetiva do Estado.

Em dezembro, o novo presidente afirmou que esta seria apenas "uma medida complementar e provisória para segmentar e retirar os presos que representam ameaças reais à segurança cidadã e nacional, mantendo-os isolados até que as prisões de segurança máxima e supermáxima sejam concluídas". Pouco tempo depois, ainda no mês anterior, seu governo ordenou a construção de duas prisões de "segurança máxima e supermáxima" no "estilo salvadorenho".

Noboa busca imitar as políticas de "mão pesada" promulgadas por Nayib Bukele em El Salvador, quem declarou guerra às gangues e impulsionou uma onda de prisões compulsórias no seu país, sendo acusado posteriormente de violar os direitos humanos pela natureza imprecisa das ordens de prisões e os maus tratos contra os detentos.

Os últimos três governos do Equador tentaram criar soluções para a crise prisional da nação, mas não tiveram sucesso. Os complexos prisionais abrigam mais de 31 mil detentos e funcionam, indiretamente, como a base de operações dos narcotraficantes locais.

Mas para Carolina Andrade, o problema da violência no país é mais profundo. A nação sul-americana já tem uma prisão de segurança máxima (La Roca), que passou por reformas em 2022 para isolar os líderes do crime organizado. E as instituições de segurança enfrentam grandes dificuldades para prever e controlar as atividades dos cartéis e gangues. "Há uma grande infiltração dos grupos criminosos no nosso sistema", disse a secretária de segurança de Quito. "Os mecanismos de inteligência do Equador não conseguem dar conta das ações destes grupos e acaba se tornando extremamente difícil gerar informações prévias para evitar que aconteçam estas ondas de violência".

"Estes eventos têm o objetivo de espalhar o medo e a propaganda para desestabilizar o país", disse Carolina Andrade.

O Equador está passando por uma crise de segurança sem precedentes desde o ano anterior, quando membros de gangues assassinaram o jornalista e candidato presidencial Fernando Villavicencio na saída de um comício em Quito. Desde então, os casos de violência extrema tiveram um aumento no país, com atentados a outros políticos, explosões de carros-bomba, sequestros e assassinatos. Uma série de investigações da polícia equatoriana indicam que a morte de Villavicencio foi ordenada por criminosos na prisão de Cotopaxi.

Noboa assumiu a liderança do Equador em novembro do ano passado com o desafio de acabar com a crise da segurança, mas a dois meses da sua pose, os assassinatos no país atingem níveis históricos, com 40 homicídios para cada 100 mil habitantes. Mas o presidente advertiu recentemente que não "negociará com terroristas" e prometeu que não descansará "até devolver a paz a todos os equatorianos".




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